Aos 14, Gerardo Bleier sentou em um bar, no centro de Montevidéu, para um dos eventos mais importantes da sua vida. Encontrou o pai, olhos azuis fortes, depois de mais de um ano separados.
O início da ditadura no Uruguai obrigou Eduardo, militante do Partido Comunista, a viver clandestino.
Correu o risco para encontrar o filho, depois de saber que ele fora preso por pichar “abaixo a ditadura”.
Naquele dia, Gerardo viu o pai chorar pela primeira vez. A última vez juntos.
Nascido em um povoado de Lavalleja, filho de imigrantes judeus húngaros, Eduardo aprendeu a amar a natureza. Seguiu um “gaúcho judeu”, mesmo vivendo na capital.
Era sensível e sereno, exceto em dois casos: quando via egoísmo ou ouvia violinos iguais aos de seus ancestrais europeus.
Virou comunista ainda estudante —não chegou a terminar o curso de odontologia para se dedicar ao partido.
Meses depois daquele último encontro, Eduardo foi sequestrado pelos militares. Era 29 de outubro de 1975.
Primeiro, foi levado a um centro conhecido como “inferno pequeno”, onde foi “destruído fisicamente”. Depois, para o “inferno grande”, no Batalhão 13, onde o mataram.
O regime ainda o registrou como foragido. Anos depois, disseram que ele fora cremado e as cinzas espalhadas no rio da Prata. Gerardo digeriu a notícia num livro chamado “Cenizas”.
No dia 7, uma ossada encontrada a um metro de profundidade, nos fundos do Batalhão, foi identificada como sendo de Eduardo. Morto entre os dias 1º e 5 de julho de 1976 pela tortura, aos 48.
Eduardo teria hoje oito netos e os quatro filhos —Irene, Carlos, Gerardo e Rosana. Rosa, mãe de três deles, morreu há dois anos, sem encontrá-lo.
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