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Coronavírus STF

STF deve preservar ciência e federalismo ao zelar pelo direito à saúde sob Covid

Tribunal julga na próxima semana quatro ações de controle de constitucionalidade ligadas à pandemia

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Eloísa Machado de Almeida

Professora e coordenadora do Supremo em Pauta da FGV Direito SP

Quais são as obrigações do governo federal em relação à vacinação contra Covid-19? Qual o papel que estados e municípios poderão desempenhar na vacinação? O que significa a compulsoriedade?

Estas são as principais perguntas que o Supremo Tribunal Federal deverá responder ao julgar quatro ações de controle de constitucionalidade, inseridas na pauta das últimas sessões de julgamento deste ano, marcadas para dias 16 e 17 de dezembro, por videoconferência.

Três ações judiciais foram propostas por partidos políticos de oposição, questionando a hesitação do governo federal em expor de forma clara os planos de vacinação, bem como a motivação de suas decisões.

As idas e vindas de posições do Ministro da Saúde, as falas desencorajadoras do presidente da República e as dúvidas que pairam sobre a isenção política da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) motivaram a primeira leva de ações. Rede, Psol, PCdoB, PT, PSB questionaram o conjunto da má obra do governo federal sobre vacinação: falta de transparência, de critérios e de planejamento.

A Advocacia-Geral da União, incumbida de prestar esclarecimentos em nome do governo federal ao Supremo, disse que “a construção de uma casa começa pelo alicerce, não pelo telhado. Portanto, antes de mais nada, é preciso que exista uma vacina".

"É necessário ter em mente que a discussão sobre compra, distribuição e aplicação de uma vacina –inclusive no que se refere à eventual obrigatoriedade– pressupõe um elemento essencial, qual seja, a prévia existência da própria vacina, obviamente testada, comprovada e registrada na origem e na Anvisa.”

Assim, dá a entender que o marco zero da elaboração de qualquer plano de vacinação ocorreria apenas após a Anvisa conceder o registro sanitário a vacinas.

Já a Procuradoria-Geral da República, como tem sido praxe, se alinhou à AGU e opinou que as ações nem sequer deveriam ser conhecidas.

Outra ação, proposta pelo PDT, antecipa o conflito federativo que já tem sido chamado de “guerra da vacina”: quais as competências de estados e municípios na vacinação, diante de um governo federal que reluta em coordenar a política de saúde e que nega, sobre o cadáver de 180 mil brasileiros, a gravidade da pandemia?

Em termos práticos, a ação pede que a Lei 13.979 de 2020, aprovada a partir de medida provisória do presidente Jair Bolsonaro, seja respeitada. Esta lei, editada para lidar com as medidas a serem adotadas no combate à pandemia de Covid-19, já prevê a possibilidade de gestores locais de saúde promoverem vacinação compulsória. A compulsoriedade, especificamente, é contestada em ação do PTB.

Desde então, o mundo assistiu a Margaret Keenan e William Shakespeare, idosos britânicos, serem vacinados.

Com a realidade da vacinação diante de nossos olhos, o assunto se tornou o centro do debate político: Congresso Nacional ensaia a aprovação de projetos que discutem desde a priorização de quem receberá a vacinação até a alocação de recursos para compra de vacinas; o governo de São Paulo anuncia calendário de vacinação, mesmo dependente de aval da Anvisa, e os demais estados se mobilizam para adquiri-las, seja por intermédio do governo federal ou de outros governos estaduais, seja através de novas parcerias entre laboratórios.

O governo federal ensaia uma resposta, ainda que errática.

De outra parte, organizações de direitos humanos, de saúde e humanitárias enviaram argumentos ao Supremo Tribunal Federal em prol da valorização do SUS, apontando a necessidade de ações de saúde serem apropriadamente financiadas e indicando a especial atenção a ser dada a grupos vulneráveis e a profissionais cuidadores nas políticas de vacinação contra Covid-19.

Técnicos da Anvisa e associações médicas publicaram posições para a adoção de critérios científicos na aprovação e incorporação de vacinas.

A considerar as decisões anteriores do Supremo Tribunal Federal relacionadas à pandemia, haverá valorização dos critérios científicos e do federalismo brasileiro como garantia, e não como óbice, à realização do direito à saúde, como fez, por exemplo, ao julgar os casos relativos à quarentena.

Desde o início da pandemia, o tribunal tem procurado agir rapidamente para evitar que a polarização política colocasse em risco as medidas de enfrentamento à doença.

Porém, o tema não precisaria ser tão conflituoso a ponto de depender de interferência do Judiciário; afinal, políticas de imunização bem sucedidas estão no DNA do Sistema Único de Saúde e possuem um robusto marco normativo. Nem tão mortal.

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