Em meio à crise, 23 presos fogem de cadeia no CE dominada por facção

Detentos pularam o muro e escaparam sem alarde de cadeia em Pacoti

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Carlos Madeiro Luís Adorno
Maceió e São Paulo

Vinte e três presos fugiram da Cadeia Pública de Pacoti, a 107 km de Fortaleza, na manhã desta segunda-feira (7), segundo a secretaria de Administração Penitenciária do Ceará.

A fuga ocorreu em meio a uma onda de violência que assola o estado desde a última quarta (2). Segundo a pasta responsável pela gestão do sistema prisional, os detentos escaparam durante o período de banho de sol, quando pularam o muro da cadeia, tendo acesso à área externa do prédio.

A reportagem apurou que a cadeia de Pacoti abriga presos da facção criminosa CV (Comando Vermelho). No Ceará, os presos são divididos por facções criminosas, já que elas estão em conflito por espaço tanto nos presídios, como fora deles para controlar o tráfico de drogas.

Durante esta tarde, procedimentos de busca foram realizados na região, mas, até 14h15, não havia informações sobre recapturas. A secretaria não informou se a fuga tem relação com a onda de ataques registrada no estado. A fuga será apurada pelas autoridades.

As três facções que atuam no Ceará —PCC (Primeiro Comando da Capital), CV e GDE (Guardiões do Estado)— teriam se unido com o objetivo de retaliar declarações do secretário da Administração Penitenciária estadual recém-empossado, Luis Mauro Albuquerque.

O secretário afirmou durante sua posse não reconhecer o poder das facções no estado e disse que o Ceará passaria a deixar de dividir presos de facções rivais em unidades prisionais diferentes. A divisão é feita em diversos estados para evitar confrontos e mortes dentro de estabelecimentos prisionais, mas as facções acabam dominando as unidades onde são maioria.

A retaliação do crime organizado teve início com ataques na quarta e segue até esta segunda (7). A reportagem apurou que o número de atentados passou de 125 e atingiu ao menos 36 cidades do estado. Com o reforço na segurança da capital e região metropolitana, onde os ataques estavam sendo concentrados até sábado, a estratégia dos criminosos mudou. Entre domingo (6) e esta segunda, houve registros de atos violentos no interior.

O governo do Ceará iniciou no domingo a transferência de presos suspeitos de comandar a onda de ataques. O governo federal disponibilizou 60 vagas em presídios federais para os líderes das ações. Segundo o governo estadual, apenas um dos chefes de facção tinha sido transferido até as 10h30 desta segunda —outros 20 presos devem ser levados nas próximas horas.

Em vídeo publicado nas redes sociais na tarde de sábado, o governador do Ceará, Camilo Santana (PT), afirmou que a onda de ataques tem como objetivo fazer com que o governo recue de medidas "duras e necessárias" que tem adotado. "O que não há nenhuma possibilidade de acontecer. Pelo contrário: endureceremos cada vez mais contra o crime", afirmou.

Nesta segunda, ao anunciar os números de prisões, o governador enalteceu "o esforço e comprometimento dos nossos profissionais de segurança, bem como das tropas federais, nesse enfrentamento ao crime. Estamos todos unidos para garantir a segurança dos irmãos e irmãs cearenses, bem como garantir o estabelecimento da ordem."

Após sugestão do ministro da Justiça, o ex-juiz federal Sergio Moro, o Ministério Público do Ceará anunciou nesta segunda a criação de um "gabinete de crise institucional" para que o órgão tenha controle em tempo real dos trabalhos de investigação e de ações criminosas que possam ser realizadas contra a própria instituição. 

"O MP-CE acompanha todo o desenrolar da crise que acomete o estado, cônscio do dever maior da instituição de adotar todas as providências para tentar cessar os atos criminosos que atentem contra a paz e a segurança da sociedade cearense", afirmou, em nota oficial, a Promotoria. 

Durante ações ostensivas contra o crime organizado, a polícia do Ceará matou três suspeitos, entre a noite de quinta-feira (3) e a madrugada deste domingo, em supostos tiroteios. Na quinta, uma equipe policial foi checar uma denúncia de dano a um fotossensor, na rodovia CE-010, no município de Eusébio, região metropolitana de Fortaleza. Lá, trocou tiros com um homem não identificado, que morreu. Nenhum policial ficou ferido.

Neste domingo, houve uma troca de tiros após dois suspeitos tentarem atear fogo em um posto de atendimento do Detran (Departamento Estadual de Trânsito). Os dois morreram e um policial foi lesionado na mão, mas não corre risco de morrer. Segundo o governo, foram apreendidos coletes balísticos, um revólver calibre 38, munições deflagradas, coquetéis molotovs, galões de combustíveis, e um veículo com a dupla.

Segundo a Secretaria da Segurança Pública, 148 suspeitos de participação nos ataques foram presos, sendo 38 entre a noite de domingo e e a manhã desta segunda.

Nesta segunda, 200 linhas de ônibus na capital e na região metropolitana circulam com a presença ostensiva de policiais militares e também escoltados com equipes do motopatrulhamento. "A SSPDS e a Polícia Militar atuam de forma sincronizada com o Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiros do Estado do Ceará (Sindiônibus), com o objetivo de garantir segurança aos usuários do transporte coletivo."

Diante da continuidade em episódios de ataques no Ceará, o ministro da Justiça, Sergio Moro, decidiu aumentar o efetivo da Força Nacional no estado.Com  o reforço, o total de enviados é de 406 homens e 96 viaturas. 

Policiais e homens da Força Nacional de Segurança estão se dividindo para patrulhar outros locais estratégicos, como sedes das empresas que fornecem energia e água, além de distribuidores de combustível.  Os homens da Força Nacional enviados pelo governo federal estão concentrados em Fortaleza e região metropolitana, locais onde os criminosos mais atacaram nos primeiros dias. Cem policiais militares enviados pelo governo da Bahia foram distribuídos pelo interior, principalmente para a região Norte do estado que tem cidades importantes como Sobral. 

O envio do reforço policial foi autorizado na sexta (4) pelo ministro da Justiça, Sérgio Moro. Um dia antes, Moro já havia determinado providências, com a mobilização da Polícia Federal, da Polícia Rodoviária Federal e do Departamento Penitenciário Nacional.

No domingo, Moro autorizou a liberação de 60 vagas em presídios federais para líderes das facções cearenses que estão em presídios no estado. Ao menos 20 devem ser transferidos até o final desta semana —até o momento apenas um já deixou o Ceará.

A decisão se deu após pedidos feitos pelo governador Camilo Santana (PT). O ministro sugeriu a formação de um gabinete de crise, com a integração de polícias federais e estaduais. O presidente Jair Bolsonaro (PSL) elogiou a decisão de Moro e disse que o fato de o PT comandar o estado, mesmo sendo oposição ao governo federal, não influenciaria a medida. “Jamais faremos oposição ao povo de qualquer estado e o povo do Ceará precisa neste momento”, afirmou. Moro “foi muito rápido, hábil e eficaz para atender o estado, cujo governador reeleito tem posição radical à nossa (sic).”

HISTÓRICO

Segundo dados do Fórum Brasileiro de Segurança, o Ceará foi, em 2017, o terceiro estado do país com mais mortes violentas. A taxa foi de 59,1 mortos a cada 100 mil habitantes. À frente do estado estiveram apenas Rio Grande do Norte (68) e Acre (63,9). 

Em 2018, segundo dados divulgados pelo estado, houve queda de 10,5% na taxa de homicídios entre janeiro e novembro de 2018, comparado com 2017.

Mesmo assim, no ano passado ocorreu a maior chacina da história do Ceará, com 14 mortos durante uma festa na periferia de Fortaleza, em janeiro, e a morte de seis reféns após ação policial para evitar assalto a dois bancos em Milagres, no interior, em dezembro.

Em sua primeira entrevista como ministro, Moro disse é preciso retomar o controle das penitenciárias do país. 

“Pretendo que o departamento Penitenciário (Depen) incremente qualidade nas penitenciárias para absoluto controle das comunicações das lideranças de organizações criminosas com o mundo exterior. Precisamos com investimento e inteligência recuperar o controle do Estado sobre as prisões brasileiras”, disse.

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