Nascidas para acabar com o domínio de facções criminosas nas favelas e "pacificar" o Rio de Janeiro, as Unidades de Polícia Pacificadora (UPP) completam uma década nesta quarta (19). A Lupa analisou se, em 2018, é possível dizer que as promessas feitas neste tempo foram cumpridas.
"Vamos levar esse projeto para outras comunidades", Sérgio Cabral, ex-governador do RJ, na inauguração da 1ª UPP, na favela Santa Marta, no dia 19 de dezembro de 2008
VERDADEIRO, MAS
Após a inauguração da UPP da favela Santa Marta, outras unidades foram entregues em comunidades das zonas norte, sul e oeste da capital. Duque de Caxias, na Baixada Fluminense, também recebeu uma. Cabral inaugurou 37 UPPs de dezembro de 2008 a abril de 2014, quando renunciou ao cargo para concorrer ao Senado pelo RJ. Seu vice, Luiz Fernando Pezão, assumiu e ocupou o cargo até ser preso, em novembro deste ano. No período, inaugurou apenas uma UPP: a da Vila Kennedy, na zona oeste, em maio de 2014. Mas anos depois —e com o recrudescimento da crise econômica no estado—, o projeto parou de avançar. Em maio de 2017, o então secretário de Segurança do RJ, Roberto Sá, chegou a afirmar que a "UPP foi uma tentativa ousada demais do estado." Além disso, a intervenção federal na segurança do RJ, em fevereiro deste ano, alterou o funcionamento de diversas UPPs: três foram extintas e quatro tiveram seus efetivos deslocados.
"Vamos terminar o mandato, se eu for reeleito, sem nenhuma comunidade com poder paralelo no Rio de Janeiro""‚ idem, na campanha à reeleição, em 2010
FALSO
Cabral deixou o cargo em abril de 2014 sem cumprir a promessa. Um estudo do Instituto de Segurança Pública (ISP), publicado em 2017, mostrou que em 2015 e 2016, havia "presença ostensiva de criminosos" em pelo menos 843 áreas do RJ.
O levantamento cruzou números e locais de ocorrências de letalidade violenta —quando há morte decorrente de agressão deliberada— e, assim, identificou áreas controladas ilegalmente por facções criminosas.
Um dos exemplos deste "controle ilegal" são os tiroteios: até 13 de dezembro, foram ao menos cinco trocas de tiros por dia nas favelas "pacificadas" do RJ, de acordo com o laboratório de dados Fogo Cruzado. As informações foram compiladas a pedido da Lupa. No ano, foram 1.897 tiroteios só nessas regiões.
"Regulamentação fundiária das comunidades onde há a presença das UPP, integrando as políticas sociais do governo dentro destas áreas"‚ idem, em programa de governo registrado no Tribunal Superior Eleitoral em 2010
VERDADEIRO, MAS
Em fevereiro de 2014, o Governo do RJ celebrou a regularização de mais de 25 mil imóveis localizados em favelas onde havia UPPs, como Vidigal, na zona sul, e Complexo do Alemão, na zona norte. Mas, com a crise financeira do ano seguinte, o investimento no programa parou de ser feito. A área não recebeu recursos em 2015, 2016 e 2017. Procurado, o Instituto de Terras e Cartografia do Estado do RJ não respondeu.
"Novas unidades de Bibliotecas-Parque levarão aos jovens dessas comunidades oficinas de música, teatro e dança, cursos de línguas, ferramentas de estudo para o vestibular, acesso gratuito à internet, estúdios de gravação, cursos de programação e design gráfico, entre outras atividades"‚ Luiz Fernando Pezão, ex-governador do RJ, em seu programa de governo registrado no Tribunal Superior Eleitoral em 2014
FALSO"‚Luiz Fernando Pezão não inaugurou nenhuma Biblioteca-Parque em seu governo. Há só três espaços desse tipo em áreas de UPP —todos na capital, inaugurados por Sérgio Cabral: a primeira do projeto, em Manguinhos e a do Complexo do Alemão, ambas na zona norte, e a da Rocinha, na zona sul. Atualmente, a do Alemão está fechada. A da Rocinha e a de Manguinhos foram fechadas em 2016 e reabertas neste ano.
As Bibliotecas-Parque são espaços de cidadania para favelas, "com uma grande participação de jovens, onde a presença da educação e da cultura poderiam apoiar o desenvolvimento de suas trajetórias de vida", segundo o governo. Em nota, a Secretaria de Estado de Cultura disse que as Bibliotecas-Parque não foram implementadas em virtude de "restrições orçamentárias e financeiras."
"Vamos continuar a política de pacificação. Não há outro modelo que seja capaz de reduzir os homicídios"‚Cabral, durante discurso na abertura do ano legislativo de 2013
DE OLHO
Pesquisadores e estudiosos da área de segurança pública reconhecem que, nos primeiros anos de vigência da política de pacificação, houve redução no número de homicídios cometidos no RJ. O efeito chegou a ser celebrado pela ONU.
Mas, desde 2012, os índices de mortes violentas (que somam homicídios dolosos, mortes por intervenção policial, latrocínios e lesões corporais seguidas de morte) têm crescido em todo o estado. Segundo o ISP, em 2008, quando foi implementada a primeira UPP, houve 7.134 mortes violentas no RJ. Esse número caiu para 4.666 em 2012. A partir daí, voltou a subir, chegando a 6.749 em 2017.
Leandro Resende
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