Descrição de chapéu Tragédia em Brumadinho

Um ano após tragédia, bombeiros ainda peneiram lama em Brumadinho

Militares examinam terra já seca em busca de 11 vítimas não achadas; trabalhos não pararam nenhum dia, nem no Natal

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Brumadinho (MG)

Diferentes aspectos podem servir para atestar a efetividade do Corpo de Bombeiros de Minas Gerais em quase um ano de buscas pelas vítimas do rompimento da barragem B1, da Vale, em Brumadinho (MG).

Uma delas é marca de que 259 entre 270 mortos foram localizados; outra é que 96% dos 7 milhões de m² de área foram examinados a uma profundidade de até 3 metros. Ou ainda o fato de que os militares não pararam um dia sequer de trabalhar, nem no Natal, desde 25 de janeiro de 2019.

O comandante-geral Edgard Estevo, contudo, destaca um outro ângulo que para ele demonstra a maturidade e a confiabilidade da corporação, além de respeito às famílias. “Ninguém, durante todo esse tempo, vazou foto de nenhum dos 854 corpos ou fragmentos encontrados”, diz à Folha

Bombeiro passa diante de varal com cartas de apoio enviadas aos bombeiros na base de apoio na área atingida pelo rompimento da barragem, em Brumadinho (MG) 
Cartas de apoio enviadas aos bombeiros na base de apoio na área atingida pelo rompimento da barragem, em Brumadinho (MG)  - Alexandre Rezende/Folhapress

Estevo não gosta de falar do assunto, mas ele também é um dos familiares: perdeu um primo na tragédia. Até dois meses atrás, o comandante, que assumiu o posto em 1º de janeiro de 2019, não havia revelado à corporação sua ligação pessoal com o desastre. 

Por consenso com as famílias, os militares passaram a se referir às vítimas como joias —faltam 11 delas.

O relacionamento dos bombeiros com os parentes é intenso. Há reuniões semanais para prestação de contas e há o apoio vindo de cartinhas escritas por crianças, que ficam na base de operações. 

A expectativa dos militares é encerrar as buscas somente após o resgate de todas as vítimas, ou até que o material recolhido não seja mais passível de identificação por DNA —o que acontecer primeiro. 

Os militares também cogitam encerrar a operação se, por um longo período, os fragmentos recolhidos diariamente corresponderem a identificações já realizadas.

Os bombeiros, ao localizarem vítimas, são os responsáveis por marcar o local exato, fotografar o material, descrever sua aparência, ensacá-lo, etiquetá-lo e transportá-lo. 

O desafio é justamente achá-las. É cada dia mais difícil, não só pelo passar do tempo, que leva à decomposição, mas pelo período chuvoso, que começou em dezembro. A lama molhada praticamente anula o trabalho dos cães farejadores, tidos como um dos principais instrumentos para a localização das vítimas. 

Nessa época de chuvas, o efetivo, que é de 150 militares em média, foi reduzido para 90. A quantidade de fragmentos achados, que chega a quatro ou cinco por dia, caiu para um.

Como mostrou reportagem da Folha, parte do material está em estágio avançado de decomposição e não consegue ter o DNA extraído. De 854 amostras levadas ao IML, 81 tiveram resultado inconclusivo e 44 estão em tentativa coleta do material genético. 

Além dos 68 cães, os bombeiros usam outros métodos, que variaram conforme a fase de buscas. A atual é a quinta, em que o objetivo é terminar de varrer a área do rejeito a até 3 metros de profundidade, porque 93% de tudo que foi encontrado estava nessa zona.

Para isso, escavadeiras reviram o rejeito e o colocam em caminhões. Os bombeiros observam a terra enquanto ela cai na caçamba buscando fragmentos. A terra é levada a tendas montadas em meio à área atingida, que cobrem 15 mil m². Ali, é peneirada novamente.

O processo de revisar a terra por três ou quatro vezes é chamado de fazer a dobra. Os bombeiros estão utilizando a própria estrutura da mina para peneirar a lama seca. A Instalação de Tratamento de Minérios (ITM), onde é feito o beneficiamento do minério, possui uma grade industrial, onde o material é peneirado. 

A terra já analisada tem que ser disposta pelo Corpo de Bombeiros em qualquer local dentro da área de rejeitos —para depositar fora dela, é preciso licenciamento ambiental. Por isso, o vaivém de caminhões é intenso e perturba o sossego das 
comunidades vizinhas.

Na primeira fase da operação, nas primeiras 72 horas, o método para localizar corpos era bem diferente. A lama estava úmida, os bombeiros rastejavam e tateavam em busca de vítimas. O transporte do que era encontrado só era possível por helicópteros. 

Nesse período, os militares resgataram 195 pessoas às margens da área atingidas, algumas ilhadas pela lama. Menos de dez foram retiradas do terreno enlameado com vida. 

Em quase um ano de operação, não houve acidente de trabalho com os bombeiros. Esse é outro motivo de satisfação para o coronel Estevo. “Não tivemos acidentes nem quando, nos primeiros dias, 36 helicópteros voavam num mesmo raio de 20 km”, diz.

Embora os bombeiros sejam considerados heróis de Brumadinho, o comandante afirma que o resultado deve-se principalmente à integração com a Polícia Militar, Polícia Civil e Defesa Civil —que ele espera que se repita.

Nos dias seguintes ao rompimento, os representantes de cada instituição apareciam juntos nas entrevistas e respondiam por suas funções. A união era tanta que, na primeira semana, em uma das vezes em que a reportagem da Folha ligou para o chefe de comunicação da PM, quem atendeu o telefone do colega foi o comandante da Defesa Civil.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.