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Projeto leva a escolas de SP histórias de líderes negras

Adeola, voltado a crianças e adolescentes, foi criado por Denise Teófilo e Raísa Carvalho

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São Paulo

Contar histórias de líderes negras africanas e brasileiras pouco mencionadas em livros de história e da cultura da África a jovens de forma lúdica. Esse é o propósito do projeto Adeola (que significa “coroada com honras”), criado pelas estudantes Denise Teófilo, 25, e Raísa Carvalho, 27.

Entre as personagens lembradas estão Lucy (um dos fósseis mais antigos já encontrado na Terra), a rainha Nzinga (que governou o Ndongo, atual Angola, no século 17), Aqualtune (avó de Zumbi dos Palmares) e Teresa de Benghela (líder quilombola que viveu em Mato Grosso no século 18).

Na performance teatral, duas amigas, interpretadas por Denise e Raísa, encontram um par de brincos dourados dentro de um livro e embarcam em uma viagem no tempo. Encontram Nzinga, que as coroa “princesas guerreiras” com a missão de contar as histórias de suas ancestrais para todas as crianças do mundo.

A contação de história dura em torno de uma hora e meia. É permeada por composições musicais (“Paranauê”, clássica em rodas de capoeira, é uma delas) e elementos que remetem à cultura africana (como o turbante e o berimbau).

As duas amigas, naturais de Sorocaba (interior de São Paulo), lançaram o projeto em 2015. Na época, ambas estudavam na Ufscar (Universidade Federal de São Carlos) —Raísa ainda cursa biologia na instituição, enquanto Denise trocou o curso de economia por educomunicação na USP.

Faziam parte de um coletivo de estudantes negros na universidade e se aproximaram de uma ONG voltada a projetos sociais para crianças e adolescentes da cidade e que busca preservar as tradições africanas e afro-brasileiras.

Raísa Amaral, 27, e Denise Teófilo, 25, criadoras do projeto Adeola, que busca "afrobetizar" jovens
Raísa Amaral, 27, e Denise Teófilo, 25, criadoras do projeto Adeola, que busca "afrobetizar" jovens - Luane Chinaide/Divulgação

Receberam, então, a tarefa de “afrobetizar” estudantes. “Era para mostrar um DVD [para os alunos] e, a partir dele, fazer outra atividade”, conta Raísa. “Mas a gente analisou o material e percebeu que não tinha graça. E fomos pesquisar coisas novas.”

Passaram alguns dias e madrugadas garimpando histórias, contos e teses que servissem de base para a apresentação. E chegaram até a história da rainha Nzinga, conhecida por ter lutado contra a escravidão do seu povo, que depois as inspirou a buscar materiais de outras líderes africanas e brasileiras.

As próprias estudantes não tiveram muito contato com as personagens durante a infância, segundo elas. “São mulheres com histórias pouco contadas. A gente quer que elas habitem o imaginário infantil”, diz Denise. “Precisamos dialogar para combater o racismo, o sexismo e o machismo, contar narrativas para combater sequelas sociais.”

Um dos objetivos do projeto é garantir o cumprimento da lei federal de 2003, sancionada durante o governo Lula, que obriga escolas a abordarem a história e a cultura afro-brasileira nas aulas. 

“É só mais uma maneira de executar, mostrar que a lei precisa ser cumprida, que estar no papel não é suficiente”, diz Denise. “A gente reconhece o poder da educação, da arte, da cultura e de as crianças se sentirem reconhecidas, acolhidas e pertencentes ao coletivo do qual fazem parte.”

Raísa Amaral, 27, e Denise Teófilo, 25, criadoras do projeto Adeola, que busca "afrobetizar" jovens
Raísa Amaral, 27, e Denise Teófilo, 25, criadoras do projeto Adeola, que busca "afrobetizar" jovens - Sesc Santo Amaro/Divulgação

As princesas que as duas amigas interpretam durante as exibições, batizadas de Kambo e Funji, são uma versão ressignificada das duas irmãs de Nzinga, que teriam desaparecido após terem sido sequestradas por portugueses.  

As reações dos alunos costumam ser positivas. Contam que uma menina, estudante de uma escola em Araçoiaba da Serra (interior do estado), tomou coragem para ser protagonista de uma peça após assistir à performance e conhecer mais sobre suas raízes negras.

Outro aluno pediu para que autografassem um caderno dele e desenhassem o mapa da África para provar para a mãe que havia conhecido duas princesas.

Elas costumam se apresentar em instituições de ensino, coletivos e centros culturais. Cobram de R$ 400 a R$ 500, em média, pela performance. Estão investindo também na formação de educadoras e planejam lançar um livro com o conteúdo do projeto, para que seja difundido.

“Por mais efêmera que a contação de história ou formação possa ser, se é significante para a gente, também pode ser para essas crianças”, diz Denise. “Se for incentivada pela escola, família, mídia e sociedade em todo, pode ser muito transformadora.”

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