Sequência de ataques põe turistas em alerta no Ceará

Para associação, onda de violência pode ter reflexo futuro no turismo

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Fortaleza

​O quarteto de amigos estudantes de engenharia de Campina Grande, na Paraíba, adotou um procedimento desde que chegou a passeio em Fortaleza, na segunda (7): sai da pousada sem celulares e com dinheiro contado para o que pretende fazer na rua. Eles estão com medo na cidade que viveu nesta terça-feira (8), o sexto dia de ataques criminosos atribuídos a membros de facções.

“Programamos essa viagem um ano atrás. Se estivéssemos programando hoje, provavelmente tiraríamos Fortaleza do roteiro”, disse Álvaro Batista Lima, 24.

Eles viajaram da cidade natal de carro ao Ceará e já passaram por Canoa Quebrada, em Aracati, famosa praia do litoral leste. O destino seguinte será Jericoacoara, no oeste do estado. “Lá [Canoa Quebrada] estava muito tranquilo. Mudou quando chegamos aqui, estamos tensos”, afirmou Vinicius Malheiros, 25.

Praia do Mucuripe vazia em tarde chuvosa em Fortaleza
Praia do Mucuripe vazia em tarde chuvosa em Fortaleza - Marcel Rizzo/Folhapress

Os amigos alugaram bicicletas e passeavam pela avenida Beira-Mar na tarde desta terça, onde está a principal concentração de hotéis de Fortaleza. O dia nublado, e o fato de a via estar em reforma no projeto de requalificação, já deixaria a Beira-Mar mais vazia do que de costume para uma terça-feira. “Mas não é a chuva ou a obra, está mais vazio do que nunca. Estamos abandonados”, disse José Belchior, 60, funcionário de um restaurante na praia do Mucuripe.

Trabalhando na área de manutenção do mesmo restaurante há mais de 20 anos, Belchior disse que nunca viu a praia e as mesas tão vazias depois que os atentados começaram, na noite de quarta (2) da semana passada. Às 14h, apenas uma mesa estava ocupada. 

“E foi a única que atendemos até agora, num restaurante desse tamanho, com 80 mesas. Em dia normal estaria bem movimentado. Ontem [segunda, 7] foi igual, começou a boataria de que era para fechar as portas dos comércios e ninguém desceu dos prédios aqui em frente”, afirmou Belchior.

O pior pode estar por vir. Para Eliseu Barros, presidente da ABIH ( Associação Brasileira da Indústria de Hotéis do Ceará), por enquanto não há reflexo negativo no turismo no estado porque as pessoas que estão no Ceará no momento compraram seus pacotes antecipadamente. A ocupação dos hotéis está em 80% das acomodações, número normal para janeiro. 

Se essas ações se prolongarem, podemos ter um reflexo no futuro, com pacotes e viagens que estão sendo fechadas agora. Mas estamos vendo uma melhora e não houve incidentes em áreas turísticas como o Beach Park (na cidade de Aquiraz, na Grande Fortaleza), Beira-Mar, Praia do Futuro, onde os turistas transitam com frequência”, disse Barros.

O casal argentino Rubén Damian Tófolli, 29, e Karen Irattiui, 25, estavam programados desde setembro de 2018 para viajar pela primeira vez ao Ceará. No início da tarde de terça, levavam o filho Mateo, de oito meses, no colo de volta ao hotel no bairro do Meirelles, região nobre de Fortaleza. Não tinham ouvido falar dos atentados criminosos que há seis dias amedrontam a cidade. “Mas é perigoso andar por esse bairro?”, perguntou Irratiui.

“Há muitas favelas por aqui, por isso os problemas?”, foi a pergunta de Tóffoli, que é contador na cidade de Corrientes, distante mais de 900 km de Buenos Aires. “Ganhamos a viagem da mãe de Karen, estamos em três casais aqui. O preço estava bom e havíamos ouvido falar das belezas das praias”, disse Tófolli.

Poucas informações sobre os atentados também tinha Carlos Alex Seidel, 39, e sua namorada Rafaela Gomes, 31, do Espírito Santo. Eles chegaram a Fortaleza no início desta terça e ouviram alguns comentários de violência no hotel. Eles programaram a viagem há dois meses, e se olharam por alguns segundos quando perguntados se mudariam os planos se fossem escolher o destino hoje, sabendo da violência em Fortaleza. “Vamos para outras praias do Ceará também, Jericoacoara. Teríamos vindo”, disse Gomes.

O turismo, segundo o Governo do Ceará, representa atualmente 5% do PIB (Produto Interno Bruto) do estado, mas essa participação deve aumentar nos próximos anos, principalmente em consequência do “hub aéreo” (Air France/KLM/Gol) que levará mais voos internacionais ao estado e deve atrair turistas de novos mercados.

Em 2017 também foi inaugurado o aeroporto de Jericoacoara, que na verdade fica em Cruz, a 30 km da famosa praia da cidade de Jijoca, mas que até dois anos atrás tinha o aeroporto de Fortaleza, a 300 km, como acesso mais próximo. Há perspectiva de que o turismo não só em Jericoacoara, mas também em outras praias do litoral oeste, como Camocim e Acaraú, aumente com o decorrer dos anos —hoje são voos saindo de São Paulo, Belo Horizonte, Recife e Campinas. Tudo isso, claro, pode depender da questão da segurança.

“Tivemos algumas pessoas perguntando às agências sobre informações de como estava a situação, alguns remanejamentos de datas de viagem, esperando baixar a poeira para viajar ao Ceará. Claro que essa situação arranha a imagem de Fortaleza e do estado, turisticamente, e preocupa famílias que queiram viajar, mas a situação já toma um relativo controle. Acredito que não teremos problemas com os pacotes de Carnaval e Semana Santa”, disse Colombo Cialdini, presidente da ABAV (Associação Brasileira de Agências de Viagens) no Ceará.

O Governo do Ceará informou que os policiais estão distribuindo folders contendo dicas de segurança em três idiomas, com telefones úteis dos órgãos de segurança, além de telefones de emergência e informações em geral. Informou também que o Batalhão de Policiamento Turístico (BPTur) conta com 700 homens e 50 viaturas e que a vila de Jericoacoara recebeu em dezembro de 2018 uma delegacia móvel da Polícia Civil, funcionando 24 horas por dia. 

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