Descrição de chapéu Festa do Peão de Barretos

Montaria de touro em Barretos completa 40 anos com polêmicas e prêmio de até R$ 280 mil

Maior rodeio do Brasil começa nesta quinta-feira (15) em cidade do interior de São Paulo

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Ribeirão Preto

No começo elas eram tratadas quase que como atração circense, pagavam mal e atraíam poucos interessados em enfrentar animais considerados enormes. Já hoje são a principal atração entre as provas de rodeio no país, dão prêmios milionários aos seus campeões e são alvo constante de embates entre organizadores e entidades de proteção animal.

As montarias em touro completam 40 anos na Festa do Peão de Boiadeiro de Barretos (a 423 km de São Paulo), que começa nesta quinta-feira (15) com a expectativa de reunir 1 milhão de visitantes em 11 dias.

Ao final do Barretos International Rodeo, dia 25, o campeão sairá da arena de rodeios projetada por Oscar Niemeyer (1907-2012) levando como prêmio uma camionete de R$ 280 mil, cenário muito diferente do registrado nos primórdios da modalidade no país.

Touros na propriedade do tropeiro Marcondes Maia
Touros na propriedade do tropeiro Marcondes Maia - Ricardo Benichio/folhapress

Elas surgiram em 1979, impulsionadas pelo ex-peão Tião Procópio, 60, que inspirou Tião Higino, personagem de Murilo Benício na novela “América”. Vencedor da mais tradicional festa do país no ano seguinte, como prêmio ele levou para casa uma TV de 14 polegadas. “Colorida”, disse.

Os prêmios melhoraram, superaram os pagos nas montarias em cavalos (cutiano) e, na avaliação de organizadores e competidores, são compatíveis com os riscos que os atletas de rodeio correm nos 8 segundos —tempo para que uma montaria seja válida.

Preparados a partir de melhoramento genético, com ração equilibrada, água fresca, sombra, suplementos e veterinários disponíveis em tempo integral, os touros cada vez mais têm melhores desempenhos nas arenas. E estão mais fortes, chegando a pesar mais de uma tonelada.

A genética é usada para se chegar ao touro ideal para o tropeiro: que ganhe peso rapidamente ou não, tenha boa musculatura, sem tendência a acumular muita gordura ou para ter ossos mais finos e leves. Tudo para que ele pule mais e derrube os peões. Há touros cujo valor de mercado supera R$ 1 milhão.

Campeão em Barretos em 1999, Neyliowan Mulinari Tomazeli, 41, é um exemplo das duas faces dos rodeios. Em 2001, em Jaguariúna (SP), ele foi derrubado pelo lendário touro Bandido que, não contente, o arremessou a quase seis metros de altura. O peão caiu de cabeça, desmaiou, correu risco de ficar tetraplégico e passou nove meses numa cadeira de rodas.

Após se recuperar, desafiou o touro dois anos depois em Barretos e perdeu. “Nunca tive um pingo de medo dele, só tem medo quem não tem fé. Sinto vontade de morder o pescoço dele até hoje, mas medo? Não”, disse ele, que abandonou as arenas em 2005 e amealhou como prêmios em sete anos de carreira 11 carros, 2 camionetes e 29 motos, além de dinheiro. Investiu em duas fazendas, em São Paulo e Mato Grosso. “Enfrentaria tudo de novo.”

DÓLARES

No exterior, os peões têm se destacado nos mundiais da PBR (Professional Bull Riders). Em 25 edições, brasileiros conquistaram dez títulos, inclusive na última, que rendeu a Kaique Pacheco US$ 1,53 milhão (R$ 6 milhões).

Neste ano, o mais bem colocado é José Vitor Leme, terceiro no circuito, que amealhou US$ 302 mil (R$ 1,19 milhão) até aqui —a final é em novembro.

Mas nem tudo se resume a dinheiro e fama nas arenas, longe disso. Os rodeios são questionados com muita veemência por entidades de proteção animal, que afirmam que os animais sofrem tortura nas festas de peão, antes, durante e após serem usados nas montarias.

A principal queixa de associações como Amor de Bicho Não Tem Preço, Uipa (União Internacional Protetora dos Animais) e PEA (Projeto Esperança Animal) é o uso do sédem (cinta de lã que passa na virilha dos touros), mas não é a única.

Também fazem parte do cardápio de críticas a utilização de condutores elétricos (choque) nos animais e os excessos de luminosidade na arena (refletores e fogos de artifício) e de barulho (caixas de som e fogos).

“Essa prática deveria ser extinta. Que prazer há em ver o animal sofrer para a diversão de alguns?”, questionou a ativista Claudia Carli, da Amor de Bicho. 

Não é o que pensa o diretor de rodeios da festa, Marcos Abud, que afirma que estudos sobre o comportamento animal embasam a tese de que os animais não sofrem nas montarias e pulam por instinto.

“Sem os touros, as festas seriam como eram há 40 anos, mais folclóricas e culturais e menos profissionais. O cutiano só existe no Brasil. Como não ter rodeio de touros hoje? A molecada está ganhando tudo lá fora. Essas oportunidades surgem por causa de Barretos”, disse Abud.

Barretos vai distribuir cerca de R$ 1 milhão em todas as provas ligadas a cavalos e touros. Com 60 animais em seu plantel, dos quais 18 estarão em Barretos, o tropeiro Marcondes Maia, 45, criou um sistema que permite até a realização de mini-cirurgias no próprio curral da propriedade, em Uchoa (SP), para cuidar dos animais.

“Se houvesse maus tratos eu seria o primeiro a ser contra, nasci no campo. Um animal de ponta não custa menos de R$ 100 mil e, por mês, a manutenção chega a R$ 3.000. Vou arriscar esse patrimônio?”

Apesar de refutar a tese das ONGs, ele defende a existência delas como forma de balizar o mercado de rodeios. “Da mesma forma que não há governo forte sem oposição forte, as ONGs ajudam muito a termos todos os cuidados e a eliminar gente que possa manchar a imagem dos rodeios.”

REGRAS DA ARENA

A Festa do Peão de Boiadeiro de Barretos terá seis provas distintas de montarias em touros, além de disputas envolvendo cavalos, como team penning e três tambores. Surgida em 1956 em Barretos, a festa, que está em sua 64ª edição, teve apenas montarias em cavalos até 1979, quando foi introduzida a disputa entre peões e touros, a mais aguardada pelo público que nas finais lota a arena de rodeios —35 mil pessoas sentadas. 

Mas, como é definido o campeão? Como é a classificação? Nas montarias, as notas vão de 0 a 100 e são atribuídas ao desempenho do peão e do touro. Cada um é avaliado entre 0 e 50 pontos. Para que a nota seja válida, é preciso que o competidor permaneça o tempo estipulado de oito segundos sobre o animal.

Isso significa que, independentemente do desempenho, se o peão cair do touro antes do tempo mínimo sua nota será zero. Se a porteira for aberta e o touro ficar parado ou não pular, o peão tem a possibilidade de fazer uma nova montaria. Uma boa participação ocorre quando a nota fica acima de 85 pontos.

As provas envolvendo touros começam nesta quinta, com a disputa do rodeio interestadual, que terá montarias de competidores de 12 estados (SP, SC, MG, PR, ES, RJ, MT, MS, RO, PA, AC e TO).Cada time é formado por cinco peões e a pontuação de todos é somada. A equipe campeã e o peão que tiver a maior nota individual (independentemente da equipe) se classificarão para a disputa do Barretos International Rodeo, no segundo final de semana.

Nos mesmos dias ainda haverá o The American Run, uma disputa entre 15 peões em busca de vaga na semifinal do The American, rodeio nos EUA que tem premiação milionária. A terceira disputa entre peões e touros será realizada entre os dias 19 e 21, com a última etapa da LNR (Liga Nacional de Rodeio).Ela reúne campeões de rodeios disputados desde o segundo semestre do ano passado no país. Os peões mais bem classificados nos três dias disputarão a final da LNR dia 24. Já a etapa internacional, com peões de Brasil, Canadá e EUA, acontecerá entre os dias 22 e 25. 

O campeão também é definido a partir da somatória de notas nos quatro dias do rodeio.“Temos de oferecer atrações diferenciadas, que despertem a atenção do público. São competições distintas, mas com o mesmo propósito, que é apresentar bons espetáculos. Os melhores estão aqui”, disse Marcos Abud, diretor de rodeios da Festa do Peão. No mesmo período da fase internacional, também acontecerá a disputa do rodeio junior, para adolescentes, e as finais do campeonato da CNAR (Confederação Nacional de Rodeio).

Já entre as provas envolvendo cavalos, os destaques ficam por conta do team penning, em que um trio de cavaleiros tem de conduzir um número de bezerros para um curral, e de três tambores, em que as amazonas precisam percorrer na arena um triângulo formado por três tambores no menor tempo possível. 

A premiação será de cerca de R$ 1 milhão, somadas todas as modalidades em disputa. “Nos dois últimos anos, oferecemos prêmio [ao campeão em touros no rodeio internacional, R$ 280 mil] que se equipara aos dados nos EUA”, disse o presidente da festa, Ricardo Rocha. O campeão em cavalos levará um veículo de R$ 80 mil. A partir deste ano, os competidores terão à disposição a Casa dos Gigantes, local em que poderão fazer o aquecimento e se preparar para as montarias.

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