Obra de construtora provoca rachaduras e obriga sr. Ho, 90, a deixar sua casa em SP

Movimentação de máquinas causou estragos no local, que foi interditado pela Defesa Civil

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São Paulo

Mesmo sendo véspera de Natal, máquinas que operavam para levantar um novo empreendimento imobiliário de alto padrão na Vila Mariana, zona sul de São Paulo, começaram cedo a movimentar o solo e fazer barulho.

Elas também estremeceram a estrutura da casa do imigrante chinês Ho Fat Son, 90, que aguardava a família para os festejos natalinos, mas teve de deixar às pressas o local onde vivia havia 36 anos.

Os estragos feitos no sobrado onde o sr. Ho morava foram tão grandes —com rachaduras no chão e no teto, paredes que desabaram e trincas variadas— que a Defesa Civil Municipal interditou o local, que só poderá ser reabitado após uma ampla reforma.

A família afirma que, até agora, ninguém da construtora Nortis, responsável pela obra, os procurou para tratar dos estragos. A empresa, por sua vez, diz que tentou, sem sucesso, fazer uma vistoria prévia na residência antes da obra.

Ho tem apego afetivo à casa, que tem quatro quartos, três banheiros e uma sala grande, e nunca quis vendê-la. Acumula ofertas de centenas de milhares de reais pelo terreno, que tem cerca de 400 m².

“A história da nossa família virou entulho. A probabilidade de alguém cair naquele buraco de 5 a 10 metros com remoção das paredes e dos muros era enorme. Fora o perigo de desabamento da casa toda por causa das rachaduras. A casa ficou toda exposta para bandidos entrarem a qualquer momento”, conta um dos cinco filhos de Ho, o comerciante Yuk Kion ho, 50.

Ainda segundo o filho, o pai está em choque e desorientado. É a única casa que ele conseguiu construir ao longo da vida. Sr. Ho fugiu da China durante os anos de repressão da Revolução Cultural Chinesa, na década de 1960.

Ele chegou ao Brasil a bordo de um navio. Durante cinco anos, dormiu no restaurante que trabalhava como cozinheiro para economizar dinheiro e trazer o resto da família, que havia ficado no oriente (a mulher e dois filhos).

“Foi muito triste ver meu pai naquele estado. Chocado com tudo o que aconteceu e sem ter direito de defender a nossa honra. Cancelamos as comemorações de fim de ano e levamos ele e minha mãe [Lam Wong Kiu, 86] para viajar, na tentativa de esquecer todo aquele pesadelo. Eles querem ficar no canto deles e fazer as coisas do jeito deles. Querem a casinha deles.”

Uma das paredes da casa chegou a cair totalmente e expor um dos cômodos do imóvel a uma cratera com cerca de cinco metros de profundidade. Em nota, a Defesa Civil informou que os estragos são de “médio e grande” portes.

Ainda de acordo com a família, depois da situação de estresse, sr. Ho “parece ter” agravadas suas doenças: diabete, pressão alta, refluxo gastro intestinal e inflamações reumáticas.

OUTRO LADO

Por meio de nota enviada por sua assessoria de imprensa, a construtora Nortis informou que tentou por seis vezes fazer contato com a família de Ho Fat Son para a realização de uma vistoria na casa, antes do início da obra, mas que não teve sucesso.

“A Nortis esclarece que tentou contato com o Sr. Ho Fat Son para realizar um laudo de vistoria prévia em seu imóvel, requisito das boas práticas de avaliação de impacto de obra na vizinhança. Apesar de ter tentado este contato pessoalmente, por seis vezes, além de diversas outras tentativas via Correios, não obteve retorno do vizinho para elaboração do referido laudo”, informa.

Ainda segundo a empresa, “todos os demais imóveis vizinhos contatados aceitaram a realização da vistoria prévia.”

O laudo, segundo a construtora, “permitiria conhecer o estado do imóvel e avaliar corretamente o impacto que a obra pudesse provocar, permitindo saber o que era preexistente e o que realmente foi provocado pela obra”.

A empresa alega que não foi informada pela família dos danos na casa e que apenas constatou que o muro que divide os terrenos, pertencente a ela, foi removido, mas que pretende repará-lo.

Ao final da nota, a construtora informa que “lamenta o ocorrido e esclarece que caso sejam constatados danos comprovadamente ocasionados pela execução da obra, não vai se eximir de suas responsabilidades prestando toda assistência ao proprietário.”

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