Descrição de chapéu Saneamento no Brasil

Renovar contratos sem licitação por 30 anos compromete novo marco do saneamento, diz ANA

Diretora-presidente da agência, Christianne Dias, defende a abertura do mercado para a iniciativa privada

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Brasília

A brecha para que contratos sem licitação sejam renovados por até 30 anos fragiliza um dos pilares do projeto que facilita a entrada da iniciativa privada no setor de saneamento, avalia a diretora-presidente da ANA (Agência Nacional de Águas), Christianne Dias.

Pelo texto-base aprovado na última quarta-feira (11) na Câmara, a agência acumulará uma nova função: criar normas de universalização do serviço de água e esgoto.

O centro da discussão foram os chamados contratos de programa, que passam a operação do setor de saneamento de um município para outra entidade pública (companhias estaduais) sem disputa com empresas privadas.

Atualmente, são raros os casos de prefeituras que já abriram esse mercado para a iniciativa privada.

A equipe econômica do presidente Jair Bolsonaro avalia que, sem a participação de empresas privadas, não seria possível atingir a meta de universalização dos serviços de água e esgoto até 2033.

O governo queria impedir que novos contratos de programa fossem assinados após o novo marco legal de saneamento, que substituiu esse modelo por contratos de concessão, que exige concorrência com o setor privado.

A versão aprovada prevê que, até o fim de março de 2022, empresas estaduais que já atuaram na área de saneamento em um município possam assinar um novo contrato sem licitação com a prefeitura, que valeria por até 30 anos.

"Se renova, a gente não está trazendo a competição pelos próximos 30 anos. Então compromete a própria essência do modelo novo que está sendo proposto", afirmou Dias, em entrevista concedida à Folha antes da aprovação final do texto na Câmara, nesta terça (17). 

Pelo projeto, a ANA assumirá a função de coordenação e uniformização das regras de saneamento.

Como o município é independente nessa área, o governo federal quer dar alguns benefícios a quem aderir às normas, como melhores condições de acesso a financiamento público.

Para aprovar o novo marco de saneamento, o governo teve de ceder em relação ao fim gradual dos contratos de programa, mas manteve a previsão para que as empresas —públicas ou privadas— tenham metas para universalizar o serviço.

"As sanções devem estar previstas no próprio contrato. Então quem não cumpre a meta tem de sair do jogo. De que maneira e em qual prazo? Isso são regras que vão constar do contrato de cada um", explicou a diretora-presidente da ANA.

À ANA caberá desenhar a metodologia de tarifa, de indenização de ativos e elaborar regras de governança para as agências reguladoras locais. Serão criadas duas superintendências na autarquia para cuidar de saneamento.

A prestação de contas à ANA será feita em caráter declaratório. A partir disso, a agência fará um ranking para verificar quais municípios e regiões estão cumprindo as metas.

Ao uniformizar as regras, o governo busca atrair o investidor estrangeiro que quer saber o risco de injetar dinheiro no negócio. "E que tenha regras claras, que sejam transparentes, que ele conheça o risco dele, para poder entrar e ficar. Porque a pior coisa que existe no mundo da regulação é você mudar a regra do jogo no meio do jogo", disse.

Para evitar que municípios menos atrativos fiquem para trás, o modelo adotado foi o mesmo de aeroportos: licitação em blocos regionais, que une essas cidades com outras mais rentáveis.

"Então há um incentivo na lei para que esses municípios se agrupem. A gente pode ter em um grupo um município que seja rentável, que já esteja mais estruturado, e um município, menos. Se eles fizerem parte de um mesmo grupo, vai ser bom para todos", avaliou.

Ainda assim, Dias não descarta que municípios mais pobres continuem a precisar de subsídio do governo. "Ainda vai ter um pouco, porque tem município pequeno que não dá conta. Município pequeno que não quiser se agrupar pode ser que tenha um aporte."

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