Justiça de Pernambuco manda parar demolição do cais José Estelita

Vários galpões, em área de valor histórico, já haviam sido derrubados

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Recife

Um dia após a Prefeitura do Recife ter concedido alvará para demolição do cais José Estelita, no centro da cidade, a Justiça mandou interromper na manhã desta terça-feira (26) a derrubada dos armazéns.

A decisão assinada pelo juiz da 5ª Vara da Fazenda Pública Augusto Angelim determina que o município do Recife suspenda imediatamente a licença deferida para execução das obras no José Estelita.

O despacho, que atendeu a um pedido do Ministério Público de Pernambuco, também ordena que o consórcio Novo Recife, responsável pelo empreendimento imobiliário, suspenda qualquer atividade no local. A Justiça determinou multa diária de R$ 5 mil em caso de descumprimento. 

O consórcio Novo Recife informou que a demolição foi paralisada assim que foi notificado da decisão judicial. Vários galpões já foram demolidos. O Novo Recife não soube informar a quantidade.

Manifestantes do movimento Ocupe Estelita continuam acampados na calçada em frente ao terreno. Na tarde desta terça-feira, vai ocorrer um ato cultural na área.

Seguranças armados e sem farda ou qualquer tipo de identificação da empresa em que trabalham, contratados pelo consórcio Novo Recife, fazem a vigilância do local. Um deles informou à Folha que era policial militar.

Na tarde desta segunda-feira (25), integrantes do movimento Ocupe Estelita, contrários à construção do empreendimento, pediram a policiais militares do Gati (Grupo de Apoio Tático Itinerante) que revistassem os seguranças.

Os policiais não atenderam o pedido. Um homem que se identificou como o chefe dos seguranças portava uma arma. O cabo do revólver estava saindo pelo bolso de trás da calça.

Um deles disse a três manifestantes que iria prendê-los. Logo em seguida, após ser questionado pela Folha se poderia efetuar a prisão, afirmou que era policial militar.

Em nota, o Consórcio Novo Recife informou que vem mantendo, no terreno, serviço de segurança privada prestado por empresa contratada, com apoio de vigilância desarmada, para preservar a integridade física de seus colaboradores, transeuntes e demais pessoas nos arredores.

Por meio da assessoria de comunicação, a Polícia Militar de Pernambuco informou que o comando do 16º Batalhão foi acionado e vai realizar a devida apuração dos fatos. 

A PM fez um apelo para que todos que observarem alguma atitude irregular, praticada por policiais militares, denunciem o fato à Corregedoria. Em nota, explicou que a denúncia pode ser feita pelos números 181 ou 0800-081-5001, das 7h às 19h.

Manifestantes passaram a madrugada acampados na frente do terreno. Não houve conflito com a polícia. 

A área em questão é alvo de cinco processos judiciais e um inquérito na Polícia Federal.

A Prefeitura do Recife havia autorizado na segunda-feira (25) o início da demolição de alguns galpões do terreno. Não existe ainda autorização para construção. O alvará de demolição estava suspenso pela prefeitura desde 2014. 

O poder municipal informou que o documento foi emitido atendendo à solicitação dos responsáveis pelo projeto e está em conformidade com as normas de licenciamento vigentes, incluindo a anuência do Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional). 

“A Prefeitura do Recife requentou um alvará de 2014. Há uma ilegalidade. Havia uma suspensão por exigência. Seria necessário um novo pedido”, alega Leonardo Cysneiros, integrante do movimento Direitos Urbanos.

A Secretaria de Mobilidade Urbana afirma que não existe ilegalidade. Ressaltou, por meio de nota, que 28 armazéns próximos ao viaduto das Cinco Pontas vão ser preservados e restaurados pelos empreendedores.

A Prefeitura do Recife comunicou que, para início das obras, será necessário um outro alvará. O Consórcio Novo Recife, responsável pela construção, afirmou que a ação de demolição está amparada no alvará expedido pela prefeitura

O projeto aprovado pela Prefeitura do Recife prevê a construção de 13 torres residenciais e comerciais, que variam de 12 a 38 andares, num terreno de 107 mil metros quadrados onde existem antigos armazéns de açúcar, considerados pelo Ministério Público de valor histórico. O investimento previsto no local é de R$ 1,5 bilhão. 

Em novembro de 2015, a Justiça Federal chegou a anular o leilão de compra do terreno, ocorrido em 2008. A decisão judicial também impedia o poder público de avaliar qualquer projeto na área. 

Em 15 de dezembro de 2015, a anulação do leilão foi suspensa pelo Tribunal Regional Federal (TRF-5).

Um ano antes, ativistas tinham dado início ao movimento que ficou conhecido como Ocupe Estelita, que se opõe à obra. Em protesto, chegaram a montar acampamento na frente da casa do prefeito do Recife, Geraldo Julio (PSB).

Eles alegam que o empreendimento irá descaracterizar a paisagem do centro histórico da cidade e defendem o uso pública da área.

Inquérito da Polícia Federal apontou evidências de fraude e direcionamento no leilão realizado pela empresa Milan Leilões, contratada pela Caixa, o que teria permitido ao Consórcio Novo Recife arrematar a área por cerca de R$ 10 milhões abaixo do valor de mercado. A Caixa nega irregularidades. 

De acordo com laudo realizado na época e citado pela polícia, o terreno foi avaliado em R$ 65 milhões, mas o valor inicial do leilão foi de R$ 55 milhões, pelo qual foi arrematado. O Consórcio Novo Recife foi o único participante da disputa.

Em 2015, a delegada da Polícia Federal Andrea Pinho, responsável pelas investigações, afirmou que as fraudes ocorreram em todo o processo de licitação, desde a publicação do edital, como falta de especificação sobre os critérios para habilitação das empresas interessadas.

Outro problema identificado nas investigações foi o descumprimento dos prazos legais mínimos exigidos em todas as etapas para o certame. O intervalo entre a publicação do edital e a habilitação do vencedor, por exemplo, foi de 13 dias, quando a lei exige ao menos 30 dias, para que outros interessados possam recorrer das decisões.

O Consórcio Novo Recife é formado pelas empresas Ara Empreendimentos, GL Empreendimentos, Moura Dubeux Engenharia e Queiroz Galvão. A área adquirida pertencia ao espólio da Rede Ferroviária Federal.

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