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Em isolamento, moradores de Pirituba projetam recados positivos a vizinhos

Em tempos de coronavírus, ideia de empresária ajuda a lembrar as pessoas com saudade e não tristeza, diz psicóloga

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Lara Deus
São Paulo | Agência Mural

Bastou um projetor e uma caixa de som portátil para que a empresária Simone Rodrigues, 44, trouxesse leveza para os dias de isolamento em um condomínio de Pirituba, zona norte de São Paulo. Desde meados de março, ela vem fazendo projeções no prédio da frente ao que mora, no condomínio Projeto Bandeirantes.

Inicialmente, as ações contavam com clipes musicais para romper a falta de contato entre os vizinhos. Desde semana passada, ela passou a recolher mensagens e fotos de moradores do condomínio e projetá-las para que todos vissem.

Ela coloca o projetor de frente para seu quarto, onde encontrou o “telão” ideal: uma coluna sem janelas do bloco ao lado. Colocou um clipe de música e a reação na torre vizinha foi imediata. Uma criança começou a pular. “Eu comecei a chorar de ver aquilo”, relata.

A ideia não funcionou de cara. Primeiro, ela tentou da janela da sala, mas percebeu que ficava em frente a uma coluna de varandas do outro prédio. Depois, no chão da rua, mas a vizinha do andar de baixo reclamou.

“Interfonei para toda ala do meu apartamento, que é do lado que fica o som, e expliquei que a música duraria três minutos e 28 segundos e que eu só estava querendo fazer o bem”, conta.

Ela ressalta que recebeu várias reações de pessoas que estão sentindo as dificuldades desse período, como de uma senhora que vive sozinha. “Sou diabética, tenho problema cardíaco. Minha filha está tendo que empurrar comida para mim na porta”, relatou a idosa a Simone.

“Chegou a hora de a gente tocar o coração duro das pessoas, porque elas estão insensíveis, e eu acho que é isso que ela [Simone] quis fazer”, defende a auxiliar de consultório Elizabeth Cristina Pires Vieira, 59.
Moradora de um prédio vizinho, ela mandou pelo grupo de WhatsApp fotos e mensagens que gostaria de ver na projeção.

"Mandei um recado para minha irmã, que é médica e está na batalha atendendo em vários hospitais", detalha. Ela também aproveitou para homenagear duas vizinhas com quem tem amizade. “Quando tudo passar, vamos comemorar”, dizia a mensagem.

Simone, que iniciou as projeções, divide com o marido as responsabilidades sobre uma empresa de peças automotivas. Por viver com bronquite asmática, se encaixa no grupo de risco da Covid-19, e está trabalhando em casa desde meados de março.

O início desse processo causou angústia, principalmente por ter uma neta recém-nascida. “Da mesma forma que não estou podendo ver minha neta, minha mãe, minha filha, eu comecei a pensar em tudo o que eu poderia fazer para ajudar. Tem gente que está sozinha”

As projeções podem ser positivas durante o período de distanciamento social, medida incentivada para evitar o colapso no sistema de saúde durante a pandemia de coronavírus.

“Ações como essa fazem com que a gente volte a lembrar das pessoas com saudade, e não com tristeza; e que a gente comece a transformar o pânico em esperança”, afirma a psicóloga Suellen Cardoso, moradora do Grajaú, na zona sul de São Paulo.

Além deste receio, há o medo de que a doença atinja pessoas próximas. A exposição constante a notícias também torna mais difícil elaborar tudo o que vivemos. “Mesmo que tenham outras pessoas em casa, esse isolamento nos traz muito para dentro. A gente se obriga a lidar com algumas questões que não costumamos encarar no dia a dia”.

Há ainda outros impactos. Pequenos empresários, trabalhadores formais e autônomos fazem parte da parcela da população que teme perder a renda diante da pandemia. “Essa pessoa se sente impotente em casa, pois vem o desespero de não saber como vai colocar a comida na mesa”, detalha a psicóloga.

Simone pretende continuar com as projeções semanalmente. Por enquanto, não consegue aumentar a frequência. Segundo ela, mesmo os vídeos tendo pouco mais de três minutos, o trabalho de reunir as fotos e sequenciá-las com as mensagens é grande.

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