Após mal-estar com movimento negro, PM participa de caminhada cultural em SP

Participantes se sentiram constrangidos por policiais ao serem monitorados durante passeio em outubro

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São Paulo

Após ser acusada de constranger 12 pessoas que participavam de uma caminhada cultural no centro da capital paulista, a Polícia Militar de São Paulo decidiu participar da experiência a convite da empresa responsável pelo tour.

Na manhã daquele 24 de outubro, um sábado, a "Caminhada São Paulo Negra", organizada pela Black Bird Viagem para contar a história de lugares e personagens ligados à cultura negra, acabou monitorada por dois PMs —do início ao fim.

A atitude da Polícia Militar causou mal-estar junto ao movimento negro, provocou a abertura de um inquérito no Ministério Público e de uma ação interposta pela Black Bird Viagem contra a PM.

Sobre o episódio, a PM disse na ocasião que decidiu acompanhar a caminhada "como regularmente é feito a fim de garantir a segurança do grupo e dos demais cidadãos".

Depois das críticas, a PM se propôs a aprender. Chamou os guias do tour para darem uma aula a um grupo de oficiais do curso de especialização em direitos humanos, promovido pela própria corporação.

O encontro, realizado nesta quarta (9) —véspera do Dia Internacional de Direitos Humanos—, e acompanhado pela Folha, durou cerca de uma hora.

Os PMs aprenderam noções sobre cultura negra, racismo estrutural e também receberam explicações a respeito do tour em que participarão nesta sexta (11).

O jornalista Guilherme Soares Dias, 35, um dos organizadores do passeio, disse que os PMs passarão pela Praça da Liberdade, palco de execuções de condenados; pela Capela dos Aflitos, onde os executados eram velados; pela rua Sete de Abril e pelo Largo Paissandu. “Nós adoraríamos que esse tour fosse institucionalizado como parte dos cursos de formação da PM”.

Deverão participar do tour cerca de 24 policiais militares. “Espero que a aula tenha sido importante para mudar alguma coisa neles, para que passem a entender as pessoas negras de outra forma”, diz o organizador do evento.

A participação dos PMs do curso em direitos humanos na caminhada foi acertada no mês passado após um encontro da cúpula da instituição e integrantes do movimento negro, diz Elizeu Soares Lopes, ouvidor da Polícia Militar.

Segundo Leandro Gomes Santana, diretor de Polícia Comunitária e Direitos Humanos, a imagem da PM está ligada diretamente à qualidade da interação que ela desenvolve com a sociedade. "Esse papel de aproximação e de conhecer a realidade para intervir é fundamental para que se tenha assertividade no nosso trabalho e a sociedade seja atendida como se deve", afirma Santana.

Alberto Saraiva, da Ouvidoria da PM, completa: "as pessoas precisam conhecer também a polícia para que a gente troque experiências e opiniões, para que ambos cresçam e melhorem".

COAÇÃO

Dias relembra que o tour daquele 24 de outubro foi monitorado do começo ao fim. "Durante três horas, eles foram filmando, com distância relativamente perto e nós ficamos coagidos e constrangidos com a situação", disse.

O organizador do passeio também afirma que, no momento, pensou que alguma coisa estava errada com a atividade ao ar livre. "Primeiro, a gente achou que fosse algo relacionado à pandemia, mas entendemos que não. No trajeto, encontramos uma candidata a vereadora com mais de 30 pessoas", conta.

Caminhada São Paulo Negra
Caminhada São Paulo Negra - Divulgação

"Eles disseram que tinham recebido um ofício informando que ocorreria uma manifestação do movimento negro e iriam acompanhar. Um dos guias explicou que se tratava de um passeio turístico, comprovando com documentos, como CNPJ da empresa e anúncio do passeio, mas eles ignoraram", completa.

Dias e o sócio Heitor Salatiel, 29, fizeram boletim de ocorrência e procuraram a Delegacia de Crimes Raciais para registrar o caso. Outros organizadores e participantes do passeio foram ouvidos.

“Uma coisa bastante impactante para mim foi o fato de todas as pessoas que me atenderam serem brancas e eu senti que tudo o que era falado era minimizado. Não me senti acolhido na delegacia”, finaliza.

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