Descrição de chapéu Grande SP

Retorno a escola em Suzano tem terapia em grupo com pais e filhos

Pedidos de desculpas, reivindicações por segurança e medo de bullying aparecem em conversas

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Estudantes fazem homenagem em frente à Escola Estadual Raul Brasil, em Suzano
Estudantes fazem homenagem em frente à Escola Estadual Raul Brasil, em Suzano - Danilo Verpa/Folhapress
São Paulo

Uma sala antes tomada por cadeiras enfileiradas cede lugar para uma grande roda. Nela estão adolescentes, pais, psicólogos, pedagogos e um caxixi (chocalho africano).

O pequeno cesto de palha trançada com sementes dentro circula pelas mãos dos participantes e o seu barulho é usado para marcar o início da fala de cada um. É o momento de apresentação.

A primeira a falar é uma menina do 8º ano do ensino fundamental. Ela diz seu nome e chora quando relembra os amigos que morreram em sua escola.

Continua a chorar pelo peso que sentiu ao cruzar o saguão e não mais ver ali a tia Marilena, conhecida por ter, segundo ela, “o maior ombro amigo do mundo”.

Ela passa o caxixi para a colega do lado, que fala da saudade que sente de Eliana, a inspetora que não deixava ninguém flanar pelos corredores quando as aulas estavam acontecendo.

O caxixi passa pelas mãos de todos até o final da primeira rodada. Até ali, os 20 participantes já haviam compartilhado o trauma provocado pelo massacre que deixou cinco amigos mortos, além de Marilena, de Eliana e do tio de um dos dois atiradores.

Foi assim, com rodas de conversa mediadas por psicólogos, que a Escola Estadual Professor Raul Brasil, em Suzano (Grande SP), reabriu nesta terça-feira (19), seis dias depois da tragédia.

Além de escutar cada um, os dirigentes da Raul Brasil buscam respostas para uma pergunta recorrente antes da volta às aulas: onde foi que nós erramos?

Um pai que esteve na roda de conversas à qual a reportagem da Folha teve acesso faz uma mea-culpa. “Nós, pais, precisamos participar mais do cotidiano da escola.” Outro pai completa: “eu só venho aqui para pegar o boletim do meu filho. Isso não está certo”, diz.

A segunda rodada de conversa se inicia com duas perguntas: o que você precisa fazer para atravessar essa dor? E o que você pode oferecer para ajudar o outro?

Um aluno responde: respeitar o meu colega. Todos os presentes dizem ter consciência de que o ambiente escolar é um território fértil para o bullying, mas dizem querer uma mudança de postura. Falam em respeitar a diversidade e as limitações do outro. Afinal, dizem, ninguém é “perfeito”.

Outra aluna toma a palavra e afirma não querer entender a atitude de Guilherme Taucci, 17, ex-aluno da Raul Brasil e autor do massacre. “Ele foi um monstro. Mas é um fato que foi vítima de bullying. Não podemos reproduzir outros Guilhermes.”

As mães da roda aproveitam a oportunidade e oferecem abraços, orações e prometem estar mais presentes no cotidiano dos filhos.

Também há espaço para reivindicações. Os pais pedem mais segurança na escola e melhores condições de trabalho para os professores.

O caxixi circula na terceira rodada com outro desafio: conte uma experiência marcante vivida por você na Raul Brasil.

Os estudantes que já saíram do colégio citam a formatura como um dia inesquecível. Os que ainda estão lá falam do valor da amizade e da qualidade do ensino que recebem na escola.

A roda de conversas leva pouco mais de duas horas para terminar. Todos citam em uma palavra o que esperam daqui para frente. São ouvidos desejos como amor, resistência, respeito e superação.

Os nomes dos participantes são anotados em uma lista. Cada um será procurado novamente para novas sessões de terapia.

Todos se abraçam e seguem para o último compromisso do primeiro dia de atividades na Raul Brasil: soltar balões com os nomes das vítimas, que hoje estão no muro do colégio e na memória de todos.

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