Conhecido no segmento luxo, Isay Weinfeld projeta Minha Casa Minha Vida em SP

Empreendimento a ser lançado em fevereiro do ano que vem fica no centro, de frente para o Minhocão

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Croqui mostra a implantação do edifício Bem Viver Marquês de Itu, o prédio em tons azulados à esquerda, que é o primeiro projeto de Isay Weinfeld no ramo da habitação social; destinado à faixa HIS2 do Minha Casa Minha Vida, prédio será em frente ao primeiro trecho do parque Minhocão
Croqui mostra a implantação do edifício Bem Viver Marquês de Itu, o prédio em tons azulados à esquerda, que é o primeiro projeto de Isay Weinfeld no ramo da habitação social; destinado à faixa HIS2 do Minha Casa Minha Vida, prédio será em frente ao primeiro trecho do parque Minhocão - Danilo Zamboni/Divulgação
 
São Paulo

Quase todo estudante de arquitetura recebe em algum momento do curso a incumbência de projetar habitação social. Mas, aos 66, Isay Weinfeld diz que nem na faculdade tinha desenhado moradia popular.

Mais do que isso: seu nome é associado a projetos de luxo. “Luxo é uma palavra que não me interessa”, afirma, entretanto, o arquiteto. “As pessoas são geralmente um pouco bitoladas. Detesto pertencer a uma gavetinha específica.”

Por isso, quando a gaveta se abriu, ele pulou fora. Seu primeiro projeto de habitação social, batizado Bem Viver Marquês de Itu, deve ser lançado em fevereiro de 2020, no centro de São Paulo. 

Na esquina das ruas Marquês de Itu e Amaral Gurgel, de frente para o elevado Presidente João Goulart, o empreendimento da Magik JC é destinado à faixa conhecida como HIS 2, para famílias com renda de até seis salários mínimos, financiado pelo programa federal Minha Casa Minha Vida (MCMV). 

Por volta de 2015, o engenheiro civil André Czitrom passou a investir em construir prédios do programa na região central de São Paulo.

A partir deste ano, passou a investir em projetos de arquitetos renomados, ligados à academia, como Cesar Shundi Iwamizu, professor na Escola da Cidade e no Mackenzie, e Milton Braga, da FAU-USP. 

Mesmo nesse movimento, Weinfeld, que assina hotéis do grupo Fasano, residenciais de alto padrão em São Paulo e no exterior e o restaurante Four Seasons em Nova York, não parecia uma escolha óbvia para um MCMV.

“Fiquei muito feliz quando o André furou esse bloqueio, que se fura de uma forma muito simples —é pegar o telefone e ligar”, resume o arquiteto.

Weinfeld não estava propriamente esperando por esse projeto ao lado do telefone. Ao responder o que acha do MCMV, começa por dizer que não é um especialista.

“Mas, pelo que leio, ouço e vejo, o programa em si me parece muito bom. Onde acho que possa pecar um pouco é na qualidade do empreendimento e da construção.”

Isso porque, explica, quando se visa lucro, e a “iniciativa privada tem de dar lucro”, repetir fórmulas é mais simples. “Se você vai repetindo, sem levar em conta o terreno, a proporção, isso se sente.”

Após sua experiência no programa, elogia o fato de a Caixa Econômica Federal, financiadora do MCMV, ser “criteriosa no acompanhamento”.

Czitrom conta que a primeira coisa que Weinfeld lhe pediu foi a lista de todas as restrições impostas pelo programa —a Caixa coloca uma série delas, para que não só a construção mas também sua manutenção seja acessível. 

“A graça é fazer o melhor que posso dentro delas”, diz. Mas, lembra ele, “mesmo projetos que não são Minha Casa Minha Vida têm restrições”. 

“Fazer de mármore ou de cimento não faz diferença”, diz Weinfeld, para quem o material tem que ter a ver com o projeto e só. Faz sentido até usar ouro —se for um projeto “para o rei da Pérsia”. 

Isay Weinfeld em seu escritório, que fica em prédio projetado por ele na Vila Madalena, zona oeste de São Paulo; é um homem calvo, com óculos de armação grossa e barba grisalha; usa um cardigan bege sobre uma camisa branca, a calça também é clara; ele está numa varanda que tem um parede também bege e, em dois recortes nessa parede, um de cada lado do arquiteto, se veem prédios da região
Isay Weinfeld em seu escritório, que fica em prédio projetado por ele na Vila Madalena, zona oeste de São Paulo - Gabriel Cabral/Folhapress

Se o edifício, pelo programa, tinha de ser em alvenaria estrutural, mas não podia ter os tijolos à vista, como o arquiteto teria desejado, a pintura que os recobre ganha bossa na forma de um degradê que vai do azul ao branco.

Se não era possível eliminar um andar-tipo na altura do elevado, “tirar aquela fileira de apartamentos e criar uma relação” com o viaduto, a área comum migra para o terraço. “E tem uma vista linda.”

As esquinas são arredondadas, dando certo ar retrô ao desenho. Os espaços internos das 125 unidades, porém, não são generosos como os de um prédio antigo do centro. 

As de um dormitório têm 25 m²; as de dois, 34 m². A metragem limita as variações, mas Weinfeld criou quatro diferentes modelos de apartamentos, dispostos numa planta em “U” que garante a todas as unidades boa ventilação e vista.

O arquiteto diz não ter procurado compensar as superfícies pequenas com equipamentos variados. A prioridade de seu trabalho, afirma, e o que pede à sua equipe, é “bom desenho de espaço”. 

“Mais importante do que ter um patinetário, coisa que sai de moda, é ter a loja no térreo, o que deveria ser obrigatório” —serão duas, com pé-direito duplo, abertas para uma calçada ampla. “E uma churrasqueira, uma área comum com vista.”

O terreno terá como vizinho o primeiro trecho do parque Minhocão. Ou simplesmente o elevado, no uso que tem hoje —vai depender da Justiça, que avalia recurso da prefeitura, após a lei que cria o parque ter sido suspensa por uma liminar, em junho.  

Weinfeld, contudo, não coloca suas fichas no novo uso do Minhocão; diz que “de qualquer maneira” teria feito o projeto, que é anterior à promessa de fazer da via área de lazer em tempo integral. 

Na opinião do arquiteto, seria melhor se o elevado não existisse. “Mas, isso posto, antes o parque do que os carros. Tudo o que diminua ou suma com automóvel é bom.”

Weinfeld diz que adora andar a pé —mas não em São Paulo. O arquiteto queixa-se do espaço para os pedestres, inamistoso. Na cidade, diz, as calçadas obrigam as pessoas a “andar olhando para o chão”. 

Para ele, “o centro é muito bonito, tem prédios belíssimos”, mas, no geral, a graça da cidade reside no fato de ela “não ter personalidade”. A não ser, talvez, na periferia. 

Há quase cinco anos, ele vai todo domingo a um novo local. “Para chegar a um ponto novo, agora tenho que andar uma hora e vinte de carro.” 

O produto de seus passeios ele reúne em seu Instagram. São observações pessoais, closes, detalhes, imagens gráficas com legendas bem-humoradas.

O arquiteto esclarece que não visita as franjas da cidade pensando em oferecer soluções. “Não me vejo fazendo algo lá em tom professoral. Vou para aprender.”

Enquanto projeta o edifício na rua Marquês de Itu, conclui seu primeiro edifício residencial em Nova York.

O edifício dá de frente para o High Line, parque implementado numa antiga linha férrea desativada e, apesar das muitas diferenças, evocado como inspiração para o parque Minhocão.

Assim como o High Line não é o elevado, esse edifício, que foi batizado Jardim e fica pronto neste mês, não é um Minha Casa Minha Vida.

Encomendado por incorporadores americanos e construído pelo mesmo grupo italiano responsáveis pelo condomínio La Petite Afrique, projeto de Weinfeld em Montecarlo, terá duas torres com 36 apartamentos avarandados, de um a quatro quartos, em torno do jardim de onde tira seu nome.

O arquiteto diz achar peculiar trabalhar nos “dois ‘minhocões’ famosos ao mesmo tempo”. “Gosto do torresmo e da trufa branca com a mesma intensidade.”

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