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Fabricio Rebelo

O legítimo direito de acesso a armas

A posse de arma dá à vítima o reequilíbrio de uma equação hoje plenamente favorável ao criminoso

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Fabricio Rebelo

O presidente Jair Bolsonaro (PSL) assinou na semana passada o decreto que facilitou a posse de armas em todo o país. A medida foi publicada em edição extra do Diário Oficial da União do dia 15 de janeiro. Veja a seguir opinião a favor da iniciativa do novo governo.

A primeira medida de impacto adotada pelo Presidente Jair Bolsonaro (PSL) consistiu na reformulação das normas que regulamentam a posse de armas de fogo. Como já é comum sempre que o tema vem à tona, o decreto publicado pelo governo desencadeou uma série de novos debates acerca do direito de autodefesa, desvelando uma substancial carga ideológica nas argumentações.

Leia também o artigo contrário ao decreto presidencial

No cerne do debate, põem-se os possíveis efeitos do acesso a armas na segurança pública, especialmente no quantitativo de homicídios. É intuitivamente natural. Num país com mais de 63 mil crimes letais ao ano, dos quais mais de 72% são cometidos com armas de fogo, a associação entre os dois dados é convidativa. Porém, esse simplismo associativo passa muito longe dos legítimos critérios de análise.

Primeiro, é preciso ficar claro que acesso a armas de fogo não é política de segurança pública. O cidadão não se transforma em policial pelo fato de estar armado e muito menos vai perseguir criminosos nas ruas, isso será sempre uma função do Estado. O acesso aos meios necessários para a legítima defesa representa, em verdade, a garantia de um direito individual do cidadão, o de preservar a sua integridade, justamente quando o Estado já falhou e ele já está sofrendo ou na iminência de sofrer uma injusta agressão. É a expressão máxima da inviolabilidade do direito à vida, prevista como fundamental na Constituição Federal (em seu artigo 5º).

Num segundo ponto de análise, os efeitos desse direito não podem ser compreendidos sem a apuração criteriosa das características da criminalidade brasileira, o que, infelizmente, é bastante negligenciado quando a ideologia se torna vetor de argumentação.

No Brasil, a raiz causal dos homicídios é a prática delitiva habitual, ou seja, a esmagadora maioria dos crimes letais está relacionada a outras práticas criminosas, tendo como autores indivíduos já dedicados aos ilícitos e para os quais o acesso às armas não é um fim, mas um crime meio —e a própria ONU já assim reconheceu (Global Study on Homicide, 2011 e 2014). Esses agentes não são impactados pelas restrições legais a armamento, pois dele se munem na clandestinidade. As armas que usam para matar já são ilegais.

De outro lado, o grande fomento do crime é facilmente identificado: a impunidade. A média nacional de elucidação de homicídios é pífia (menos de 10% no último levantamento); os já quase dois milhões de roubos, apenas nas capitais, em boa parte não são sequer investigados. E, sem investigação e esclarecimento, os responsáveis por crimes não são punidos, deixando de temer a sanção do Estado.

É justamente aí, quando o receio da punição desaparece, que a possibilidade de defesa assume papel de relevo. Na ponderação entre riscos e benefícios de que resulta a opção pelo crime, a chance de autodefesa da vítima configura inegável fator de inibição ao agressor, refreando seu ímpeto delitivo. É o reequilíbrio de uma equação hoje plenamente favorável ao criminoso, que dá à vítima um mecanismo de proteção e incute naquele um maior receio das consequências de sua investida.

Fabricio Rebelo é coordenador do Centro de Pesquisa em Direito e Segurança (Cepedes) e autor do livro “Articulando em Segurança: contrapontos ao desarmamento civil”.

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