Dois decretos sobre o feriado do Dia da Consciência Negra em Guarulhos, na Grande São Paulo, dividiram a opinião de moradores nos últimos dias.
O prefeito Gustavo Henric Costa, o Guti (PSB), assinou um decreto no dia 5 de novembro, que antecipava o feriado de 20 de novembro para a segunda-feira (18).
Dois dias depois, um novo ato foi publicado (Decreto 36.298), revogando o anterior e concedendo ponto facultativo municipal no dia 18 apenas nas repartições públicas municipais. Assim, o feriado para a iniciativa privada foi mantido para 20 de novembro.
De acordo com a prefeitura, a medida foi tomada para atender à reivindicação dos servidores municipais, que puderam prolongar o fim de semana que incluiu o feriado da Proclamação da República, na sexta-feira (15).
No entanto, por se tratar de uma data instituída por Lei Municipal, houve questionamentos sobre a legalidade da antecipação do feriado.
Moradores da cidade que estão trabalhando nesta segunda-feira (18) e dependem de serviços públicos, como por exemplo as creches municipais reclamaram da situação. Além disso, movimentos sociais da cidade da Grande São Paulo criticaram a medida da administração municipal.
“A decisão de alterar o feriado para o dia 18 de novembro desconfigura toda uma história, e ao tomá-la o prefeito desconhece as lutas da população negra e seus protagonistas”, afirma em nota de repúdio a Uneafro de Guarulhos. Outros 24 movimentos assinaram o ato.
“Reagimos com espanto”, afirmou em nota a Pastoral Afro-Brasileira de Guarulhos, da igreja católica. “[A] mudança desrespeita a ancestralidade do povo preto, pois, Zumbi dos Palmares é a representatividade da luta por liberdade. Alterar sua data, não tem lógica”.
Um dos símbolos da presença negra no passado da cidade é a marca da antiga localização da Igreja do Rosário dos Homens Pretos e São Benedito.
Essa não é a primeira vez que uma gestão adota a mudança. Em 2012, o então prefeito Sebastião Almeida (PT) antecipou o ponto facultativo para os servidores do dia 20 para o dia 16, emendando a parada com o feriado do dia 15 de novembro. No entanto, a medida foi antes da aprovação de uma lei municipal sobre o tema.
Criado em 2003 em âmbito nacional, o Dia da Consciência Negra é celebrado em cada cidade de acordo com as regras municipais. No caso de Guarulhos, a data foi definida como feriado pela lei 5.950, em 2013. Mas desde a aprovação, há polêmicas sobre o feriado.
O projeto foi elaborado pelo vereador Auriel Brito (PT), mas o então prefeito Sebastião Almeida (PT) vetou a lei.
À época, Almeida alegou que a proposta era inconstitucional devido ao número de feriados já existentes na cidade.
Ao ser apreciado pelos vereadores, o veto foi derrubado e a lei passou a valer. Desde então, setores do empresariado mobilizaram-se para derrubar na Justiça a instituição do novo feriado, sem sucesso. As idas e vindas causaram incertezas na população de Guarulhos.
“É um direito da nossa cor, da nossa raça, defender isso”, disse a pedicure Mônica Barbosa Pessoa, 41, próxima ao Hospital Municipal Pimentas-Bonsucesso (HMPB).
Por outro lado, o aposentado José Francisco, 66, entende que a emenda do feriado era mais importante. “Eu considero legal, tem muitas pessoas que não tem um fim de semana prolongado”, afirmou.
“Não é um feriado pra se comemorar, é algo pra se conscientizar na verdade”, diz a vendedora Evelyn Dearquino, 21, que atua numa loja de artigos de cultura e religião afro-brasileira.
O historiador de Guarulhos, Thiago Guerra, 39, é membro da AAPAH (Associação Amigos do Patrimônio e Arquivo Histórico) da cidade, e afirma que vê “alguns silêncios quando você fala sobre a história dos negros aqui”. Ele critica a mudança na data e diz que houve desrespeito por parte da administração municipal em mudar a data do feriado sem consultar a população ou levar em consideração os motivos do feriado.
Guerra comentou que o reconhecimento chegou de forma tardia na cidade sobre a presença da população negra. “A foto mais antiga de Guarulhos, de 1906, é uma foto que traz a presença de uma irmandade negra”, afirma
O historiador, contudo, diz que boa parte dos servidores foi a favor da mudança. de data. “Tem pessoas que acharam legal, porque de fato acham que o dia 20 é um dia irrelevante”.
A prefeitura afirma que não recebeu as cartas de repúdio e que terá eventos pelo novembro negro. Um deles é a Marcha da Consciência Negra, marcada para quarta-feira (20), às 8h, perto da escola Conselheiro Crispiniano.
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