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Crise no transporte público na pandemia provoca greves em série por todo o país

Perda de passageiros durante a pandemia tirou recursos, tornou serviço insustentável e reduziu sua qualidade

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São Paulo

A crise no sistema de transportes públicos do país, provocada pela queda do número de passageiros devido à pandemia da Covid-19, tem causado greves, rompimentos de contrato e até intervenções do poder público em cidades de todo o Brasil.

Levantamento do Idec (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor) apontou que somente desde 10 de dezembro do ano passado, quando o governo federal vetou um auxílio financeiro à categoria, e o último dia 14 deste mês, houve pelo menos 38 greves, paralisações ou protestos, 13 ocorrências contratuais, como rompimentos ou contratações emergenciais e 5 intervenções nas empresas de transporte.

Entre esses episódios estão casos extremos, como Teresina, onde uma greve de ônibus deixou a população sem transporte por mais de 20 dias (a capital piauiense já teve seis greves de ônibus neste ano), e Salvador, onde a prefeitura decretou intervenção em empresas de ônibus e assumiu a operação e a folha de pagamento.

No Rio, a prefeitura também precisou intervir no BRT (corredores de ônibus rápidos) para garantir o funcionamento do serviço.

Esses eventos aconteceram em todas as regiões do país e foram motivados em geral por atrasos de salários, cortes de benefícios e demissões.

Não entrou nesse levantamento a greve do Metrô que parou parte de São Paulo na quarta-feira (19) por reivindicações salariais da categoria.

O setor de transportes passa por uma crise sem precedentes há mais de um ano, desde que que a pandemia da Covid-19 desembarcou no Brasil. Medidas de restrição de circulação de pessoas, fechamento de comércios, desemprego e adoção de teletrabalho para uma parcela da população fizeram a demanda por transporte público despencar.

Dados da NTU (Associação Nacional de Empresas de Transportes Urbanos) mostram que em fevereiro deste ano o número de passageiros nos ônibus estava em média 41% menor do que antes da pandemia —essa queda chegou a 80% em março de 2020, quando o país se fechou contra o vírus.

Autor do levantamento do Idec, Rafael Calabria explica que, via de regra, as empresas são remuneradas exclusivamente de acordo com a quantidade de passageiros que carregam —com exceções em São Paulo, e, em menor escala, Brasília e Curitiba.

"Por isso o serviço ficou insustentável financeiramente e agora com qualidade ainda pior do que já tinha", diz ele. "Como a pandemia está durando muito aqui no Brasil, a situação piora, e os trabalhadores têm salário atrasado, 13º cortado, ficam sem benefícios, e reagem", afirma Calabria.

Em todo o ano passado, foram demitidas mais de 66 mil pessoas só no sistema de ônibus, segundo dados da NTU, além da suspensão de contratos e redução de salários permitida por legislação da pandemia.

Com a queda na demanda, o setor de ônibus acumulou até agora R$ 14,2 bilhões em prejuízo desde março, segundo dados da entidade.

Além disso, de março de 2020 a abril de 2021, os sistemas sobre trilhos (trens e metrô) estimam que a arrecadação em bilheterias caiu R$ 10,9 bilhões, segundo a ANPTrilhos (Associação Nacional dos Transportadores de Passageiros sobre Trilhos).

Para conter a crise do setor, ao longo do ano passado empresários e prefeitos articularam e conseguiram aprovar no Congresso Nacional um auxílio de R$ 4 bilhões para o transporte público, que injetaria dinheiro na área em cidades com mais de 200 mil habitantes.

O recurso seria liberado com contrapartidas como a exigência de que as cidades não fizessem cortes ou redução abrupta da oferta, que mantivessem a frota necessária para atender a população com segurança sanitária e que garantissem gratuidades onde elas existem, como para idosos, entre outras.

O auxílio, no entanto, foi vetado em 10 de dezembro pelo presidente Jair Bolsonaro, que questionou pontos formais, como a falta de uma estimativa de impacto orçamentário, e afirmou que a medida esbarraria em recomendações do TCU (Tribunal de Contas da União) que estabelecem que os recursos só podem ser executados durante o estado de calamidade, que terminou oficialmente em dezembro.

"A questão do financiamento do transporte é estrutural no Brasil, que tem por padrão modelos de contratos errados, que vão causar esse tipo de problema. A gente precisa de um socorro federal urgente e de forçar a mudança nesse modelo. As cidades precisam de auxílio ou o transporte público não vai se salvar", diz Calabria.

O Idec acionou nesta sexta (21) os ministérios da Saúde e do Desenvolvimento Regional propondo protocolos para impedir que cidades suspendam o transporte coletivo e pedindo que a redução da frota ocorra de acordo com a demanda e mais recursos.

Nesta quinta (20), mais de cem prefeitos aprovaram pela Frente Nacional de Prefeitos a criação de um programa de reestruturação do transporte público urbano, com foco em melhorar a qualidade, conseguir financiamento e rever contratos e regulação. O setor pede um apoio emergencial de R$ 5 bilhões ao ano.

Greves e intervenções mapeadas pelo Idec

Greves, paralisações e protestos:

  • Aracaju - SE
  • Belém - PA
  • Belo Horizonte - MG
  • Brasília - DF
  • Campos do Jordão - SP
  • Canoas - RS
  • Castro - PR
  • Contagem - MG
  • Erechim - RS
  • Feira de Santana - BA
  • Ferraz de Vasconcelos - SP
  • Fortaleza - CE
  • Francisco Beltrão - PR
  • Goiânia - GO
  • Guaíba - RS
  • Guaratinguetá - SP
  • João Pessoa - PB
  • Juiz de Fora - MG
  • Maceió - AL
  • Manaus - AM
  • Maringá - PR
  • Natal - RN
  • Paranaguá - PR
  • Pato Branco - PR
  • Paulínia - SP
  • Petrópolis - RJ
  • Ponta Grossa - PR
  • Porto Alegre - RS
  • Recife - PE
  • Rio Grande - RS
  • São Bernardo do Campo - SP
  • São José dos Pinhais - PR
  • São José dos Campos - SP
  • São Luís - MA
  • São Paulo - SP
  • São Sebastião - SP
  • Uberlândia - MG
  • Vitória - ES

Ocorrências contratuais (rompimentos, prorrogações ou contratações emergenciais):

  • Alagoinhas - BA
  • Araçariguama - SP
  • Barretos - SP
  • Conselheiro Lafaiete - MG
  • Itabuna - BA
  • Itanhaém - SP
  • Marília - SP
  • Nova Friburgo - RJ
  • Pindamonhangaba - SP
  • Ribeirão Preto - SP
  • Rondonópolis - MT
  • São Roque - SP
  • Teresina - PI

Intervenções do poder público em empresas:

  • Rio de Janeiro - RJ
  • Uruguaiana - RS
  • Foz do Iguaçu - PR
  • Salvador - BA
  • Caraguatatuba - SP
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