Líder da maçonaria é acusado de assediar funcionárias

Sereníssimo grão-mestre João José Xavier nega e atribui acusações a disputa política

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Rio de Janeiro

Líder da Grande Loja Maçônica do Estado de São Paulo (Glesp), uma das maiores correntes da maçonaria na América Latina, João José Xavier foi acusado de assédio sexual por duas ex-funcionárias.

Relatos como "ele bateu na minha bunda, alisou minhas coxas" e "me chamava de gostosa, de linda" fazem parte do depoimento que elas prestaram à Justiça no dia 9 de setembro.

As mulheres, que tiveram seus nomes preservados a pedido delas, também conversaram com a Folha a respeito dos abusos que creditam ao Sereníssimo Grão-Mestre, título que Xavier detém entre maçons.

Elas entraram em três frentes judiciais simultâneas: ação por danos morais (na 43ª Vara Cível de São Paulo), trabalhista (nas 69ª e 36º Varas do Trabalho) e criminal —​o advogado da dupla apresentou, no dia 2 de outubro, uma notícia-crime ao Ministério Público paulista.

Xavier diz que repudia as acusações e as associa a um "pequeno grupo" que perdeu a disputa pela liderança da Glesp no ano passado e agora tenta, "de forma vil e vingativa, denegrir sua honra".

Uma das supostas vítimas trabalhava na parte administrativa e tem 40 anos. A outra é uma auxiliar de limpeza de 29 anos. Chamaremos a primeira de Claudia, e a segunda, de Renata.

As duas afirmam que o assédio piorou quando Xavier, que é casado, virou grão-mestre na instituição, em 2019.

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João José Xavier, grão-mestre na Grande Loja Maçônica do Estado de São Paulo - João Xavier/Glesp no Facebook

"Ele começou a me chamar com frequência no gabinete, e a mostrar vídeos de mulheres de bunda de fora", disse Claudia à Justiça. "E falava assim: 'Nossa, loirinha, olha só essa moça, que bunda bonita, deve ser igual à sua, só que infelizmente eu não vi a sua, você não quer nada comigo, né?'"

Xavier elogiava os seios da funcionária, afirma ela, e também teria pedido que fizesse faxina em seu gabinete, o que não seria sua atribuição, diz. Uma vez, teria ouvido dele: "E agora, loirinha, se eu te agarrasse, que você ia fazer?". Ela conta ter respondido que gritaria.

Claudia afirma à reportagem que sempre tentava se esquivar do chefe. "Sentia muita raiva, nojo. Chorava muito, me sentia humilhada."

Ainda segundo ela, Xavier perguntou se ela era casada com um PM e quis saber se andava armado. Ela respondeu, então, que ele era guarda municipal e que tinha duas armas, para intimidá-lo.

Os assédios não cessaram. Claudia diz que falou com um superior direto sobre os abusos, e ele só lhe aconselhou cautela. "[Xavier] não esconde de ninguém essa obsessão que ele tem por você."

Por ela e também por Renata, que teria recebido comentários como "você é muito boa de calça legging, imagina sem". "Eu não sabia nem o que responder. O meu medo era eles me mandarem embora se eu respondesse alguma coisa ou se fosse ignorante", diz à Folha a auxiliar de limpeza.

"Sempre ele abordava, beijava no rosto, falava que eu era gostosa", relata. Xavier também dizia, segundo Renata, que a imaginava sem roupa. "Sempre no meu ouvido falando bobagem, safadeza mesmo."

A faxineira afirma que tolerou o assédio por temer a demissão.

Ambas foram demitidas em 2020, no meio da pandemia. Quinze dias antes, Claudia diz que Xavier a chamou e falou que a equipe entraria em revezamento por causa da pandemia, e que os dois ficariam sozinhos em seu gabinete. "Entrei em pânico, só chorava." Depois de faltar ao trabalho, foi demitida por Xavier.

Três testemunhas contaram à Justiça ter presenciado o assédio. Uma delas, demitida no ano passado, afirmou ter visto cenas como Xavier vindo por trás de Claudia para dar "um beijo estalado". Um profissional da área tecnológica disse: "Ele começou a fazer coisas pelo visto sem mais se importar com qualquer questão de que alguém estivesse vendo".

Claudia pede uma indenização por danos morais de R$ 150 mil para ela e o marido, "na condição de vítimas conjuntas", mais o pagamento de tratamento psicológico, diz seu advogado, Cícero Barbosa dos Santos. Por direitos trabalhistas não honrados e assédio moral, propõe que a Glesp indenize a ex-funcionária, que lá trabalhava desde 2001, em R$ 239 mil.

Para Renata, a compensação proposta por passivos trabalhistas e assédio moral é de R$ 88 mil.

Na seara criminal, o grão-mestre é acusado de assédio sexual (um a dois anos de detenção) e importunação sexual (um a cinco anos de reclusão).

Em nota enviada à Folha, Xavier diz "repudiar, de forma veemente, a denúncia caluniosa de assédio sexual" e atribui as acusações a "um pequeno grupo que perdeu a eleição [para grão-mestre] e não aceita a vontade dos eleitores, tenta a todo custo assumir a administração de nossa instituição".

"Não tendo obtido êxito nas inúmeras tentativas, inclusive judiciais, agora, de forma vil e vingativa, denigrem minha honra, atingindo minha pessoa e família", afirma.

Também em nota, a Glesp promete apurar os fatos "de forma imparcial e justa" e responsabilizar eventuais culpados. Diz ainda ser "indiscutível que fatos gravíssimos estão sendo imputados a um membro de nossa instituição, os quais acabam por atingir a imagem e a honradez que possuímos perante a sociedade".

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