Descrição de chapéu Obituário Luciene Maria de Souza Samôr (1941 - 2020)

Mortes: Viveu entre livros e trocou cartas com Caio Fernando Abreu

Lucienne Samôr revirou monstros e fantasmas ao lado de escritores promissores em Minas

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São Paulo

As risadinhas que Lucienne Samôr tinha por hábito soltar ao fim das frases nem sempre davam conta de disfarçar sua sinceridade ora incontrolável.

Com carreira promissora na cena literária mineira dos anos 1960, a escritora passou suas últimas décadas na cidade natal, Conselheiro Lafaiete (a 100 km de Belo Horizonte). Vivia entre estantes de livros, com os quais se entendia bem.

Não raro levava um deles debaixo do braço, quando saía para entregar alguma crônica ou resenha datilografada para veiculação nos jornais locais.

A escritora Lucienne Samôr, em foto de 2016. Ela morreu em 22 de junho de 2020, aos 79 anos, em Conselheiro Lafaiete (MG).
A escritora Lucienne Samôr, em 2016, em Conselheiro Lafaiete (MG) - Acervo pessoal

Seus "monstros e fantasmas", evocados por ela mesma em uma entrevista de 1970, apareciam em sua obra e nas conversas com os poucos amigos, aos quais revelava o gênio às vezes intempestivo, o vasto saber expresso sem afetação e o genuíno interesse na escuta.

Incógnita no interior, a contista Lucienne (o "n" dobrado era do nome artístico) estreou com impacto entre literatos da capital. Despertou comparações com Clarice Lispector e Susan Sontag.

Fez parte da fase áurea do Suplemento Literário de Minas Gerais, a da geração que reuniu autores como Sérgio Sant'Anna e Humberto Werneck.

Publicou só um livro, "O Olho Insano" (1975), insuficiente para uma consagração. Companheiros associavam seu ocaso às sequelas do cárcere —Lucienne foi presa na ditadura militar, uma passagem nebulosa e pouco revisitada por ela, que se dizia vítima de um erro judiciário.

Com Caio Fernando Abreu (1948-1996) teve rica troca de correspondências, algumas incluídas em coletâneas sobre o escritor. Em uma delas, ele disse à amiga que lhe deixava as cartas como herança.

Semanas atrás, Lucienne se despediu das 2.000 obras de suas estantes. Aconselhada pela família, decidiu que era melhor ir para uma casa de repouso. Os cabelos brancos, curtos desde muito antes, já não eram mais as únicas marcas da velhice.

Complicações do diabetes e da hipertensão preencheram as páginas de seu último capítulo. O olho insano se fechou para sempre na segunda-feira (22).

coluna.obituario@grupofolha.com.br

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