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Fechado para visitação na pandemia, Parque do Iguaçu vira alvo de caçadores de animais

Tempo livre e desemprego fizeram crescer prisões e apreensões na área preservada do Paraná

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Curitiba

A pandemia do novo coronavírus zerou o número de turistas, mas ajudou a abrir os portões do Parque Nacional do Iguaçu para a ação de caçadores, ameaçando ainda mais a preservação de espécies em risco de extinção, como a onça-pintada, símbolo do local.

O maior tempo livre, o desemprego e a falta de outro tipo de lazer durante a quarentena são apontados pelas autoridades como causas para o aumento do fluxo de caçadores na área de preservação localizada no extremo Oeste do Paraná, na divisa com o Paraguai e a Argentina.

No período de pandemia, o número de prisões de pessoas e apreensões de utensílios utilizados para a caça foi maior do que o registrado na mesma época do ano passado.

Desde janeiro desse ano, nove pessoas foram presas em flagrante. No mesmo período de 2019, foram apenas duas. As equipes da Polícia Ambiental e do Instituto Chico Mendes (ICMBio), que administra o espaço, já destruíram 85 armadilhas e 11 acampamentos na mata. Os números são praticamente quatro vezes maiores que os registrados entre janeiro e julho do ano passado.

"Inicialmente, o número de presos pode parecer baixo, mas considerando a dificuldade em prender um deles em flagrante, há um aumento expressivo", observa o capitão Cesar Sebastião da Silva, comandante do Batalhão de Polícia Militar Ambiental que fica dentro do parque.

"As pessoas estavam em casa, afastadas do trabalho e a caça é habito cultural nas regiões rurais do interior. O sujeito com tempo livre vai caçar. Não tem a ver com a pandemia em si, mas com o afastamento do trabalho e de outras atividades sociais que ele costumava exercer", acrescenta Fabrício Blini, delegado da Polícia Federal.

O parque possui cerca de 185.000 hectares só do lado brasileiro e abriga o maior remanescente de Mata Atlântica do Sul do Brasil, além das Cataratas do Iguaçu. A área é alvo de exploradores vegetais, como de palmito. Mas, o principal ataque, é contra a fauna local. Atrás da carne de animais como pacas, veados e antas, os criminosos prejudicam também a conservação de outras espécies.

"Esses animais servem de alimento para a onça-pintada e, com a sua caça, diminui a oferta para o felino. Além disso, presos na armadilha, eles servem de atrativo para a onça, que muitas vezes acaba também abatida pelo caçador para servir de troféu ou ser vendida no mercado ilegal", explica a coordenadora de proteção do parque, Patricia Kidricki Iwamoto.

Ela conta que, nas fiscalizações realizadas em 2020, não foram encontrados indícios de abate de onças, mas ressalta que os caçadores têm diferentes modos de agir e algumas vezes não são pegos. Um moedor encontrado em um dos acampamentos sugere, por exemplo, que os criminosos produzem linguiça com a carne dos animais capturados, deixando poucos vestígios.

O impacto da pandemia é mais um capítulo na história do parque, que há décadas vem lutando pela preservação do meio ambiente local. O esforço rendeu resultados. O projeto Onças do Iguaçu já descobriu três novas onças-pintadas circulando pelo parque só em 2020. O último censo feito pelo projeto indicava 28 exemplares da espécie no local, número 27% maior que em 2016. Em 2009, eram apenas 11 onças.

"Mas o cobertor sempre é curto. Na área ambiental precisava ter um efetivo maior", aponta o diretor do parque, Ivan Baptiston. Ele comemora a parceria com a Polícia Ambiental, que mantém uma unidade na área.

Por conta da pandemia, no entanto, há apenas um agente do parque em campo. A fiscalização conta ainda com efetivo de dez policiais ambientais por dia. "Para cruzar a mata, de uma ponta à outra, são necessárias ao menos quatro horas só de deslocamento", destaca o capitão Silva.

A tecnologia, antiga aliada na preservação dos bichos, se tornou essencial também para identificar os caçadores. O parque possui diversas câmeras que serviam inicialmente para estudar o comportamento dos animais e já flagraram a ação de criminosos. Atualmente, a administração procura parcerias para investir em detectores sonoros para a floresta.

Responsável pela investigação de crimes ocorridos no parque, a PF também se vale de outras pistas, como impressões digitais nos acampamentos e fotografias de armadilhas digitais, já que dificilmente ocorrem prisões em flagrante. Blini aponta que a maioria dos caçadores é da região e, por conhecerem a área, conseguem fugir no meio da mata ao perceber a ação policial.

Iwamoto também não descarta a possibilidade de grupos de turismo de caça atuando na área. "Nunca achamos essas pessoas, mas há evidências, como fitas luminosas fixadas em árvores para indicar o caminho para que eles consigam deixar a mata", conta.

"Percebemos que, entre os presos em flagrante, além do caçador habitual, há muitas pessoas que estão se aventurando nessa área", acrescenta o capitão Silva.

Proibida no Brasil desde os anos 1960, a caça continua sendo uma das atividades que mais desequilibra o meio ambiente do país. Um estudo feito na porção leste de São Paulo, maior remanescente contínuo de Mata Atlântica, aponta que, onde há ação de caçadores, ocorre a extinção local de animais de grande porte, como queixada e anta, que ajudam na dispersão de sementes e renovação da floresta.

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