Descrição de chapéu Alalaô

Tribos indígenas fazem parte da história do Carnaval de Porto Alegre

A última das 17 tribos que a capital gaúcha já teve desfilará no Carnaval da cidade neste ano

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Porto Alegre

Cocar, pintura no rosto, penas e taba. Referências a diferentes culturas indígenas estão presentes no carnaval de Porto Alegre desde a década de 1940 com as chamadas tribos.

A capital gaúcha teve 17 tribos sob nomes como charruas, tupinambás, xavantes e até os norte-americanos navajos e comanches.

Somente a última está em atividade e vai desfilar neste ano. Outra tribo remanescente, a guaianazes, não vai se apresentar. Ambas foram fundadas em 1959. A primeira, caetés, foi criada em 1945 no Dia do Índio.

“As tribos surgiram na periferia e chegaram a ser maioria na cidade, em número superior ao das escolas”, diz Jackson Raymundo, doutor em Letras pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e autor do trabalho “Peculiares e resistentes: Relatos orais e canções das tribos carnavalescas de Porto Alegre”.

Carnaval de tribos da década de 1970, em Porto Alegre. Grupos com nomes indígenas foram criados em 1945 e chegaram a ser maioria na cidade; em 2020 apena uma tribo desfilará
Carnaval de tribos da década de 1970, em Porto Alegre. Grupos com nomes indígenas foram criados em 1945 e chegaram a ser maioria na cidade; em 2020 apena uma tribo desfilará - Museu de Porto Alegre Joaquim Felizardo

Com as festas nos salões dos clubes tradicionais, as tribos surgiram como uma alternativa popular.

“As tribos carnavalescas nascem em um contexto de afirmação de nacionalidade brasileira. Nessa nacionalidade, todo mundo se via. O indígena não era visto como um ser exótico mas como parte de um todo. Esse todo era ser brasileiro”, explica o pesquisador.

Uma das tribos se chamava iracemas, possivelmente referência ao romance “Iracema” (1865), de José de Alencar. Havia tapuias, guaranis, aimorés e tapajós, entre outros.

Com a popularidade das tribos, elas passaram a ser julgadas em separado, de acordo com o livro “Carnavais de Porto Alegre” (1992), publicado pela Secretaria Municipal de Cultura (SMC).

Uma das principais distinções entre uma tribo e uma escola de samba é a encenação. “As tribos param o desfile e fazem uma encenação. É um momento que lembra um ritual indígena, mas não é apenas uma celebração festiva. Também é critério de avaliação”, diz Raymundo.

Outra diferença entre a tribo e a escola é que não há um samba-enredo, mas um hino, gênero diferente de composição.

“O hino tem características poéticas e melódicas que se distinguem do samba. A semelhança importante é desenvolver uma narrativa. Percebi que há um traço de melancolia na letra e na melodia”, diz o pesquisador.

Enquanto escolas têm quadras para ensaios, as tribos têm tabas, expressão tupi para aldeia. O figurino também é inspirado nos indígenas; não necessariamente naqueles que batizam as tribos mas relacionado ao hino.

“Se tu fazes um hino baseado em uma nação asteca ou zapoteca, por exemplo, a indumentária vai ter ouro, vai remeter à época. Quando é sobre tribo brasileira, leva muita pintura no corpo”, diz Ceslavo Bartochak, 52, integrante da tribo guaianazes, que deve voltar a desfilar em 2021.

“Participo desde guri, meu avô foi fundador, passou para o meu. Sou um dos mais antigos”, conta Bartochak.

“Na época em que fundamos a tribo comanches foi numa praça usada pela gurizada. Existiam mais tribos do que escolas e inventamos de fazer uma tribo. Com o tempo fomos escolhendo o nome e foi progredindo a coisa”, conta Valdir de Souza Ribeiro, 79, conhecido como Dirio.

As tribos carnavalescas são uma peculiaridade do carnaval porto-alegrense. Na sua pesquisa, Raymundo encontrou também tribos no Recife e em São Luís, mas não com as mesmas características.

Se recentemente se debate se a fantasia de índio é apropriação cultural, o pesquisador explica que essa não era uma questão nos anos 1940.

“O índio representava a nacionalidade. Teve momentos em que os povos indígenas desfilaram com as tribos carnavalescas. A pesquisa não mostrou conflito entre indígenas e não indígenas. É uma discussão mais recente.”

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