Descrição de chapéu STF

Ministros buscam saída para manter ordem de prisão de André do Rap sem dar superpoderes a Fux

Temor no Supremo é que se dê ao presidente da corte o poder de derrubar decisões de colegas

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Brasília

A maioria dos ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) entende que a corte deve manter, no julgamento desta quarta-feira (14), a prisão de André de Oliveira Macedo, 43, conhecido como André do Rap. Ele é um dos líderes do PCC (Primeiro Comando da Capital) e está foragido.

Integrantes do tribunal, no entanto, temem que uma decisão nesse sentido dê poderes inéditos ao presidente do Supremo, ministro Luiz Fux.

Caso referende o despacho de Fux de suspender o habeas corpus concedido pelo ministro Marco Aurélio Mello ao traficante, o plenário poderá criar um precedente que autorize o chefe do tribunal a revogar despachos de colegas.

O presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Luiz Fux, durante sessão virtual
O presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Luiz Fux, durante sessão virtual - 15.abr.20/Reprodução/YouTube

André do Rap deixou o presídio de Presidente Venceslau (SP) na manhã de sábado (10). Desde a decisão de Fux, na noite do mesmo dia, a polícia não sabe o paradeiro do traficante.

Como o presidente controla a pauta do Supremo, Fux passaria a ter competência para rever entendimento de outro ministro acumulado ao poder de decidir o momento de submeter o caso ao plenário, tornando-se uma espécie de superministro.

Uma saída para evitar esse cenário seria manter a decisão de Fux, mas deixar encaminhada uma mudança no regimento interno que torne a revisão de despachos individuais pelo plenário virtual automática e obrigatória.

Essa alternativa, porém, também enfrenta resistências porque reduziria os poderes dos próprios ministros, que não poderiam mais conceder liminares (decisões provisórias) sem prazo para levá-las à análise do conjunto da corte.

Para revogar a decisão de Marco Aurélio, Fux julgou procedente uma ação da PGR (Procuradoria-Geral da República). A Procuradoria entrou no STF com uma suspensão de liminar, tipo processual que vai direto para o gabinete da presidência.

Em tese, processos dessa natureza são usados para que o presidente de um tribunal, seja de segunda instância, seja do STJ (Superior Tribunal de Justiça), derrube uma decisão de um magistrado de instância inferior, não de um colega.

No Supremo, porém, a suspensão de liminar já foi adotada pelo ministro Dias Toffoli quando era presidente da corte.

No fim de 2018, ele lançou mão da estratégia para anular decisão de Marco Aurélio de mandar soltar todos os réus que estavam presos por terem sido condenados em segunda instância.

Fux também usou esse entendimento quando estava no exercício da presidência do STF em setembro de 2018. Ele revogou decisão do ministro Ricardo Lewandowksi que autorizava a Folha a entrevistar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que na época estava preso.

Nas duas situações, porém, o plenário da corte não julgou os casos e não discutiu se o presidente da corte teria poder para isso, como deve ocorrer nesta quarta-feira.

Além da discussão sobre os limites do poder do presidente, os ministros também devem defender qual é a melhor forma de se interpretar o parágrafo único do artigo 316 do Código de Processo Penal. Ele foi incluído na lei pelo pacote anticrime.

Uma corrente do tribunal simpatiza com a interpretação do ministro Edson Fachin.

Em maio, em uma situação similar à de André do Rap, ele negou a concessão de habeas corpus por falta de renovação da prisão preventiva, mas determinou ao juiz de primeiro grau que revisasse a necessidade da detenção. A lei prevê revisão a cada 90 dias.

Caso Marco Aurélio tivesse feito o mesmo, o processo teria retornado ao magistrado de primeira instância. Com isso, o traficante não teria sido liberado.

Nesta terça-feira (13), o presidente Jair Bolsonaro teve uma rápida audiência com o Fux, no STF. No encontro, segundo relato feito à Folha, Bolsonaro elogiou o presidente do STF por ter revogado habeas corpus concedido ao traficante.

O presidente teria dito ainda a Fux que Marco Aurélio perdeu a mão ao ter liberado o​ chefe do PCC. No fim da tarde desta terça-feira (13), Bolsonaro foi à rampa do Palácio do Planalto. Questionado pelos jornalistas sobre as decisões de Marco Aurélio e Fux, não respondeu.

Bolsonaro sancionou o pacote anticrime com 25 vetos. O ex-ministro Sergio Moro (Justiça) disse que sugeriu veto às mudanças no artigo 316. O dispositivo, porém, foi mantido.

A única interação do presidente foi um coração com as mãos quando perguntado sobre o encontro mais cedo com Fux. Um homem que passava em frente ao Planalto gritou "fora, seu lixo!". Bolsonaro acenou para os repórteres e se retirou logo depois.

Também nesta terça, o procurador-geral da República, Augusto Aras, se manifestou no habeas corpus que beneficiou André do Rap, por decisão do ministro Marco Aurélio.

Aras enviou ao STF um instrumento chamado agravo regimental. Nele, o procurador-geral defendeu a revogação da soltura do integrante do PCC.

O recurso de Aras cumpre uma formalidade —a Procuradoria foi intimada a se manifestar no HC—, mas não produz desdobramentos imediatos.

A decisão de Marco Aurélio foi derrubada por Luiz Fux a partir de um pedido à parte feito às pressas pela PGR no sábado. O habeas corpus havia sido enviado para a Procuradoria no dia 6.

No agravo, Aras afirmou que o "zelo judicial" com a revisão das prisões preventivas a cada 90 dias pressupõe que haja alteração do quadro processual favorável ao preso.

"Da manutenção das coisas como se encontravam quando da decretação [da prisão] decorre a presunção de legitimidade da custódia, não podendo do simples transcurso do prazo se deduzir a perda da validade da decisão judicial", afirmou o procurador-geral.

Nesta terça-feira (13), a 6ª Turma do STJ (Superior Tribunal de Justiça) manteve a condenação de André do Rap a 15 anos, seis meses e 20 dias de prisão por tráfico internacional de drogas. Os ministros do colegiado analisaram um recurso do integrante do PCC contra acórdão do TRF-3 (Tribunal Regional Federal da 3ª Região) que fixou a pena neste prazo.

Os advogados de André do Rap recorreram ao STJ após uma decisão do TRF-3 de negar a ele a revisão de sua condenação e de rejeitar a possibilidade do relaxamento de prisão. A defesa alegou que o tribunal regional decidiu baseado em “fundamentos genéricos”.

Sob a relatoria do ministro Rogerio Schietti, a turma do STJ, negou, por unanimidade, o recurso do criminoso. Não foi analisada a parte em que se discutia o relaxamento da prisão por causa da decisão do ministro Marco Aurélio de libertar o líder do PCC da cadeia.​​

Colaborou Daniel Carvalho

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