Baixada Santista tem histórico de chuvas fortes e deslizamentos

Há 92 anos, deslizamento de morro em Santos atingiu hospital e matou mais de 81

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São Paulo

O deslizamento de um morro no começo de março na Baixada Santista deixou dezenas de mortos.

O caso aconteceu há 92 anos, em Santos (SP). Em 10 de março de 1928, após uma chuva intensa o Monte Serrat desbarrancou e cerca de 2 milhões de metros cúbicos de terra caíram sobre a Santa Casa de Misericórdia de Santos, hospital fundado em 1543. A tragédia deixou pelo menos 81 mortos, segundo os dados oficiais.

A chuva e os deslizamentos que atingiram a Baixada Santista na madrugada de terça (3) são recorrentes na região, que, mesmo assim, permitiu invasões ao longo do tempo em áreas de risco.

“É uma das regiões mais chuvosas do Brasil, com mais intensidade entre a primavera e o verão, de setembro a março. Não é uma chuva única. Dados desde os anos 1950 mostram que em março se concentram os maiores volumes”, diz Mirian Gutjahr, pesquisadora aposentada do Instituto Geológico de São Paulo.

Em 2010, a geógrafa publicou um artigo intitulado “Estudos históricos de eventos climáticos extremos na Baixada Santista”, que, além de apontar a periodicidade frequente das chuvas fortes na região, mostra que os morros da Baixada têm caráter recente e muita matéria orgânica, tornando as coberturas instáveis e propensas a deslizamentos.

O fator de risco não é a chuva em si, mas a existência de moradia nesses locais.

“Essa é uma região muito frágil e suscetível a escorregamento. Quando não havia ninguém morando ali, esses escorregamentos ocorriam, e era um fenômeno natural. Quando tem gente morando lá, é um desastre”, diz Gutjahr.

Como essas áreas são ocupadas —quase sempre em situação de extrema precariedade—, muros de contenção como os que são feitos em encostas de morros à beira de estradas para impedir o bloqueio das rodovias nesses deslizamentos não podem ser feitos.

O Censo de 2010 do IBGE dizia que, em Guarujá, 33% da população vivia em aglomerados subnormais (favelas em geral, não necessariamente todas em áreas de risco). Em São Vicente essa taxa era de 26%. Em Santos, 9%. Essas são as três cidades em que houve mortos na chuva mais recente.

A Prefeitura de Santos diz que o Governo de SP entregou 120 habitações no Morro da Nova Cintra, onde constrói mais 198 unidades, no “primeiro empreendimento voltado totalmente para a remoção das famílias que vivem em área de risco nos morros santistas.” 

A Prefeitura de São Vicente diz que na atual administração entregou 1.884 habitações e que desenvolve projetos com o estado para atender às famílias que residem em palafitas.

A Prefeitura de Guarujá diz que tem parceria com o Banco Interamericano de Desenvolvimento para remover famílias de áreas de risco de morros, em projeto em vias de aprovação.

A Secretaria de Estado de Habitação de SP diz que estuda um projeto para atender 20 mil famílias que vivem em áreas de risco na Baixada.

O estudo de Gutjahr lembra outros eventos extremos ao longo do último século, como os 60 deslizamentos simultâneos em morros de Santos após chuvas intensas de 1953.

Mas não é só na Baixada. Um dos maiores desastres naturais do país ocorreu em 1967, em Caraguatatuba, no litoral norte. Na ocasião, a cidade foi devastada em deslizamentos que deixaram 436 mortos. Meses antes, chuvas deixaram 785 mortos na Serra das Araras, no Rio. 

O trabalho feito por Gutjahr é usado como base para elaborar o Plano Preventivo de Defesa Civil, documento feito em todos os verões que guia as ações nos períodos de maior precipitação.

O plano prevê, no caso mais extremo, um acumulado de chuvas por mais de 80 milímetros em 72 horas com escorregamentos generalizados. Neste caso, a Defesa Civil deve remover toda a população que habita as áreas de risco.

Só em Santos, até as 15h de terça, o acumulado neste período de 72 horas foi de 351 mm, quase cinco vezes o cenário projetado pela Defesa Civil. 

A prefeitura local argumenta que a chuva foi maior do que a média esperada para todo o mês de março, que era de 293,8 milímetros, calculada com base nas precipitações dos últimos 25 anos. 

Mas os episódios recentes de estragos em larga escala —de grandes capitais como São Paulo, Belo Horizonte e Rio de Janeiro, a cidades pequenas como Iconha (ES)— mostram que os casos extremos têm ficado cada vez mais frequentes. E a previsão é de que a chuva na região continue nesta quarta.

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