Aos 90, casarão do Instituto de Física em SP vira café

Prédio na rua Pamplona tombado pelo patrimônio histórico foi restaurado

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O casarão que abriga o café antes era a sede do Instituto de Física Teórica, agora vizinho 

O casarão que abriga o café antes era a sede do Instituto de Física Teórica, agora vizinho  Jorge Araújo/Folhapress

São Paulo

O café é especial e vem direto da fazenda da família. A comida fica por conta de um chef que veio da Nova Zelândia. Na varanda cercada de árvores, ouve-se o silêncio até de dia. Nem parece que você está a poucas quadras da avenida Paulista

Volta-se no tempo dos barões do café ao entrar no casarão dos anos 1930, que abrigava o Instituto de Física Teórica, no comecinho da rua Pamplona, escondido pelo bosque em meio a um terreno de 6,5 mil m². Nos fundos, foram plantados modernos arranha-céus de escritórios. 

Em outubro de 2018, José Lauro Afonso Megale, o “comendador” Laurinho, abriu na Praça Pamplona o Zel Café, com restaurante e livraria.

Mas a grande atração do lugar, chamado de gastrocafé, é ele mesmo. Dono da fazenda Talismã, onde planta café e cria cavalos manga-larga marchador, ele gosta de contar como chegou até este lugar tão improvável numa cidade como São Paulo.

“Estou com 63 anos, mais perto do fim do que do começo. Não posso esperar, senão não vai dar tempo de fazer tudo o que eu quero”. 

Numa mesa da varanda no meio da tarde, Laurinho pede mais um café e viaja até Borda da Mata, no sul de Minas, origem da família Megale, que tinha uma empresa de transportes de carga. 

Filho único de pai enérgico, na tradição italiana, ele não queria a vida pacata do interior mineiro e trabalhou até 2015 na empresa da família em São Paulo, quando o pai adoeceu e ele foi tomar conta da Talismã, que engordava boi. Não tinha nenhum pé de café lá. Só numa fazenda vizinha, que ele acabou comprando, mas o cafezal estava largado. 

O casarão restaurado, nos Jardins
O casarão restaurado, nos Jardins - Jorge Araujo/Folhapress

Pensou em tocar fogo em tudo para fazer pasto, mas mudou de ideia aconselhado por um amigo. Apaixonado por cavalos, montou primeiro um haras e, aos poucos, foi se interessando pelo café, orientado pelo professor Flavio Boren, especialista da Universidade de Lavras. 

A 1.100 metros de altitude, na Serra da Mantiqueira, começou com 50 mil pés e hoje tem 200 mil, que produzem café  avaliado entre 83 e 86 pontos, considerado especial. 

Com ajuda da filha Carolina e de Pedro Costa, responsável pela lavoura, o novo cafeicultor resolveu procurar um ponto de venda para o seu produto em São Paulo, pronto para o consumo. É aí que chegamos no casarão da Pamplona. 

Andando pela rua num final de tarde, ele parou na frente de uma obra que parecia abandonada e resolveu entrar no casarão, tombado pelo Patrimônio Histórico em 1952. 

“Vi apenas um senhor e perguntei com quem poderia falar no Instituto de Física”, lembra Laurinho. “Pode falar, sou eu mesmo, o presidente do instituto”, respondeu Gerson Francisco, que continua exercendo o cargo num moderno prédio construído ao lado. 

Acertaram tudo ali mesmo: Laurinho alugou o casarão com uma única condição de Francisco: além do café, tinha que cuidar da instalação de uma boa livraria.

“A primeira coisa que fiz foi contratar o chef, antes da obra de restauração ser concluída.”

A cargo de Shaun Dowling, a cozinha oferece do café da manhã ao jantar, com destaque para o “waving bonita”, prato com siri, camarão, mexilhões, creme de leite fresco e mostarda de Dijon. 

Para cuidar da Livraria do Comendador, chamou as irmãs Carol e Talita Camargo, criadas no ramo. Além de livros sobre café, cavalos e ciências, e dos best-sellers, há encontros e atividades culturais para crianças e adultos. 

Zeloso na montagem das suas equipes, o “comendador” —passou a ser tratado assim ao receber a comenda Olavo Fontoura do Sindicato da Indústria Farmacêutica, por serviços prestados pela sua empresa de transportes—,  está cuidando de abrir a primeira filial, no mesmo estilo, num imóvel alugado por 15 anos na Alameda Santos.

“A gente vive de sonhos”, diz o empresário, que agora divide o tempo entre o café de Borda do Campo,  exposições de cavalos e suas outras empresas. “Aprendi com meu pai: quando for fazer, faça bem feito. Fiz tudo da minha cabeça”. É o que ele ensina aos seus 30 colaboradores. 

O café, no 145 da rua Pamplona, abre diariamente das 7h30 às 22h30 (19h às segundas), exceto em domingos e feriados, quando opera das 8h às 17h. A livraria funciona em dias de semana das 8h às 20h.
Laurinho não cria mais gado, mas segue a máxima de que o olho do dono engorda o boi. “Quando a gente faz o trabalho com felicidade, o lucro é consequência.”  

Café no meio do mato sem sair da cidade? São Paulo também tem dessas coisas.

Erramos: o texto foi alterado

A fazenda Talismã fica em Borda da Mata (MG), na Serra da Mantiqueira, e não Borda do Campo, na Serra da Cantareira. O texto foi corrigido.

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