Carrefour de Porto Alegre reabre com poucos clientes, pichações e flores na porta

Beto Freitas, 40, foi espancado até a morte por seguranças da unidade na última quinta-feira (19)

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Porto Alegre

Com poucos clientes, pichacões na área externa e flores no chão, foi reaberta nesta segunda-feira (23) a unidade do Carrefour na zona norte de Porto Alegre onde João Alberto Freitas, 40, foi espancado e morto por seguranças na última quinta-feira (19).

Se havia poucos clientes pela manhã, o número de seguranças na loja, porém, era superior ao de dias normais.

Na parte externa do supermercado ainda era possível ver marcas dos protestos ocorridos durante o final de semana, como pichações no acesso ao estacionamento e flores colocadas ao pé das grades em homenagem à vítima.

flores depositadas em uma grade
Flores foram depositadas em grades na área externa do Carrefour em homenagem a João Alberto Freitas - Luciano Nagel/Folhapress

Funcionários de uma empresa terceirizada faziam a limpeza do local de manhã, repintando grades e apagando pichações, mas ainda era possível ver frases como ‘’o racismo é o vírus’’ e ‘’Carrefour bando de racista’’.

Em outra unidade do Carrefour, dessa vez na zona leste de Porto Alegre, dezenas de pessoas realizaram um protesto em frente ao mercado. A avenida Bento Goncalves e parte da avenida Ipiranga foram bloqueadas, e o trânsito de veículos ficou congestionado no local.

Uma hora depois do início do ato, por volta das 19h30, manifestantes jogaram fogos de artifícios e rojões em direção ao estacionamento do Carrefour, e policiais militares entraram em ação para conter os atos.

Durante o protesto, um grupo de jovens arrancou as grades de proteção de acesso do hipermercado e fez uma fogueira com pneus às margens da avenida.

Devido ao protesto, o Carrefour fechou as portas às 16h.

Histórico

João Alberto Silveira Freitas, 40, o Beto Freitas, foi espancado e morto na noite de quinta-feira (19) por dois seguranças em uma unidade do Carrefour em Porto Alegre. Homem negro, ele teve seu assassinato filmado na véspera do Dia da Consciência Negra, o que provocou indignação e protestos nos dias seguintes.

Imagens obtidas pela Folha revelam que Beto Freitas foi asfixiado por quase quatro minutos, diante de 15 testemunhas, após ser espancado por pelo menos dois minutos pelos seguranças. Laudo preliminar do Instituto-Geral de Perícias de Porto Alegre aponta asfixia como a causa mais provável da morte.

Os homens, que trabalham para o Grupo Vector, foram presos em flagrante por homicídio qualificado. O crime segue sob investigação.

A defesa do policial militar Giovane Gaspar negou a intenção de matá-lo ou motivação racista e levantou a hipótese de que a vítima possa ter morrido em decorrência de um ataque cardíaco.

Segundo declarações da viúva de Beto Freitas, Milena, o marido teria feito um aceno a uma funcionária do caixa, em tom de brincadeira, após concluírem as compras, e deixado o mercado acompanhado de seguranças. Ela terminou de pagar pelos produtos e, na saída, deparou-se com o espancamento.

Vídeos obtidos pela Folha com a Polícia Civil do Rio Grande do Sul mostram os momentos anteriores ao crime. Beto Freitas chega ao supermercado com Milena pouco antes das 22h, conforme o horário das câmeras. Dez minutos depois, o casal vai ao caixa para pagar as compras, onde ele parece conversar com a esposa e a atendente.

Logo em seguida, o cliente sai do caixa e se aproxima de uma outra funcionária de preto, que estava ao lado de um dos seguranças presos pela sua morte, Magno Borges Braz. Ela se esquiva e sai de perto, mas ele segue atrás dela e faz um gesto com a mão esquerda levantada. Não é possível entender o significado do gesto pela imagem.

Foi essa funcionária que relatou em depoimento no sábado (21) que Beto Freitas passou a encará-los enquanto estava no caixa. Ela disse que não entendeu o que Beto disse, por causa do barulho e da máscara, e que ele "não parecia estar fazendo uma brincadeira quando gesticulou em direção a ela e seu colega, mas parecia estar furioso com alguma coisa".

Nos minutos seguintes, ele volta para perto da mulher e espera ela passar as compras pelo caixa. Então chega uma terceira funcionária de branco, a fiscal Adriana Alves Dutra —que depois intimidou um homem que gravava o espancamento—, e conversa com o segurança Magno e com Beto Freitas.

O segurança Giovane Gaspar​ então aparece, coloca a mão nas costas do cliente e os três —a mulher de branco e os dois seguranças— o seguem até a saída do mercado. Uma outra câmera mostra Beto Freitas descendo a esteira rolante, com os funcionários atrás. Quando Milena aparece segundos depois com o carrinho, mais dois funcionários passam correndo por ela.

Possivelmente, essa foi a hora em que, em outra imagem, Beto Freitas dá um soco em um dos vigilantes ao chegar na porta. Ele depois foi espancado e asfixiado e morreu no local.

O Carrefour classificou a morte como “brutal” e anunciou que romperá contrato com a empresa de segurança, além de demitir os funcionários que estejam envolvidos.

A polícia tenta agora identificar, por meio das imagens, todas as pessoas que estavam presentes no momento do crime, além dos autores.

No domingo (22) houve novos protestos pela morte de Beto Freitas no Rio de Janeiro. A manifestação ocorreu em frente ao Carrefour do Norte Shopping. Segundo a Polícia Militar, que acompanhou o protesto, não houve episódios de violência.

Em Gravataí, na região metropolitana de Porto Alegre, ocorreu uma manifestação pacífica na tarde de sábado (21), em uma praça pública no centro da cidade. Centenas de homens e mulheres, ativistas dos direitos humanos e grupos de movimentos negros pediram justiça e o fim da violência racial.

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