Casas ficam cobertas por dunas em Florianópolis

Apesar de risco, moradores resistem a deixar imóveis no bairro dos Ingleses

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Florianópolis

Moradores da praia dos Ingleses, no norte da ilha de Florianópolis, em Santa Catarina, estão sob a ameaça de terem as casas soterradas pela areia das dunas. Mesmo com o risco, há resistência para deixar os imóveis.

“Eu não tenho para onde ir. Não tenho dinheiro para pagar alguém para me ajudar a remover a areia e muito menos para me mudar para outro local”, diz Denise Guimarães Santana, 42, que mora na casa mais atingida.

Duna avança sobre sobrado e casas em praia
Duna "engole" casas no bairro dos Ingleses, em Florianópolis (SC) - Anderson Coelho/Folhapress

A Servidão Fermino Manoel Zeferino fica localizada numa das regiões de maior densidade habitacional da ilha e ilustra o conflito entre o espaço urbano e ambiental, que é comum em várias regiões da capital catarinense.

A rua termina numa região com dunas. Os três imóveis mais afetados pela areia foram construídos em área de preservação ambiental. As irregularidades nas construções limitam a atuação do poder público a ações de fiscalização.

“Nós interditamos dois imóveis porque há alto risco de ruir a qualquer momento. A duna encostou nas residências e as estruturas não foram feitas para conter esse aterro natural. Há vigas comprometidas e paredes rachadas. Tem porta e janela que não se consegue abrir porque estão barradas pelas dunas”, diz Alexandre Vieira, gerente da Defesa Civil do município, que estuda a possibilidade fazer a transposição de parte da areia para evitar o soterramento das residências.

mulher com filhos em sala coberta por montanha de areia da duna
Denise Guimarães Santana e dois filhos em sua casa, tomada pela areia das dunas - Anderson Coelho/Folhapress

O imóvel mais atingido fica de frente para o mar e é composto por um chalé e uma casa de dois andares. A areia está encostada no imóvel até a região próxima ao telhado e entrou por debaixo da porta e pelas frestas das janelas. No andar térreo há a estrutura de um restaurante que parou de funcionar durante a pandemia.

“Em 2019, quando me mudei pra cá, eu tinha cinco funcionários que se revezavam e passavam o dia retirando a areia da lateral da casa com pás. Mas com a Covid caiu o movimento, o restaurante fechou e agora nesse ano eu não consegui mais pagar ninguém pra fazer o serviço”, diz Santana.

Conforme Santana, desde o início do ano, o trabalho de remoção da areia tem sido feito por ela com a ajuda de dois filhos e vizinhos que agem para evitar que a casa seja soterrada.

“A gente passa o tempo todo removendo a areia. Pegamos lanterna e entramos madrugada adentro com as pás.”

No início do ano, o telhado da casa quebrou. A areia entrou pela janela do banheiro do segundo andar e tomou parte do quarto. “Eu chorei muito. Parece que é invencível.”

“Eu só queria uma ajuda da prefeitura com isso porque a gente quer reabrir o restaurante e voltar a trabalhar. Do jeito que está a gente vai começar a passar necessidade. Prometeram uma cesta básica para ajudar. Estou ficando desesperada. Não posso ficar sem teto, morar na rua. Tenho família pra cuidar. Não sei o que fazer."

Os moradores do outro imóvel interditado estão passando as noites na casa de familiares, mas monitoram o local para evitar saques.

“O meu pai construiu essa casa na juventude dele. Passei a minha infância e momentos felizes aqui e vou seguir aqui. Voltei agora para pegar esse lustre que é o timão de um barco e é um símbolo para nossa família porque o marujo nunca abandona a embarcação", diz Cassiana da Silveira Pereira, 46.

Conforme estudos do Departamento de Geografia da UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina), as dunas têm se deslocado pela faixa de areia sob influência dos ventos.

“O vento nordeste é mais frequente, porém o vento sul, que ocorre com menor frequência, é mais forte e tem mais poder de movimentar os sedimentos”, diz a oceanógrafa e mestre em geografia Maiara Werner, que fez um estudo sobre os fatores que influenciam a locomoção das dunas.

Segundo a Floram (Fundação Municipal do Meio Ambiente de Florianópolis), as casas não possuem alvará de construção. O órgão instaurou um processo administrativo para avaliar o que será feito com as estruturas que foram construídas antes da criação do Plano Diretor do município.

O promotor responsável pela fiscalização ambiental no norte da ilha, Paulo Locatelli, diz que não há caminho para regularização dos imóveis. “O caso não chegou aqui no Ministério Público, mas se elas estão em áreas de APP [área de preservação permanente] não tem como aplicar a REURB (Regularização Fundiária Urbana).”

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.