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Escolha para o MEC é derrota da ala militar para a política tradicional

Bolsonaro faz test-drive de denúncias ao pedir que Feder se apresente só na segunda

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São Paulo

A escolha de Renato Feder para assumir o Ministério da Educação é a maior derrota da ala militar do governo desde que os fardados fizeram um consórcio com a chamada velha política para administrar a crise que engolfou o presidente Jair Bolsonaro (sem partido).

O secretário de Educação do Paraná, Renato Feder, indicado para o MEC
O secretário de Educação do Paraná, Renato Feder, indicado para o MEC - Jaelson Lucas - 18.fev.2020/AEN

O secretário paranaense foi convidado pelo presidente na noite de quinta (2), por telefone. Bolsonaro pediu para que ele estivesse em Brasília na segunda-feira, e Feder viajou a São Paulo, onde passará o fim de semana na casa que tem no litoral norte.

O movimento pode ser lido como um test-drive, deixando o secretário à mercê de escrutínio de mídia nesses três dias.

Escaldado com o episódio do currículo embelezado de Carlos Decotelli, que derrubou o professor do MEC em poucos dias, o governo quis dar um tempo entre o vazamento do convite e a fotografia de Feder com o presidente.

Se confirmado no posto, Feder terá sido um gol do PSD, partido que com siglas do centrão vem ocupando mais espaço no governo Bolsonaro.

A agremiação liderada por Gilberto Kassab já tem o recriado Ministério das Comunicações, onde foi instalado o deputado Fábio Faria (RN). Foi o ministro, por sinal, quem trouxe o nome de Feder para o governo quando Abraham Weintraub foi demitido.

No melhor estilo PSD, Feder acenou à ala ideológica da gestão, liderada pelos filhos de Bolsonaro, ainda que não haja evidências de que ele seja um radical bolsonarista tutelado pelas ideias de Olavo de Carvalho.

Apesar disso, foram os filhos do presidente que levantaram o principal óbice à indicação de Feder: o fato de ter sido um dos maiores doadores da campanha a prefeito de João Doria (PSDB-SP), o hoje governador paulista que é o principal rival político de Bolsonaro.

Naquele primeiro momento, a ala militar também vetou seu nome. Queria ficar com os louros de ter indicado os dois principais ministros da área social do governo, uma vez que já tinha à frente da Saúde o general Eduardo Pazuello —ainda que interinamente.

O nome de Decotelli foi defendido pela Marinha, na figura do almirante palaciano Flávio Rocha (Secretaria de Assuntos Estratégicos). O professor da Fundação Getúlio Vargas serviu na Força e tinha ligação com o alto oficialato.

Deu no que deu. As revelações sobre a criatividade de Decotelli em seu currículo o derrubaram, levando junto parte da credibilidade de algo que os militares sempre se orgulham, o suposto rigor técnico e a meritocracia em nomeações.

Agora, os fardados defendiam o nome de Anderson Correia, diretor do Instituto Tecnológico da Aeronáutica. Ele chegou a ser sondado, mas não foi nem chamado para conversar pessoalmente com Bolsonaro, o dito "namoro" que é pré-requisito para nomeações de ministros.

No passado recente, isso se transformaria numa vitória dos ideológicos, mas os tempos mudaram. O agravamento da crise política e econômica inserida na pandemia da Covid-19 levou Bolsonaro a apelar ao antigo Grande Satã de seu discurso, a tal velha política.

Assim, nomes do centrão ocuparam diretorias importantes do MEC e outros cargos no governo. Os militares, que torciam o nariz para esses partidos, aceitaram o jogo e fizeram a sua ocupação de espaço —de resto, uma marca do governo.

Além da presença forte dentro do Planalto, onde há cinco oficiais-generais, três deles ministros, foi feita uma militarização da Saúde. Pazuello indicou 25 nomes para postos-chave da pasta.

A prisão do ex-faz-tudo do clã Bolsonaro Fabrício Queiroz, ocorrida em Atibaia no dia 18 passado, consolidou o encolhimento dos ideológicos.

Se antes o presidente aceitara o centrão e o PSD para garantir uma base a protegê-lo de eventuais pedidos de impeachment na Câmara, com a prisão ele se retraiu de vez. Há uma expectativa generalizada no Congresso e no Judiciário de que o caso ainda trará grandes danos de imagem ao poder presidencial.

Como poder não aceita vácuo, os parceiros no que inicialmente era uma operação de salvamento do governo crescentemente se comportam como rivais sob um presidente enfraquecido. E se Bolsonaro deixar o governo em algum momento, todos buscam estar posicionados para uma transição.

Faria já está se estranhando com o general Luiz Eduardo Ramos (Secretaria de Governo), já que vem assumindo funções de articulação congressual que em tese estão sob o guarda-chuva do militar. Como a Folha mostrou nesta quinta, isso tem causado mal-estar na ala fardada, que só tende a aumentar.

Antes, Bolsonaro já havia retirado de Ramos a área de comunicação de governo, transferida para Faria. Apesar de o general negar perda de prestígio, a sinalização na disputa se reforçou desde então.

Por fim, há o efeito disso tudo no crescente afastamento da cúpula do serviço ativo das Forças da ala fardada no governo. Há grande incômodo pela identificação excessiva entre governo e militares, que chegou a paroxismo com as sugestões de Bolsonaro de uso golpista das Forças em sua defesa.

Ramos já teve de anunciar a ida à reserva devido às críticas internas pelo fato de se manter ministro e oficial da ativa. Os alvos agora são Rocha, que ganhou a quarta estrela que indica o topo da carreira neste ano, e Pazuello, que é general de três estrelas.

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