Um dia, a professora Maria Lúcia Clementino Nunes notou que os alunos tinham a mania de esconder no mato a merenda que traziam, antes de chegar à porta da escola rural de Fazenda do Engenho, no interior da cidade do Serro (MG). Trazendo batata-doce e cará, tinham vergonha de mostrar a comida.
Ela resolveu chamar os pais para conversar. Como a comunidade era muito pobre, passaram a doar alimentos comuns da região, que ela transformava em pratos completos. Dona Lucinha fez da alimentação uma bandeira.
Nascida no Serro (a 230 km de Belo Horizonte), aprendeu a cozinhar ainda menina, com a avó. Aos 22, casou com o primo José Marcílio. Quando ele virou prefeito do Serro, os convidados eram recebidos com as comidas dela. Dona Lucinha ficou famosa e passou a receber convites para cozinhar pelo país.
Em 1973, depois de passar por dificuldades financeiras, a família abriu uma pousada e um restaurante na cidade. A matriarca cuidava da cozinha, o filho mais velho, Leandro, da administração. Hoje, o nome dela está em três restaurantes --dois em BH, um em São Paulo --chefiados pelas filhas, Márcia e Elza.
"Mamãe sempre foi batalhadora", diz Leandro, 63. "Foi professora, catequista, vereadora, diretora de clube, até abrir o restaurante em BH em 1990, e tudo isso com 11 filhos".
Com pesquisadoras, escreveu o livro "História da Arte da Cozinha Mineira por Dona Lucinha". A obra inspirou o samba-enredo da Acadêmicos do Salgueiro em 2015.
Na manhã de terça-feira (9), aos 86 anos, Dona Lucinha teve um infarto e morreu. Deixou o marido José Marcílio, 89, 11 filhos, 25 netos e a mesa mais farta de Minas Gerais.
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