Sem polêmicas, Parada Gay mistura tom político e de micareta patrocinada

Evento teve críticas a Bolsonaro e elogios ao STF; estrelas como Mel C levantaram público

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São Paulo

Sem as grandes polêmicas que marcaram outras edições, a 23ª edição da Parada Gay de São Paulo, neste domingo (23), mesclou tom político e de micareta patrocinada.

O governo de Jair Bolsonaro (PSL) foi alvo de críticas por parte do público que tomou a avenida Paulista. No entanto, em um evento com trios patrocinados e com celebridades, o protesto acabou sendo diluído pelo clima de festa ao longo da tarde.

Logo no começo, alguns discursos de políticos insuflaram o público. A ex-prefeita de São Paulo, Marta Suplicy, afirmou que parada é uma "luta contra todo o retrocesso civilizatório". O deputado federal David Miranda (PSOL) disse que o evento era importante diante da existência de um "presidente homofóbico".

Fora dos trios, o prefeito Bruno Covas (PSDB) também cutucou o presidente, ao citar o "triste" episódio da demissão de um diretor do Banco do Brasil que contratou atores LGBT para uma propaganda e foi demitido a mando de Bolsonaro. "Que isso não seja uma política do governo", disse.

Na avenida, a drag Mona Alisa, 21, também fazia sua campanha eleitoral. "Vote 24! Chapa Eva e Adão, é viadão!".

O evento acontece numa "encruzilhada histórica", segundo Mona. Por um lado, a comunidade LGBT+ "está aterrorizada com esta família", diz em referência ao clã Bolsonaro. 

Para ela, a presidência de Jair Bolsonaro fortaleceu um rebote ultraconservador contra o grupo. Mas nem tudo está perdido, continua. Ela lembra que um dos maiores pleitos LGBT foi enfim atendido: a homofobia e a transfobia entraram no rol dos crimes de racismo após decisão do STF (Supremo Tribunal Federal).

Magali, 60, foi à Parada para acompanhar os dois filhos. Quando eles, primeiro o caçula e depois o mais velho, revelaram que eram gays, ela admite: morreu de medo. 

"O mundo ainda não vai ser fácil pra eles. Na nossa cidade o pessoal até sabe que eles são [homossexuais], ficam dizendo que tudo bem, desde que não comecem com 'boiolagem'. Acho triste."
Eles vieram do interior paulista, e os meninos, de 16 e 17 anos, pela primeira vez usavam maquiagem para passear na rua. Até aqui, no máximo, batom só se fosse em festinhas fechadas. 

Ninguém da família conhecia a revolta de Stonewall, tema desta edição. Há 50 anos, LGBTs de Nova York protestaram contra violentas batidas policiais realizadas num bar da cidade, o Stonewall Inn.

Na época, todos os estados americanos consideravam ilegais relações entre pessoas do mesmo sexo. 

"Ah, tipo o Brasil de hoje, pelo menos na prática", disse o filho mais novo de Magali. "Para algumas pessoas, parece que ser gay é criminoso."

Participantes da Parada do Orgulho LGBT fantasiados de super-heróis
Participantes da Parada do Orgulho LGBT fantasiados de super-heróis - Artur Rodrigues/Folhapress

Alguns participantes viram no viés comercial, com grandes marcas patrocinando trios, um freio ao tom contestador da parada --artistas costumam ter limites contratuais sobre barrando determinadas manifestações políticas. 

Celebridades que comandaram alguns dos trios falaram em transformar a Paulista em um baile funk e em Carnaval. Entre a multidão --a organização estimou a presença de 3 milhões de pessoas-- a grande maioria parecia estar mesmo a fim de festa. 

A parada teve trios comandados por shows de artistas como Iza, Mc Pocahontas, Luísa Sonza, Fantine, Lexa e da drag queen Gloria Groove, entre outras. A principal atração internacional foi Mel C, que levantou a Paulista com o hit "Wannabe", das Spice Girls. 

Além das bandeiras do arco-íris, muita gente caprichou nas fantasias para ir à Paulista. Roupas de super-herói estavam entre as preferidas. 

"A gente veio trazer alegria. Por isso, a roupa de herói", disse o enfermeiro Márcio Almeida, 29, fantasiado de Thor. Ele veio de Brasília acompanhado de mais sete amigos, todos vestidos como herói.

Para ele, a alegria é justificada porque há mais para se comemorar do que lamentar, "graças ao STF", tribunal que costuma sofrer muito mais ataques do que elogios. "Agora homofobia é crime". 

A presença dos poderosos da Marvel e DC Comics e também a da Polícia Militar não intimidou a grande quantidade de quadrilhas de ladrões que foi à parada apenas para furtar. A reportagem sofreu uma tentativa de furto e presenciou alguns casos em que o os criminosos tiveram sucesso, com vítimas lamentando celulares e carteiras levados. 

Por volta das 18h, horário previsto para o fim da Parada, já não havia mais trios elétricos pelas ruas. A rua da Consolação, porém, permanecia tomada pelo público do evento. Parte dele se juntou às pessoas que, nos bares, torciam pela seleção brasileira na Copa do Mundo Feminina de Futebol, em partida contra a França.

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