Descrição de chapéu Solidariedade

Brasileiro é solidário, mas ainda falta cultura de doação

País fica no 54º lugar em ranking que mede solidariedade; Indonésia é a campeã

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São Paulo

O Brasil ficou em 54º lugar na edição mais recente do The World Giving Index, ranking produzido pela Charities Aid Foundation (CAF), divulgada em 15 de junho, que ouviu aproximadamente mil pessoas em 114 países.

A pesquisa pergunta se o entrevistado, no mês anterior à conversa, ajudou de alguma maneira um desconhecido, doou dinheiro ou fez algum trabalho voluntário. Os brasileiros foram melhor no primeiro tópico, com 55% respondendo positivamente.

Num ano de pandemia, o Brasil até avançou 20 posições desde a divulgação anterior da CAF, que consistia num compilado de pesquisas realizadas entre 2009 e 2018 (estava em 74º dentre 126 países, veja quadro), mas segue longe do pódio, que teve na pesquisa mais recente Indonésia, Quênia e Nigéria e, na média dos dez anos anteriores, EUA, Mianmar e Nova Zelândia.

Ilustração mostra representante do G7 discursando, uma pessoa sendo vacinada e um avião carregando vacinas em direção ao mapa da África
Fido Nesti

Para Paula Fabiani, diretora-presidente do Instituto para o Desenvolvimento do Investimento Social (Idis), braço da CAF no Brasil, há entraves culturais e burocráticos no país.

“Há aquilo de as pessoas não gostarem de falar que doam, e também falta um ambiente promotor de doação. Não há políticas públicas nesse sentido, e muitos não percebem a filantropia como uma forma de participação social”, afirma.

Roberta Faria, presidente do Instituto MOL, ONG de fomento à cultura da doação, diz que os brasileiros não enxergam o apoio às ONGs como um ato de cidadania.

“Nossa cultura de doação é centrada na caridade. Isso nasce da religião e tem peso até hoje. É algo pautado por emergência, quando tem enchente, desabamento etc. Não é um investimento privado numa causa, de forma recorrente, mês após mês”, diz.

Isso explica em parte por que durante a pandemia da Covid-19 as doações deram um salto, com campanhas para arrecadação de dinheiro, comida e EPIs pululando nas redes sociais e na TV.

Para João Paulo Vergueiro, diretor-executivo da Associação Brasileira dos Captadores de Recursos (ABCR), o brasileiro é solidário e a Covid-19, aliada a novas tecnologias como o Pix, pode ser uma oportunidade de aumento das doações de forma perene.

“Há ajuda nas comunidades, nas ruas, nas tragédias. A gente está longe de alcançar outros países, mas há um potencial de crescimento.” Segundo Vergueiro, falta também uma legislação que estimule a doação. “As ONGs pagam imposto ao receber doações e não temos incentivos fiscais universais para doadores.”

O Idis deve divulgar em agosto uma outra pesquisa, sobre como se doa no país. Paula chama a atenção para alguns resultados diferentes dos auferidos na pesquisa anterior, de 2015.

Dentre os doadores, a maior parte diz ajudar o combate à fome e à pobreza (aumento de 29% para 43%). A seguir, fica a ajuda a projetos ligados a crianças, cuja cifra recuou de 36% para 19%. Isso pode ser um reflexo da situação econômica do país, avalia Paula.

Talvez pelo mesmo motivo, a ajuda aos moradores de rua também tenha aparecido no ranking —em 2020, foi prioridade para 4% de doadores, enquanto em 2015, a categoria nem apareceu.

Para o antropólogo e pesquisador Michel Alcoforado, falta uma participação mais robusta da elite brasileira nas doações. Para ele, a questão é cultural. “Diferentemente dos ricos americanos, por exemplo, que avaliam ter enriquecido por causa dos EUA e doam para retribuir o país, a elite brasileira acha que ficou rica apesar do Brasil, então não se vê em débito com a nação”, afirma.

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