Descrição de chapéu
Ricardo Kotscho

CCSP revela outro mundo, entre a cacofonia e o silêncio

Centro já se propunha a respeitar individualidades muito antes de se falar em diversidade

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São Paulo

Ao chegar ao imponente prédio horizontal de concreto, ferro e vidro espichado como uma nave entre a avenida 23 de Maio e a rua Vergueiro, num terreno de 46.500 m² no bairro do Paraíso, zona sul de São Paulo, levei tempo para achar a entrada. 

Passara mil vezes por lá sem entrar. Não tinha ideia do que se escondia no maior equipamento cultural da cidade. 

Na calçada da Vergueiro, onde ficam as cinco entradas para o CCSP (Centro Cultural São Paulo), nenhuma com porta ou catraca, misturam-se moradores de rua, jovens das faculdades e vestibulandos. 

Num longo corredor, a moçada dança diferentes ritmos diante de vidros que servem de espelho. Cada um leva a própria caixa de som, em uma cacofonia estranha para os desacostumados.

Essa imensidão cultural foi criada pelos arquitetos Luiz Telles e Eurico Prado Lopes com a ideia inicial de construir uma biblioteca para aproveitar o terrenão desapropriado para obras da estação Vergueiro do metrô. Mas o espaço seria muito para apenas um uso. 

Telles e Lopes projetaram, então, um centro multicultural com três bibliotecas (uma de braille), gibiteca, cinco salas de teatro, cinema, música e espaços para exposições, que abriga o acervo de arte da cidade, com mais de 10 mil obras. Tudo entremeado por jardins, bosques, áreas livres e espaços para descanso. 

Inaugurado em 1982, o CCSP se propunha a respeitar individualidades muito antes de se falar em inclusão, diversidade e transversalidade. E é isso que a gente sente ao caminhar por suas rampas e corredores sem fim, até chegar ao jardim suspenso, palco para práticas de esporte e repouso para jovens nos intervalos entre faculdade e trabalho. 

A diretora, Erika Palomino, conta com 200 profissionais que, trabalhando num salão aberto, preparam os eventos. Ela reformulou quadros de direção e curadorias para promover inclusão e diversificar a programação, reativou a curadoria de dança e criou uma de moda, com oficina de modelagem e exposições. 

“Aqui se pode fazer o que quiser: deitar, comer, dormir, namorar, ler, chorar, dançar, cantar. Não temos guardas. Cada um escolhe seu espaço.” 

Moradores de rua são bem-vindos e dizem se sentir protegidos. Eles usam os banheiros e também entram nas rodas de dança, enquanto as crianças se divertem nos espaços livres. Podem até levar seus cães —algo proibido nos albergues municipais. A entrada de mascotes é liberada. 

As tomadas e o wi-fi potente atraem a vizinhança. Quase tudo é gratuito, sem necessidade de inscrição. Os espetáculos são acessíveis, e o fluxo de pessoas é constante.

Aos sábados, fica difícil achar mesa ou cadeira vazia. Você pode pensar que está no meio de uma quermesse, mas, se preferir o silêncio para ler um livro, também encontra.

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