Com aval da prefeitura, moradores de Ubatuba 'cercam' carros na areia

Segundo associação de bairro, veículos fazem manobras perigosas perto de banhistas; medida é ilegal

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Reginaldo Pupo
Ubatuba (SP)

Moradores da praia de Ubatumirim, em Ubatuba, no litoral norte de São Paulo, decidiram por conta própria, com aval da prefeitura, limitar o trânsito de veículos na areia da praia, criando um "corredor" exclusivo para separá-los dos banhistas.

Eles alegam estarem cansados de assistir a carros em manobras perigosas e até rachas na areia, com risco de atropelamentos. Para isso, implantaram estacas de madeira num trecho de 500 metros dos 2 km da praia, onde há maior concentração de banhistas.

A medida, porém, é ilegal, segundo a SPU (Superintendência de Patrimônio da União, ligada ao Ministério da Economia) e Ministério Público Federal. A circulação e estacionamento de veículos na faixa de areia também são vetados por lei municipal.

Mesmo assim, a prefeitura, sob gestão de Delcio Sato (PSD), autorizou a "obra" e doou as cerca de 300 estacas de madeira para que os próprios moradores criassem o "corredor".

O material, diz a prefeitura, estava estocado em pátios do município, para paisagismo de prédios públicos.

A gestão afirma não saber mensurar o valor das estacas doadas. "A medida é uma reivindicação antiga dos moradores e foi tomada em conjunto com a comunidade", diz a prefeitura, em nota.

Com a intervenção, os carros agora circulam mais próximos à área de jundu, enquanto os banhistas estão mais perto do mar, espaço que diminui mais ainda com a maré cheia.

Segundo o engenheiro agrônomo André Motta, do ICC (Instituto de Conservação Costeira), os veículos passarão por cima da vegetação de jundu, que é rasteira.

"É uma vegetação sensível, com poucas condições de sobrevivência, que será esmagada pelos carros, compactando a areia, o que dificultará a regeneração da espécie."

Mota diz ainda que este tipo de vegetação está localizada em áreas de preservação ambiental permanente. "Há também o impacto sobre os micro-organismos que vivem na área, como crustáceos e eventuais ninhos de tartarugas que desovem nessa faixa".

Segundo o coordenador técnico da Fundação Pró-Tamar de Ubatuba, José Henrique Becker, as áreas de desova e reprodução de tartarugas marinhas concentram-se no norte do Rio, Espírito Santo, Bahia, Sergipe, Pernambuco e Rio Grande do Norte.

Porém, em uma eventualidade de surgir ninhos na praia de Ubatumirim, diz Becker, "o trânsito de veículos nas praias representa uma séria ameaça para as tartarugas". Ainda segundo ele, já houve raros registros de surgimento de ninhos em Ubatuba.

Segundo os moradores e banhistas, o trânsito de carros na areia da praia é intenso aos finais de semana e se agravou com a chegada da temporada.

"A decisão de separar a praia ocorreu após a comunidade se cansar de assistir a tantos acidentes. Os turistas fazem da praia uma pista de corrida", afirma Juarez Barbosa, diretor da associação de moradores de Ubatumirim.

Em dezembro, a prefeitura anunciou a cobrança de estacionamento na praia —a R$ 12,00—, mas voltou atrás após desagradar turistas. Oficialmente, a administração diz que a implantação da Zona Azul na praia está "em fase de adequação de estudo".

A SPU afirmou que não foi comunicada, mas que negocia com a prefeitura, por meio de um convênio de cooperação técnica, uma solução definitiva para o problema do acesso de carros na areia. A prefeitura diz não ter sido notificada pela superintendência.

O Ministério Público Federal afirma que recebeu denúncias e que acompanha o caso, de competência da SPU, mas que poderá tomar medidas judiciais caso a prefeitura descumpra recomendações da superintendência.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.