Fuga de motorista do local do acidente triplica chance de morte da vítima

Levantamento do governo do estado de SP mostra que a omissão de socorro aumenta as ocorrências de óbitos

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

São Paulo

A fuga de um motorista após acidente de trânsito triplica o risco de morte das vítimas. Levantamento feito pelo programa Respeito à Vida, do Detran (Departamento Estadual de Trânsito de São Paulo), mostra que a omissão de socorro aumenta os registros de óbitos nesses casos.

De janeiro a setembro deste ano, foram registrados 4.152 acidentes no estado em que os condutores fugiram do local, vitimando 331 pessoas —uma relação de 1 morte a cada 12,5 acidentes. Nas ocorrências em que não há evasão do motorista, o levantamento mostra que foi registrado um óbito a cada 34,2 incidentes.

Nas vias urbanas, segundo dados do Infosiga SP, foi registrada uma morte a cada 57,8 acidentes nos nove primeiros meses deste ano. Quando há fuga do motorista, essa relação passa para um óbito a cada 18,9 acidentes, triplicando a proporção de mortes.

A situação é semelhante nas rodovias do estado de São Paulo, onde foram registrados 12,3 acidentes para cada morte. Quando o condutor foge, essa relação cai para 3,6 acidentes a cada óbito.

Para Silvia Lisboa, coordenadora do programa Respeito à Vida, a omissão de socorro é a principal causa do aumento da incidência de mortes nesses casos. “Quando há fuga do motorista do local do acidente, geralmente a vítima demora mais tempo para receber atendimento e isso faz toda a diferença na chance de sobrevida”, explica.

Os 60 minutos após um acidente, a chamada “golden hour”, são decisivos para salvar a vida ou reduzir a sequela de um paciente vítima de trauma, explica Lisboa. “Quando há omissão, muitas vezes o socorro demora tempo demais para chegar ou o resgate é feito por quem não é apto, o que pode agravar o quadro.”

No Código de Trânsito Brasileiro, a fuga do local do acidente é considerada uma infração passível de multa e de até seis meses de detenção. Se houver feridos, configura-se omissão de socorro, elevando o tempo de detenção para um ano.

​Perfil

Cerca de 85% dos acidentes com abandono do local pelos condutores ocorreram em vias urbanas, segundo o levantamento. A maior parte deles (64%) foi no período noturno. Os tipos de acidentes mais recorrentes são atropelamentos (26%) e colisões traseiras (26%).

Do total das vítimas, 47% eram pedestres, seguidos por motociclistas (32%), ocupantes de automóveis (13%) e ciclistas (8%). “O pedestre está sempre em desvantagem e é o elo mais fraco dessa cadeia”, diz Lisboa.

A coordenadora explica que o Detran faz campanhas permanentes para conscientizar os motoristas sobre a gravidade desses atos e que isso merece ser destacado especialmente com a proximidade do Dia Mundial em Memória das Vítimas de Trânsito, em 15 de novembro.

“Nós estamos falando de empatia, solidariedade. Acidente é uma situação grave, e omitir socorro é mais grave ainda. Precisamos de uma cidade mais humana.”

​Morte de ciclista

No último dia 8, a ciclista Marina Kohler Karkot, 28 anos, foi atropelada por um motorista na avenida Paulo VI, em Pinheiros (na zona oeste de SP), que fugiu sem prestar socorro.

Ela chegou a ser atendida por uma enfermeira que a viu caída na via, mas acabou morrendo no local do acidente.

O motorista foi identificado após testemunhas anotarem a placa do veículo, um Hyundai Tucson. O microempresário José Maria da Costa Júnior, 33 anos, apresentou-se na delegacia no último dia 10. Após ficar em silêncio, o motorista foi liberado.

A polícia investiga uma mulher e um homem que estariam no carro com o microempresário e se ele teria bebido antes do acidente.

A defesa de Costa Júnior disse que, no momento do atropelamento, ele estava distraído com um aplicativo de navegação do GPS e que não prestou socorro porque “ficou desesperado”. O defensor também negou que o condutor estivesse em alta velocidade e que tivesse bebido.

A polícia solicitou a prisão preventiva de Costa Júnior, mas ele não pode ser preso em razão da lei eleitoral, que proíbe a prisão cinco dias antes e 18 horas após o fim do primeiro turno. Exceções ocorrem com prisões em flagrante.

Cicloativista, feminista e pesquisadora de mobilidade urbana, Harkot tinha a bicicleta como seu principal meio de locomoção. Em 2018, obteve o título de mestre pela Universidade de São Paulo, com a dissertação “A bicicleta e as mulheres: mobilidade ativa, gênero e desigualdades socioterritoriais em São Paulo”.

Ela também foi coordenadora da Ciclocidade (Associação de Ciclistas Urbanos de SP), deu aulas na Escola da Cidade e foi consultora de projetos no Banco Mundial, além de ter feito parte do Conselho Municipal de Trânsito e Transporte.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.