Sacerdote de umbanda de SP acusa perseguição religiosa após nome ser vinculado a pedofilia

Líder religioso descobre sites pornográficos atrelados a ele e a membros de sua instituição

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Lucas Veloso
Agência Mural

Morador de Diadema, na Grande São Paulo, Denisson D’Angiles, 44, é sacerdote de umbanda. Nos últimos anos, ele se tornou também uma das vítimas de ataques de intolerância religiosa, algo que tem crescido no Brasil. Nas últimas semanas, contudo, esses episódios foram parar no campo virtual.

No final de junho, o líder religioso descobriu sites de conteúdo pornográfico atrelados ao nome dele, da casa em que atua e de outros membros, como a própria esposa, Kelly D’Angiles.

Denisson, que também atua como administrador de empresas, cuida do Céu Estrela Guia, instituição situada na Praça da Árvore, zona sul de São Paulo. No local, são realizadas giras de umbanda, aulas de teologia, desenvolvimento mediúnico e cursos.

Páginas como Mec Vídeos e Gado Tube tem utilizado tags com o nome de sacerdotes da casa em vídeos de orgia e até pedofilia. Para o sacerdote, foi uma tentativa de associar a imagem da religião a atividades ilícitas.

“São mais de 19 mil vídeos atrelados ao meu nome por lá”, afirma.

“Os vídeos estão tagueados ao meu nome e aos da casa e até mesmo de outros sacerdotes, inclusive alguns que desencarnaram”, diz o sacerdote. “Isso já é um prejuízo. É um crime bárbaro, e nós aqui fazemos trabalhos de caridade, como entregar comida aos mais pobres.

O casal de umbandistas Denisson e Kelly D’Angiles teve o nome atrelado a vídeos pornográficos
O casal de umbandistas Denisson e Kelly D’Angiles teve o nome atrelado a vídeos pornográficos - Arquivo pessoal

Após saber dos vídeos, Denisson pediu ajuda para frequentadores do local. Descobriu que os sites nos quais os nomes aparecem estão hospedados fora do Brasil, um deles no Panamá.

A situação o preocupa tendo em vista a pandemia do novo coronavírus, quando o ambiente virtual se tornou o principal espaço para a realização de cultos religiosos. Desde a quarentena, eles têm realizados lives nas redes sociais.

“Em algum momento alguém vai buscar por nossos nomes, ou da casa, e vai encontrar esses conteúdos as palavras agregadas a nós. Estou constrangido porque isso é muito doloroso”, relata.

Apesar de ser o primeiro episódio no ambiente virtual, o sacerdote diz que não é a primeira vez que o local sofre crimes de intolerância religiosa. No começo do ano, invadiram o terreiro e os cabos da rede elétrica foram retirados, o que poderia fazer com que quem os tocasse levasse um choque.

Em julho do ano passado, os proprietários do galpão, onde fica a casa, entraram com um pedido de despejo, sob a alegação de que que a umbanda não é uma religião e por isso não seria beneficiada pela Lei do Inquilinato. Na ocasião, os proprietários perderam o recurso, e eles seguiram no imóvel.

Denisson fez alguns boletins de ocorrência sobre os ataques virtuais, mas diz ter ouvido dos delegados que os casos provavelmente não seriam solucionados. “Disseram que não tem recursos para alcançar quem está por trás dessas publicações, já que se trata de um crime internacional.”

A Decradi (Delegacia de Crimes Raciais e Delitos de Intolerância), vinculada à Secretaria da Segurança Pública do Estado de São Paulo também foi procurada pelos representantes da casa, mas não tinha conhecimento do caso.

O sacerdote tentou acionar o Google, empresa em que são feitas as principais buscas na internet. No entanto, não tiveram retorno.

O pai de santo Denisson D'Angiles (dir.) diz que não é o primeiro caso de intolerância religiosa que sofre
O pai de santo Denisson D'Angiles (dir.) diz que não é o primeiro caso de intolerância religiosa que sofre - Arquivo pessoal

De acordo com dados do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, as denúncias de intolerância religiosa aumentaram 56% no ano passado no Brasil.

Dos casos identificados, as religiões de matriz africana ocupam a primeira posição entre as mais atacadas. No ano passado, o estado de São Paulo contabilizou 3.969 mil casos, sendo que a maioria era contra as religiões de matriz africana.

Mestre em serviço social e políticas sociais e membro do Cress-SP (Conselho Regional de Serviço Social), Júlio Cezar de Andrade, 33, afirma que a intolerância contra as religiões é fruto do racismo. A Cress recebe denúncias relacionadas ao tema.

“Não dá para tratar de forma natural os crimes cometidos de racismo e intolerância religiosa. Os racistas se manifestam de várias formas, de forma institucional nas relações sociais.”

Andrade também é babalorixá e aponta que o ataque às religiões se mantém porque o sistema mantém o preconceito racial. Uma das estratégias do racismo é a desqualificação das pessoas.

“Quando vemos a perseguição dos adeptos e sacerdotes, como a depredação de terreiros, reproduzimos o racismo religioso”, observa. “Temos também uma justiça racista, então até os crimes de intolerância são tipificados como injúria racial, com isso, temos que garantir a laicidade do estado.”

Para ele, é fundamental criar redes de fortalecimento dos espaços de culto.

Procurada, a Google e a Secretaria Estadual de Segurança Pública não responderam à reportagem. Os sites citados não disponibilizam e-mail para contato.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.