Vale poderia ter agido antes para evitar risco de rompimento de barragem, diz senador

Os senadores Carlos Viana e Fabiano Contarato sobrevoaram região em Barão de Cocais (MG) nesta sexta (24)

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Belo Horizonte

A Vale poderia ter tentado desmontar o talude que vem se movimentando desde 2012, na mina Gongo Soco, em Barão de Cocais (MG), e assim mitigar os efeitos de uma eventual queda dele. A afirmação foi feita pelo senador Carlos Viana (PSD-MG), após uma visita à cidade que fica a 100 km de Belo Horizonte. 

Nesta sexta-feira (24), Viana e o senador Fabiano Contarato (Rede-ES) sobrevoaram a região da barragem Sul Superior, dentro do complexo de Gongo Soco, que corre risco de romper, dependendo do impacto da queda do talude. A barragem fica a 1,5 km abaixo da cava da mina. 

A barragem da mina Gongo Soco, da Vale, em Barão de Cocais (MG)
A barragem da mina Gongo Soco, da Vale, em Barão de Cocais (MG) - Leonardo Benassatto - 23.mai.2019/Reuters

“[A Vale] perdeu tempo. A Agência Nacional de Mineração (ANM) nos confirmou que o que temos, mais uma vez, é consequência do descaso e da irresponsabilidade na gestão de uma barragem que estava abandonada. Temos uma situação que tira o sono, a tranquilidade das pessoas e que poderia ter sido evitada”, disse Viana. 

Segundo Viana, ao Ministério Público de Minas Gerais, a Vale disse que não agiu antes porque a situação não era de risco. Uma declaração que ele classificou como “ideologicamente falsa”. 

O talude se movimentava cerca de 10 centímetros ao ano, mas na última quarta-feira, a movimentação passou a ser 9,6 centímetros por dia. 

Questionada pela Folha sobre medidas que poderiam ter sido tomadas anteriormente, a Vale respondeu apenas que “adota tecnologias com os parâmetros mais modernos de segurança e monitoramento disponíveis hoje no mercado e de referência internacional”. 

A empresa reiterou que a cava da mina Gongo Soco vem sendo monitorada 24 horas por dia, de forma remota, com o uso de radar, estação robótica e sobrevoos com drone.

A visita dos senadores ocorreu um dia depois da comissão do meio ambiente do Senado, presidida por Contarato, ter ouvido o ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, afirmar que não há barragens seguras no Brasil. Albuquerque declarou ainda que o número de fiscais responsáveis pelas estruturas de todo o país dobrou em sua gestão, passando de 8 para 16. 

“É ter a certeza da impunidade. Isso acontece no Brasil, porque as empresas sabem que elas não serão responsabilizadas nem civil, nem administrativamente, nem criminalmente. Elas têm a certeza da impunidade”, avalia Contarato. 

Para ele, a atuação do poder público tem se mostrado falha nos processos de fiscalização e monitoramento das barragens. Só Minas Gerais, lembrou o senador, registrou uma sequência de cerca de quatro acidentes com barragens desde 2001 e agora vive a iminência de um novo rompimento. 

No dia 2 de julho, a comissão parlamentar de inquérito sobre barragens deve entregar seu relatório final. Entre os pontos, segundo Viana, estão a exigência de que as atuais barragens de rejeitos sejam desmontadas dentro de dez anos e que as empresas sejam obrigadas a entregar a área recuperada como área de preservação. 

O relatório também deverá incluir o grau de responsabilidade de órgãos, entes e empresas em tragédias envolvendo a questão das barragens. Viana disse que em informações compartilhadas com a Polícia Federal, o Ministério Público Federal e de Minas Gerais, fica claro que a Vale poderia ter evitado as mortes em Brumadinho, como está fazendo agora em Barão de Cocais. 

O rompimento da barragem B1, na mina Córrego do Feijão, em 25 de janeiro, deixou 241 mortos e 29 pessoas seguem desaparecidas. “Todas as informações estavam disponíveis nos equipamentos, internamente e não foram tomadas as providências”, afirma Viana.  

Agora, o cenário de possíveis mortes seria “mínimo” diz ele. Em 8 de fevereiro, quando a barragem Sul Superior teve nível de risco elevado, cerca de 440 pessoas que viviam na zona de auto salvamento —a primeira a ser atingida— foram retiradas de suas casas. 

No final de março, quando a barragem passou para nível 3 —ruptura iminente ou já ocorrendo— os moradores da zona secundária, onde a lama chegaria em 1h12, passaram por simulado de fuga com a Defesa Civil estadual. 

ESTUDO DE RUPTURA

O estudo com hipóteses de ruptura da barragem Sul Superior —o dam break— estima que a inundação no caso de rompimento poderia se estender por 72,5 km ao longo dos rios São João e Santa Bárbara. Nos primeiros 52 km, a inundação seria mais expressiva.

O estudo foi elaborado pela empresa Potamos em 2017. O documento destaca possibilidade de atingir áreas urbanas e rurais, de problemas no abastecimento de água de comunidades e causar danos em pontes e travessias importantes em Barão de Cocais, Santa Bárbara e São Gonçalo do Rio Abaixo. 

Ele aponta a liquefação como modo de falha mais provável na estrutura. É o que poderia levar ao rompimento pelo impacto do talude, segundo a própria Vale. A queda do talude poderia criar vibrações e um abalo sísmico que serviria de gatilho para a liquefação. 

Ela ocorre quando a água se torna preponderante entre grãos de rejeito e diminui o atrito entre eles, que é o que mantém a consistência da massa de rejeitos. Podendo, assim, levar à ruptura.

Dos três cenários de ruptura estimados pelo estudo, apenas um considera a liberação de 100% dos rejeitos. Os outros dois fazem o cálculo de liberação de 35%. 

Na sexta-feira (17), uma decisão judicial determinou que a Vale realizasse um novo dam break “prevendo os impactos do vazamento de 100% de todas as estruturas de líquidos e rejeitos existentes nas barragens e estruturas do complexo minerário”. O estudo foi entregue pela mineradora na terça-feira (21). 

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