Descrição de chapéu A Cor da Desigualdade no Brasil

Pauta da exclusão racial perde espaço na gestão federal, dizem especialistas

Secretário de Bolsonaro defende ações afirmativas enquanto durar 'profunda desigualdade'; presidente é contra cotas

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Brasília

As políticas para reduzir a exclusão racial no Brasil avançaram nos estados, mas têm perdido espaço na agenda do governo federal, segundo especialistas.

Um dos sinais disso é o enfraquecimento que a Secretaria Nacional de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (SNPIR) vem sofrendo nos últimos anos.

A pasta foi criada em 2003, na gestão de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), como resposta a uma demanda do movimento negro, que reclamava da falta da articulação de políticas públicas de combate à desigualdade racial em nível federal.

Em 2008, embora tenha mantido o nome de secretaria, a instituição ganhou status de ministério. Com Dilma Rousseff, foi fundida a outras, formando o Ministério da Mulher, da Igualdade Racial e dos Direitos Humanos.

Posteriormente, no governo de Michel Temer (MDB), foi rebaixada novamente a secretaria, status que manteve na gestão de Jair Bolsonaro (sem partido). Segundo especialistas, no governo atual a agenda racial perdeu ainda mais relevância.

A pasta —que está sob o guarda-chuva do novo Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos— chegou a ficar três meses sem secretário entre o final de 2020 e o início de 2021.

Segundo o professor Renato Emerson dos Santos, do Instituto de Pesquisa e Planejamento Regional da UFRJ, a SNPIR ficou de fora da articulação política, o que tem freado o avanço da agenda racial.

"Você ter um ministro, alguém que esteja em pé de igualdade para ser recebido pelos ministros, é muito importante nesse processo de articulação", afirma Santos.

A Folha solicitou uma entrevista ao atual titular da SNPIR, Paulo Roberto. A pasta pediu as questões por email e respondeu —em nome do secretário— também por escrito.

A pergunta da reportagem sobre o rebaixamento de status ministerial da SNPIR e suas possíveis implicações para as políticas de combate à desigualdade racial não foi respondida.

Roberto citou, no entanto, acordos de cooperação com diversos ministérios para a realização de programas de igualdade racial, voltados a temas como segurança pública, emprego e educação. Um exemplo, mencionado na nota, é uma ação conjunta com o Ministério da Justiça para a capacitação de agentes penitenciários contra o racismo.

A reportagem perguntou ainda sobre o orçamento do ministério destinado aos programas da secretaria e o andamento de sua implementação, mas a SNPIR não retornou.

Em relação às ações afirmativas, Roberto defendeu sua manutenção enquanto durar “a enfermidade social que é a profunda desigualdade que se verifica no seio do povo brasileiro". O presidente Jair Bolsonaro, por outro lado, já criticou em diversas ocasiões as cotas nas universidades federais.

Por lei, a política de reserva de vagas será reavaliada no próximo ano.

A proximidade da data preocupa o movimento negro e defensores da pauta da equidade racial como o senador Paulo Paim (PT-RS).

O parlamentar protocolou um projeto para a renovação das cotas.

“É importante que possamos discutir isso e não fazermos uma votação apressada na última hora", diz.

Outra preocupação em relação à agenda racial se refere ao futuro das demarcações de terras quilombolas. Uma portaria da Fundação Palmares, de maio deste ano, sustou um regulamento, considerado importante, sobre o tema.

O atual presidente da instituição Sérgio Camargo é abertamente contrário ao movimento negro, que já chamou de "escória maldita".

Em nota no site, a fundação afirmou que a portaria que revogou disposições sobre terras quilombolas "não deixa desprotegido o patrimônio afro-brasileiro, nem as Comunidades Remanescentes de Quilombos". Segundo a instituição, o regulamento suspenso já estaria em desuso.

De acordo com a organização Achados e Perdidos, que reúne informações obtidas por meio da Lei de Acesso à Informação, apenas 11% dos processos de demarcação em andamento foram concluídos em 2020, menor percentual da série histórica, iniciada em 2003.

Apoio

Esta reportagem faz parte de uma série que resultou do programa Laboratórios de Jornalismo de Soluções da Fundación Gabo e da Solutions Journalism Network, com o apoio da Tinker Foundation, instituições que promovem o uso do jornalismo de soluções na América Latina.

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