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Donos de restaurantes reclamam de falta de discussão sobre projeto que ocupa ruas em SP

Gestão Covas afirma que ideia usa expedientes já existentes, que não demandam audiência pública

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São Paulo

No dia em que o funcionamento de bares e restaurantes na capital paulista foi liberado até as 22h pela primeira vez na quarentena, donos de estabelecimentos no centro de São Paulo que ganharam o direito de ocupar as ruas de frente a seus estabelecimentos com mesas reclamam que foram surpreendidos com o projeto pronto e que não houve explicações nem sequer contato por parte da prefeitura.

O prefeito Bruno Covas (PSDB) anunciou nesta quarta (5) uma parceria com empresários da região da República para permitir o atendimento em mesas na rua, em estruturas construídas onde seriam vagas de carros, numa espécie de parklet simplificado.

Os restaurantes e bares não poderão servir pessoas que estiverem de pé, e essas áreas deverão seguir as mesmas regras dos salões dos restaurantes, como a disposição de álcool em gel e limite de quatro pessoas por mesa.

Projeto da Prefeitura de SP de ocupação da rua para disposição de mesas de restaurantes
Projeto da Prefeitura de SP de ocupação da rua para disposição de mesas de restaurantes - Prefeitura de São Paulo/Divulgação

É uma maneira de contornar a limitação de que os salões só poderiam funcionar com até 40% da capacidade, o que inviabilizava a operação de parte deles. Trata-se de projeto piloto e, se der certo, pode ser estendido para o restante da cidade. O investimento é todo privado, segundo a prefeitura, e as empresas não podem fazer publicidade que desrespeite a lei Cidade Limpa.

O decreto que autoriza essa ocupação deve ser publicado nesta quinta-feira (6).

Embora aumente a quantidade de clientes que os restaurantes podem atender, donos de alguns estabelecimentos da região se posicionam contrários à forma como o projeto foi tocado. Eles se queixam que não foram contatados pela prefeitura nem viram o projeto nos canais oficiais, mas por pessoas que diziam tocar o projeto em parceria com a prefeitura.

A primeira vez que souberam do escopo da proposta foi num texto publicado nesta Folha pela colunista Alexandra Forbes, uma das idealizadoras do projeto, no qual ela narra como teve a ideia de ocupar o espaço das ruas e como a apresentou ao prefeito.

Forbes, junto de empresários e arquitetos, tem buscado patrocínio e doações e procurado os donos de estabelecimentos da região para informar do andamento da parceria.

"Eu busco dar boletins diários aos donos dos estabelecimentos todos, porque eu busco o máximo possível de transparência", afirmou ela à reportagem. "A prefeitura fez o mais importante, que é não atravancar e desobstruir e dar permissão, o resto a gente está fazendo", diz ela.

A ideia é entregar a obra pronta aos estabelecimentos. "São Paulo não tem verba para fazer como estão fazendo em Montreal, Paris e outras cidades, tirando alguns espaços do asfalto para dar aos pedestres e criando espaços para comer e beber ao ar livre, então é natural que busquemos apoio da iniciativa privada para fazê-lo, por nossa conta, com o aval da prefeitura", afirma.

Maria Medeiros, do Instituto Feira Livre, um sacolão de produtos orgânicos, diz que recebeu pronto o projeto arquitetônico de ocupação da rua em frente "e de cara a gente viu coisas que não funcionavam. Ocupava a frente inteira da loja, inclusive o espaço em que fazer o abastecimento de mercadorias", afirma.

"A gente apoia 100% o uso da rua, sempre tivemos esse plano. Mas foi apresentado um projeto pronto, sem levar em conta o que a gente pensa, e sem saber o que tem, se tem publicidade envolvida. Também achamos perigoso propor mais uma maneira de se aglomerar, quando temos recordes de mortes", afirma.

Rachelle Balbinot, sócia do restaurante Pratada, relata que soube do projeto na última semana quando recebeu uma mensagem dizendo que tinha sido contemplada para participar.

"Como fui contemplada se não estávamos participando de nada? Perguntaram se eu tinha interesse, mas eu nem sabia do que se tratava. Eu quero entender como vai funcionar, qual o vínculo com a marca patrocinadora. A gente não tem condições de dizer nem que sim nem que não para um projeto que não sabe como será."

Bianca Tavolari, professora de direito do Insper, diz que a ideia em si não é ruim. "Várias cidades europeias e americanas estão nesse caminho, pensando em combinar o espaço público com uma revitalização durante a pandemia". O problema, diz, é que "não houve consulta nem discussão. Como será a manutenção desses espaços? Como os patrocínios estão ocorrendo? Tem chamada pública? De quem é a responsabilidade se houver aglomerações? É do restaurante? O problema é que a gente não sabe nada."

O secretário Municipal de Desenvolvimento Urbano, Fernando Chucre, afirma que não há necessidade de audiência pública porque a ideia usa de expedientes regulamentados há anos: a permissão de uso de calçadas e a legislação dos parklets, que foi simplificada. "A gente não está inventando a roda e não tem doação de espaço público. A gente usa instrumentos existentes, com legislações existentes", afirma.

Chucre diz que a permissão vai beneficiar estabelecimentos que não tinham condições de arcar com a criação de um parklet, que pode custar mais de R$ 30 mil. No projeto criado, basta uma plataforma elevada, que pode ser um tablado simples de madeira, "mais provisória, rápida, e que atende às demandas imediatas dos estabelecimentos".

O secretário afirma que recebeu uma série de propostas de ocupação da rua, de diferentes setores e regiões da cidade, e resolveu usar a dos restaurantes do centro comoteste para uma possível expansão, pela diversidade de estabelecimentos que pode ser beneficiada, de restaurantes sofisticados a bares mais simples.

"A gente recebeu um grupo aqui [apresentando a proposta]. Como eu não vou colocar dinheiro público, falei para eles se articularem com os estabelecimentos da região", diz o secretário.

"Nesta semana eu estarei lá, conversando com alguns desses estabelecimentos que tinham dúvida da regulamentação", afirma Chucre. Ele diz que não há obrigação de aderir ao projeto. "É uma saída para ajudar a dar sustentabilidade ao setor."

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