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A Cor da Desigualdade no Brasil

Índice aponta que, sem políticas públicas, exclusão racial persistirá por décadas no Brasil

Ifer mede desequilíbrio racial nas populações com alta escolaridade, maiores rendimentos e com maior longevidade

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Sergio Firpo

Professor de economia do Insper

Michael França

Doutor em Teoria Econômica pela Universidade de São Paulo; foi visiting scholar na Universidade Columbia e é pesquisador do Insper

Alysson Portella

Alysson Portella é doutorando em economia no Insper

O Índice Folha de Equilíbrio Racial (Ifer) é uma forma de medir a consequência do processo histórico de exclusão social enfrentado pela população negra.

O Ifer oferece uma medida quantitativa do desequilíbrio racial presente nas populações com alta escolaridade, maiores rendimentos e com maior longevidade. Para isso, modificou-se o Índice de Equilíbrio Racial, proposto por Firpo, França e Rodrigues (2020), aplicando-o a variáveis de escolaridade, renda e saúde.

O Ifer é um número entre -1 e 1. Valores próximos a 1 indicam que negros, relativamente a uma população de referência, estão sobrerepresentados; valores próximos a -1 indicam sub-representação de negros. Já para valores próximos a zero, há equilíbrio racial, dada a população usada como referência.

Como ilustração, considere o grupo populacional de pessoas com mais de 30 anos e com ensino superior completo. A proporção de negros no Brasil em 2019 nesse grupo populacional é de 34%. No Brasil de 2019, entre as pessoas com mais de 30 anos, 54% são negras.

A discrepância entre 34% e 54% é refletida em um valor negativo do Ifer. Se houvesse exatamente 54% de negros na população com ensino superior, o Ifer seria zero. Mas no caso concreto, com 34% de negros, o Ifer é -0,39. Ou seja, há clara sub-representação de negros entre adultos com ensino superior.

Interessante notar a relevância da população de referência utilizada.

No estado de São Paulo, onde a proporção de negros com mais de 30 anos é de cerca de 38%, os mesmos 34% de negros na população com ensino superior gerariam um Ifer (-0,09) mais próximo de zero do que na Bahia, estado em que 80% da população adulta é negra.

Na Bahia, os mesmos 34% de negros na população com ensino superior implicariam um Ifer bem mais negativo (-0,92).

O Ifer usa três populações em seu cálculo. Elas são formadas por adultos com mais de 30 anos que (1) têm ensino superior ou pós-graduação, (2) têm rendimentos entre os 10% maiores rendimentos da população branca, (3) estão no grupo etário formado pelos 10% mais velhos da população branca.

Por exemplo, 10% da população adulta branca recebem acima de R$ 6,1 mil mensais. Na sequência, calculamos a proporção de negros na população acima de 30 anos que têm renda maior do que R$ 6,1 mil.

No Brasil em 2019, 26% da população recebendo mais do que R$ 6,1 mil mensais eram de negros. Como essa proporção é inferior aos 54% de negros entre os adultos, o Ifer resultante é negativo, de -0,54.

Não é inusitado que o Ifer, para cada uma das dimensões computadas, escolaridade, renda e saúde, seja negativo. Em um país com o legado da escravidão e de persistente racismo seria surpreendente se tivéssemos encontrado um cenário em que cada um dos três componentes fosse próximo de zero.

Há progressos acontecendo em diversas regiões do país. Ainda assim, na velocidade atual, o Ifer demorará, na ausência de políticas públicas especificas, décadas para refletir equilíbrio racial em escolaridade, renda e saúde em nosso país.

Apoio - Esta reportagem faz parte de uma série que resultou do programa Laboratórios de Jornalismo de Soluções da Fundación Gabo e da Solutions Journalism Network, com o apoio da Tinker Foundation, instituições que promovem o uso do jornalismo de soluções na América Latina.

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