Um ano após acidente em atração, parque aquático aponta falha de fabricante

Versões conflitantes impedem desfecho de caso; família segue desamparada

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Salvador

Enquanto multidões de turistas desembarcam no Ceará e visitam nas férias de julho o complexo turístico Beach Park, em Aquiraz (30 km de Fortaleza), um de seus brinquedos segue lacrado e fechado para  visitantes.

Com a entrada cercada por correntes, a estrutura do Vainkará escancara a memória o maior acidente da história do parque, que matou o radialista Ricardo José Hilário Silva, conhecido como Ricardo Hill.

No dia 16 de julho de 2018, Ricardo e outras três pessoas desceram no toboágua, que havia sido inaugurado havia menos de uma semana. 

Durante a descida, a boia virou no final do percurso e o radialista bateu a cabeça no chão do brinquedo. Ele não resistiu ao ferimento.

Um ano após o acidente, a investigação que apura suas causas e responsáveis vive um cenário de guerra de versões, laudos conflitantes e ainda segue longe de um desfecho na Justiça, o que mantém a família do radialista desamparada.   

O inquérito foi concluído pela Polícia Civil em novembro de 2018 e remetido para o Poder Judiciário. O caso vem sendo analisado pelo Ministério Público do Estado do Ceará, mas os promotores ainda não ofereceram denúncia.

Em junho deste ano, contudo, Beach Park pediu que fosse anexado ao inquérito um relatório da perícia externa contratada pelo parque que apontou para falhas na estrutura do Vainkará e responsabiliza a fabricante do brinquedo, a empresa canadense ProSlide, pela fatalidade.

Realizada pela empresa norte-americana ESi, a perícia aponta para uma falha de projeto que resultaria na alteração da trajetória da boia, o que teria sido determinante para o acidente. “O design do referido toboágua resulta em situações onde a boia se torna instável e não segura, mesmo quando o peso dos usuários soma menos que os 320 kg recomendados pela ProSlide”, apontou o relatório, o qual a Folha teve acesso.

O documento vai de encontro ao inquérito da Polícia Civil, que responsabilizou o Beach Park pelo acidente. O laudo da Perícia Forense do Ceará apontou que havia excesso de peso e distribuição irregular de participantes na boia.

Segundo os peritos, o peso somado das pessoas que descem simultaneamente no toboágua deveria ser de no máximo 320 kg. Contudo, no momento do acidente, o peso de Ricardo e das outras três pessoas que brincavam no Vainkará chegava a 390 kg.

Os profissionais apontam  ainda que o brinquedo segue a mesma trajetória independentemente de qualquer movimento feito por um dos participantes e que estes não têm capacidade de intervir na dinâmica da descida.

O Beach Park, que chegou a entrar com um mandado de segurança para anular o laudo da Perícia Forense do Ceará, refuta a tese de que o peso tenha sido determinante no acidente. E destaca o trecho do laudo da ESi que diz que “com erro de projeto, não importa o peso da boia, pois acidentes poderiam ocorrer com qualquer peso”.

O parque aquático não adota nenhum procedimento para pesar os participantes antes de entrarem nos seus brinquedos. E, mesmo depois do acidente, não adotou nenhuma medida que alterasse este procedimento. “A perícia que contratamos aponta que peso não é um fator determinante, não teria porque mudar o procedimento”, justifica o advogado Cândido Bittencourt de Albuquerque, que defende o parque aquático nesta causa.

O Beach Park informou que relatório final da ESi causou indignação à empresa, destaca que cumpriu com todas as normas de segurança e que “é reconhecido, dentro e fora do país, por seguir tais parâmetros com eficiência e precisão”.

A defesa do Beach Park ainda questiona o fato de a empresa canadense ProSlide, fabricante do brinquedo, não ter sido investigada.

Em seu laudo, a Perícia Forense do Ceará alega que solicitou documentos à fabricante do brinquedo, inclusive o seu projeto de construção e instalação do Vainkará, mas não obteve resposta. “É como se, em um acidente de carro, não investigassem as condições veículo, mas apenas a forma de dirigir do motorista”, afirma o advogado Cândido Albuquerque.

Sem o avanço do processo, a família do radialista Ricardo Hill e as demais vítimas que se feriram no acidente seguem sem reparação legal. O Beach Park informou que “prestou toda assistência às vítimas e familiares”. 

O advogado da família, João Vicente Leitão, contudo, diz que a única assistência prestada aos familiares de Ricardo aconteceu no período do acidente, ainda no Ceará. 

Ele afirma que já apresentou uma proposta de acordo para reparação da família por danos morais, mas não obteve retorno. O valor da indenização não foi informado para não afetar as negociações. “A maior prova de que Beach Park se importa com a família da vítima seria fechar um acordo. A responsabilidade deles ou do fabricante no acidente pode ser  resolvida depois, mas o amparo a uma família não pode esperar”, diz o advogado. 

Segundo ele, o acordo é crucial para garantir o amparo da família, já que processos semelhantes levam, em média, 12 anos para serem concluídos e executados, garantindo a indenização  às vítimas.

A Folha solicitou entrevista à delegada responsável pelo caso, mas a Secretaria da Segurança Pública do Ceará emitiu somente uma nota na qual afirma que o inquérito foi concluído e remetido para a Justiça.

A ProSlide  informou que “tem cooperado com as autoridades locais na investigação envolvendo o caso e continuará a fazê-lo” e destacou que “tendo em vista que as  investigações não encerraram”, não iria comentar o caso. 

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