Descrição de chapéu Alalaô

Proliferação de blocos infantis desperta em pais e mães foliões adormecidos

Clima tranquilo e repertório atraem crianças e saudosistas das matinês de décadas passadas

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São Paulo

O confete, a serpentina, as marchinhas e o costume de se fantasiar continuam os mesmos. O ambiente, porém, deixou de ser o dos salões dos clubes e migrou para o ar livre, na rua.

Paulistanos que, quando crianças, curtiam as matinês nos clubes nas décadas de 1970, 1980 e 1990 agora resgatam o clima dos carnavais de antigamente levando seus filhos a blocos com perfil família.

Neste ano, ao menos cinco blocos classificados como infantis desfilam em São Paulo, segundo a prefeitura, além de 218 outros blocos familiares, alguns de pequeno porte, outros, filhotes de blocos maiores —como o Pasmadinho, da Confraria do Pasmado.

Com boas lembranças das matinês dos clubes na infância, a gerente de recursos humanos Michela Forato, 41, e o marido resgataram o gosto pelo Carnaval após o nascimento dos filhos, Maria Eduarda, 5, e João Bernardo, 2.

“Depois da infância e adolescência nos clubes do interior, parei de curtir o Carnaval porque não tinha muitos blocos. Aproveitava o feriado para viajar e descansar”, diz Michela. “Com o nascimento das crianças e a volta dos bloquinhos, ficar em São Paulo passou a ser uma opção.”

Ela vê semelhanças dos blocos infantis de hoje para os bailes de clube. “Tem esse aspecto de trazer de volta as marchinhas da época dos nossos pais e avós. É uma bagunça saudável, virou uma opção para as famílias curtirem juntas.”

Michela recorda que o ritual, no passado, era mais artesanal. “Era tudo muito caseiro, lembro da minha mãe preparando fantasias bem simples. Hoje compro fantasias prontas, até por falta de habilidades manuais”, diz.  

“Carmem Miranda. Minha mãe adorava me fantasiar de Carmen Miranda”, diz, rindo, a nutricionista Juliana Signorini, 33, mãe de um menino de seis anos. “Hoje as opções são mais variadas, adoro comprar adereços. A gente vira um pouco criança também.”

Como o clube que frequenta ainda faz matinês, Juliana alterna esses bailes com os blocos de rua. “No espaço fechado, a vantagem é que não precisamos nos preocupar com o tempo e dá para ir mesmo quando chove. Já o bloco é muito mais animado, você sente que é uma energia diferente. Eu prefiro”, afirma.

Ela vê como uma vantagem também a diversidade de foliões nas ruas. “É menos monótono, não são sempre as mesmas pessoas. Você vê gente diferente, tem de tudo.”

Caçula da família, a fisioterapeuta e percussionista Helen Henrique, 42, sempre herdava as fantasias da irmã ou das primas. “Eu ficava brava com nisso. Hoje minha casa tem um camarim inteiro de fantasias”, conta, rindo.

Suas memórias do Carnaval da infância são tão positivas que foram uma inspiração para que ela criasse um dos blocos para crianças mais conhecidos de São Paulo, o Mamãe eu Quero.

“Minhas melhores lembranças de infância são de me fantasiar, de minha mãe cantar marchinhas. A gente saía para comprar tecido, fazia tudo junto”, lembra ela, que participava de bailinhos no clube e no condomínio do prédio onde se hospedava, no litoral. 

“Com o tempo, veio o evento no sambódromo, que é totalmente comercial, e esse Carnaval em família foi se perdendo.”

Com o renascimento dos blocos de rua em São Paulo, e após se separar do pai do filho, Lucas, Helen começou a tocar percussão em blocos adultos, mas tinha dificuldade de levar o pequeno aos ensaios, que eram à noite.

Em 2015, o Mamãe eu Quero desfilou pela primeira vez, com uma bateria de músicos vestidos de super-heróis. 

“O que eu mais queria era levar essa felicidade para o meu filho”, diz.

Entre as diferenças do passado, ela se lembra de jogar papel picado do alto do prédio —“a gente passava cinco dias picando papel sem parar”, conta, fazendo o filho rir— e das “guerras de água” com bisnaguinhas coloridas de plástico.

Ao estudar um pouco da história da festa, descobriu que desde os primórdios, na época do Brasil Colônia, existia o hábito de jogar algo nos foliões —água, farinha, frutas podres e até urina. 

“Sempre teve esse tipo de interação. Hoje são aqueles sprays com espuma, que as crianças amam”, diz.

“Criança sempre brincou Carnaval”, afirma Zélia Lopes da Silva, professora de História da Unesp e autora de livros sobre o tema. 

“Há fotos da década de 1920 de meninos e meninas fantasiadas de ciganas, dançarinas, cowboys, palhaços. Nessa época já existiam as matinês, específicas para elas.”

Segundo a historiadora, em meados do século passado, havia bailes de Carnaval não só em clubes de São Paulo, mas também em estádios, hotéis e até no saguão do aeroporto de Congonhas. E não eram apenas eventos de elite, pois havia opções também em espaços populares. “Todos os segmentos sociais tiveram seus bailes em espaços fechados.”

Hoje, alguns clubes continuam celebrando matinês, com novidades como food trucks, brinquedos infláveis e entretenimento com monitores. 

Mas os blocos de rua são a escolha de muitos pais saudosistas. “Basta ir, não tem que pagar. São democráticos”, afirma o executivo André Folli, 33. 

Também fã de Carnaval, sua mulher, a bibliotecária Suzana Cattani, 32, foi para o bloco grávida, no ano passado. Neste ano, a filha do casal, Elis, de oito meses, estreou no Carnaval vestida de palhacinha no bloco infantil Gente Miúda —onde esta repórter, que também frequentava bailinhos nos anos 80, esteve, e não só a trabalho: levou a filha de dois anos.

Para agradar aos pais, o repertório do bloco está repleto de músicas de grupos infantis dos anos 1980, como Balão Mágico e Trem da Alegria, em ritmo carnavalesco. 

“Queríamos trazer as crianças para perto e tocar no sentimento dos pais que viveram aquela infância”, afirma Kel Figueiredo, 38, criadora do Gente Miúda. “É um bloquinho infantil com toque retrô.”

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