As doações para minimizar os impactos do coronavírus no país chegaram a R$ 500 milhões em dez dias, segundo cálculos da Associação Brasileira de Captadores de Recursos (ABCR).
"Não sabemos o quanto essa crise vai durar, é importante manter a solidariedade acesa", diz João Paulo Vergueiro, presidente da entidade.
A Fundação Itaú Social e Instituto Unibanco lideram a lista com R$ 150 milhões empenhados para ações diversas, seguido do Instituto Votorantim com uma doação de R$ 50 milhões.
O restante é o somatório de uma série de iniciativas, como a União BR, presente em vários estados, e fundos criados a partir da mobilização do terceiro setor e lideranças da sociedade civil para fazer frente à pandemia.
"Estamos vivendo um momento histórico, sem precedentes na filantropia brasileira", afirma Patricia Lobaccaro , ex-presidente da Brazil Foundation. De Nova York, onde mora e promove ações de arrecadação de fundos para projetos sociais no Brasil, ela tem se engajando em várias frentes de mobilização frente a pandemia no país.
“Em um cultura de doação que sempre foi difícil no país, nunca vimos algo com tamanha potência, velocidade e nível de articulação", avalia Patrícia. Segundo ela, a pandemia já mobilizou mundo afora US$ 1 bilhão em doações. Tímido inicialmente, o cenário brasileiro mudou nas últimas semanas.
Entre os anúncios de doações mais expressivos nos últimos dias, estão R$ 150 milhões dos braços sociais da Itaú-Unibanco. O montante será gasto para ampliar infraestrutura hospitalar, compra de equipamentos, cestas de alimentação e kits de higiene a serem distribuídos para comunidades vulneráveis e ajudar no tratamento de infectados.
O Banco Safra também anunciou que está doando R$ 20 milhões para hospitais públicos e Santas Casas, que serão destinados à ampliação de leitos hospitalares e compra de equipamentos e insumos médicos. A doação será feita diretamente às entidades ou por meio de seus parceiros privados na área da saúde, desde que os projetos sejam voltados para a rede hospitalar pública.
A rede Comunitas, organização da sociedade civil que promove parcerias entre os setores público e privado, mobilizou R$ 35 milhões para compra de respiradores para os hospitais públicos em São Paulo.
“Tivemos desde doações grandes de pessoas jurídicas, como R$ 6 milhões da EDP, até de uma família que fez vaquinha para a compra de um respirador”, exemplifica Regina Esteves, presidente da Comunitas.
Ela chama atenção para o fato de bancos e empresas terem anunciado grandes valores à disposição, mas parte ainda não concretizado. “Estão desenhando a melhor modelagem de doação para ter eficiência e escala.”
Procurada pelo governador de São Paulo, João Dória (SP), a presidente da Comunitas vai coordenar um comitê de mobilização da iniciativa privada. “A ideia é identificar oportunidades na política pública”, explica. Um exemplo é modelar com o governo e a Prefeitura de SP uma política de transferência de renda com apoio privado.
“Dessa forma vamos conseguir identificar no cadastro dos programas de governo as famílias mais vulneráveis do Estado e do município.” É o caso das 117 mil alunos da rede pública que se encontram em situação de extrema pobreza e não recebem bolsa família. “Vamos conseguir priorizar quem mais precisa, com critérios técnicos, transparência e controle social”, afirma.
A estratégia de atuação do Instituto Votorantim é olhar para os 104 municípios onde a empresa atua, tendo em vista a tendência à interiorização da pandemia. A cidade de Araripina (PI) tem 80 mil habitantes e nenhum leito de UTI.
“A Votorantim buscou uma visão nacional, presente em seu DNA, e olhou para o interior do país, onde há cidades desassistidas, sem nenhuma estrutura de saúde”, afirma Cloves Carvalho, diretor do Instituto Votorantim. “A preocupação com a desigualdade social deve ser de todos e o vírus evidencia ainda mais esse problema.”
O movimento de doação vai além das pessoas jurídicas e da responsabilidade social corporativa.
As famílias Trajano e Garcia, controladoras do Magazine Luiza, disponibilizaram R$ 10 milhões para compra de respiradores, leitos, colchões e travesseiros para equipar hospitais públicos e filantrópicos de todo o país.
Dessa quantia, R$ 2 milhões de reais serão destinados para a compra de ventiladores pulmonares para o estado de São Paulo. Já foram doados monitores cardíacos para o Hospital Emílio Ribas, de São Paulo, centro de referência nacional em infectologia, e ventiladores pulmonares para unidade do SUS da Vila Guilherme, onde fica a sede do Magalu.
Com o objetivo de ajudar a organizar a captação e a distribuição dos recursos doados sugiu o movimento União BR em 18 de março. Trata-se de um trabalho voluntário de articulação para apoiar as comunidades mais vulneráveis aos efeitos da pandemia.
Formado pelos subgrupos como União SP, União Rio e União GO, a estratégia é encontrar maneiras de direcionar os recursos privados para apoiar as comunidades.
"Nosso objetivo é juntar as pontas, reunir pessoas que querem doar de maneira segura e eficaz", diz a advogada Marcella Monteiro de Barros, líder do União Rio. A atuação se dá em duas frentes: a primeira, com foco em captar produtos de higiene e cestas básicas, e a segunda, na captação de leitos para socorrer os doentes.
Já foram angariados 72 toneladas de alimentos, 20 mil litros de produtos de limpeza e higiene, que devem chegar a 12.800 famílias em 18 comunidades.
"Somos 500 pessoas envolvidas direta ou indiretamente no movimento. Temos um corpo técnico, ligado a instituições renomadas, que está nos auxiliando nas questões relacionadas às políticas públicas", diz Marcella. São eles: Instituto da Criança, Instituto Desiderata, IEPS, Ekloos e Instituto Phi.
Em outra frente, o grupo arrecadou cerca de R$ 10 milhões, de 700 doadores, para ativar 60 leitos do hospital Universitário Clementino Fraga, da UFRJ, mais conhecido como Hospital Fundão, no Rio.
A União SP, que arrecadou 3 milhões de cestas básicas em 24 horas, entre outros.
Mãe de duas crianças, Marcella trabalha em home office "16 horas por dia". "É muito bom ver a sociedade civil unida", diz. A mobilização também se dá por empreendedores sociais, como Eduardo Lyra, da Gerando Falcões, que já levantou R$ 5 milhões com a campanha "Corona no Paredão".
Ambev, Gerdau e Albert Einstein anunciaram construção de um hospital em M'Boi Mirim. Rubens Menin anunciou doação de R$ 10 milhões para compra de respiradores para hospitais públicos em Minas Gerais, entre outras várias doações.
Se é possível apontar um lado benéfico desta crise mundial, Patricia Lobacca diz que é o despertar coletivo para a ideia de que todos estão no mesmo barco.
Vergueiro, da ABCR, afirma que, mais do que surpreendente, o que saldo de doações tem sido positivo. "É uma rara oportunidade de união no Brasil."
Ele lista outras ações, entre elas a adesão do empresário Alexandre Costa, da Cacau Show, à corrente do bem, com a doação de R$ 1 milhão para o Governo de São Paulo, para ajudar na compra de respiradores.
Quem também vai apoiar o SUS são as Lojas Renner. O grupo vai destinar R$ 4,1 milhões para hospitais públicos em Santa Catarina, Rio Grande do Sul e São Paulo.
O movimento #Família Apoia Família, plataforma aberta que convoca famílias brasileiras a doarem e se cuidarem nesse momento, já superou R$ 3 milhões em captação. A meta é chegar a R$ 10 milhões para apoiar pelo menos 10 mil famílias necessidatas durante a pandemia por meio de 45 ONGs já cadastradas.
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