Uma boina branca flutuava toda tarde de domingo pelas ruas da Vila Carolina, na zona norte de São Paulo.
Protegia a cabeça de Mário Ezequiel de Barros, que todos conheciam como Tio Mário. Ele caminhava até parar no bar onde uma roda de samba o aguardava.
Assim que viam Mário, os membros da roda faziam um breve silêncio. Era reverência. O silêncio só era quebrado pelo batucar das mãos na mesa de alumínio ou um acorde em ré maior do cavaquinho.
Mario sentava em sua cadeira e todos escutavam cada uma de suas frases como se fossem únicas. Diziam que quem ouvia o falar e cantar de Tio Mário escutava os ecos das antigas gerações.
“Ele é um griô [nome dado aos sábios africanos contadores de histórias]”, resume Tadeu Kaçula, músico e pesquisador que produziu o único disco de Tio Mario.
Baluarte do samba paulista, Tio Mario nasceu em 1927, numa Barra-Funda que rivalizava com o Bexiga sobre qual era o melhor reduto sambista paulistano.
Mario viajava sempre com a família para o interior nos dias santos. Numa dessas vezes, passou uma temporada com os tios em Tietê (SP). Fez sua imersão no samba rural. Visitou festas religiosas, aprendeu a tocar tambu e a matraca.
Já moço, Mario voltou para São Paulo trazendo na memória os batuques e versos populares das cantigas ouvidas.
Na paulicéia, participou dos cordões carnavalescos. Anos depois, esteve na fundação de uma das quatro mais tradicionais escolas de samba paulistas, a Camisa Verde e Branco, da sua Barra-Funda.
Kaçula diz que ele é a velha guarda da velha guarda paulista. Mario morreu no último dia 27, de insuficiência cardíaca, aos 91 anos.
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