Operação para desarticular fraude em merenda escolar prende 20 em SP

Ex-prefeitos, secretários de governo e empresários estão entre os alvos da PF

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Ribeirão Preto

Ao menos 20 pessoas foram presas nesta terça-feira (26) na segunda fase da operação Cadeia Alimentar, deflagrada pela PF (Polícia Federal) para desarticular irregularidades em licitações e desvios de verbas da merenda escolar em cerca de 50 municípios paulistas.

Três ex-prefeitos, uma vereadora em exercício do cargo, cinco ex-secretários de prefeituras, dois atuais secretários, um procurador, quatro funcionários públicos em atividade, quatro lobistas, três empresários, gabinetes de três prefeituras e uma Câmara estão entre os alvos da operação. 

Os criminosos agiam de várias formas, sempre com o objetivo de buscar favorecer agentes públicos, lobistas ou empresários, segundo Marcelo Ivo de Carvalho, delegado regional de combate ao crime organizado.

Entre as modalidades estão o direcionamento de licitações para que determinada empresa fosse a vencedora, o pagamento de propinas que variavam de 10% a 14% do valor do contrato e até mesmo o pagamento por prefeituras de alimentos que não foram entregues.

“Eles chamam o direcionamento de licitações de trava ou cadeado, e colocam itens específicos para direcionar para determinada empresa. Se outra empresa ganhasse, havia a possibilidade de desqualificar a vencedora na fase de amostra para beneficiar o empresário que participava do esquema”, disse o delegado da PF Bruno Rigote, que coordenou a operação.

Foram cumpridos mandados de prisão em 19 cidades nesta terça: Americana, Atibaia, Campinas, Cotia, Cubatão, Franca, Itapevi, Matão, Rio Claro, Santos, São Carlos, São Joaquim da Barra, São José do Rio Preto, São Paulo, São Roque, São Vicente, Sorocaba, Sumaré e Taquaritinga. Já mandados de busca e apreensão foram cumpridos em 27 localidades.

A propina variava com a participação ou não de lobistas no esquema. No caso de pagamento por serviço não prestado, 100% do valor do contrato era dividido meio a meio entre envolvidos na administração pública e na empresa fornecedora. 

Os esquemas funcionavam pelo menos desde 2013, conforme a PF. O total desviado ainda não é conhecido, mas há contratos que chegam a R$ 10 milhões.

Não é possível, segundo a polícia, dizer que os estudantes dos municípios envolvidos ficaram sem merenda escolar, mas, sim, que prefeituras pagaram por produtos de merenda que sequer foram oferecidos.  

“Podemos afirmar que o contrato foi superfaturado e que teria sido possível comprar muito mais com aquela mesma quantia de dinheiro. Com certeza os alunos comeram coisas de qualidade inferior ao que poderiam ter recebido”, afirmou Rigote.

A polícia detectou pagamentos em contas bancárias em nomes dos próprios funcionários públicos ou de familiares e advogados dos envolvidos e, também, em espécie, dentro das prefeituras.

Os nomes dos envolvidos não foram revelados pela polícia, mas um dos alvos de busca e apreensão foi o ex-prefeito de Franca Alexandre Ferreira, que governou a cidade entre 2013 e 2016. Ele teve um computador e um celular apreendidos. Em redes sociais, o ex-prefeito afirmou que tomou conhecimento dos fatos nesta terça de manhã e que está “à disposição das autoridades competentes para prestar os esclarecimentos necessários à apuração dos fatos investigados”.

Ao todo, 240 policiais federais cumpriram 55 mandados de busca e apreensão e prenderam 20 pessoas temporariamente. Outras 7 pessoas tinham mandados de prisão expedidos, mas não foram encontradas pela PF —2 procuraram a polícia para dizer que se entregarão nesta quarta-feira (27). Bens de envolvidos foram bloqueados e a Justiça determinou também o bloqueio de valores em contas bancárias até R$ 2 bilhões.

​A primeira fase da operação, deflagrada em maio de 2018, teve como objetivo investigar conluio de empresários para fraudar licitações. Eles, conforme a investigação, se reuniam para fatiar licitações em cidades paulistas.

Dois dos investigados —José Geraldo Zana e Jorge Luiz Rodrigues— fizeram delação premiada à PF e ao MPF (Ministério Público Federal) em julho do ano passado, que resultaram na operação desta terça-feira.

“[O] teor confirma fatos anteriores e apresenta novos fatos ligados à fraude em licitações e eventuais pagamentos de propinas a servidores públicos e/ou pessoas por eles indicadas, em troca de favores e benefícios”, diz trecho da decisão do juiz Augusto Martinez Perez, da 4ª Vara da Justiça Federal de Ribeirão Preto.

Os investigados podem ser responsabilizados pelos crimes de organização criminosa, falsidade ideológica, fraude em licitação, corrupção ativa, corrupção passiva e prevaricação.

Dos 20 presos nesta terça, 5 informaram o desejo de fazer delação premiada e já confirmaram os crimes, segundo Rigote.

Além de Ribeirão Preto, para onde foram levados três presos em Franca (dois) e São Joaquim da Barra, os detidos foram encaminhados às delegacias da PF em São Paulo, Santos, Piracicaba, Sorocaba, Campinas e Araraquara.

RECORRENTE

Os casos investigados pela Cadeia Alimentar não são únicos em São Paulo, que já enfrentou outros tipos de problemas com a merenda escolar.

Em setembro, 96 pessoas foram indiciadas pela PF, entre prefeitos, empresários e servidores, investigados na operação Prato Feito, deflagrada para apurar desvios de recursos federais para a merenda, uniformes e materiais didáticos em ao menos 30 cidades paulistas. Foram devassados 65 contratos, cujos valores totais ultrapassavam R$ 1,6 bilhão.

Conforme a apuração, prefeitos eram procurados por lobistas em períodos eleitorais com propostas de financiamento em troca da terceirização da merenda. Após a terceirização, as empresas estipulavam valores dos lances e quem venceria cada licitação.

Antes, em 2016, outras 22 cidades foram investigadas na operação Alba Branca por supostos pagamentos de propina em contratos superfaturados de merenda com o governo do estado.

Neste ano, a gestão do governador João Doria (PSDB) firmou contrato de fornecimento de carne para merenda com frigoríficos que tiveram atividades suspensas pelo Ministério da Agricultura. Três funcionários foram demitidos após a Folha revelar o certame.

 

Veja a lista dos municípios paulistas no alvo da ação da PF

- Americana (3 mandados prisão e 3 busca/apreensão);

- Atibaia (1 mandado de prisão e 1 busca/apreensão);

- Campinas (1 mandado de prisão e 1 busca/apreensão);

- Cotia (1 mandado de prisão e 1 busca/apreensão);

- Cubatão (1 mandado de prisão e 4 busca/apreensão);

- Franca (2 mandados de prisão e 3 busca/apreensão);

- Garça (1 mandado de busca/apreensão);

- Guarujá (2 mandados de busca/apreensão);

- Itapevi (1 mandado de prisão e 1 busca/apreensão)

- Jandira (1 busca/apreensão);

- Matão (1 mandado de prisão e 2 busca/apreensão);

- Orlândia (1 mandado de busca/apreeensão);

- Osasco (1 mandado de busca/apreensão);

- Paulínia (4 mandados de busca/apreensão);

- Praia Grande (2 mandados de busca/apreensão);

- Rio Claro (1 mandado de prisão e 1 busca/apreensão);

- Santos (2 mandados de prisão e 2 busca/apreensão);

- São Carlos (1 mandado de prisão e 1 busca/apreensão);

- São Joaquim da Barra (1 mandado de prisão e 1 busca/apreensão);

- São José do Rio Preto (1 mandado de prisão e 1 busca/apreensão);

- São Paulo (3 mandados de prisão e 8 busca/apreensão);

- São Roque (2 mandados de prisão e 3 busca/apreensão);

- São Vicente (2 mandados de prisão e 5 busca/apreensão);

- Sorocaba (1 mandado de prisão e 2 busca/apreensão);

- Sumaré (1 mandado de prisão e 1 busca/apreensão);

- Taquaritinga (1 mandado de prisão e 3 busca/apreensão) e

- Votorantim (1 mandado de busca/apreensão)

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