Descrição de chapéu Obituário Ruth Helena Bellinghini (1959 - 2021)

Mortes: Jornalista de ciência, era apaixonada pelas letras do DNA e pela bancada de laboratório

Ruth Helena Bellinghini morreu na quinta-feira (19), aos 62 anos

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São Paulo

Ruth Helena Bellinghini era uma jornalista que amava letras e bancadas. Não necessariamente só as letras publicadas nos jornais em que trabalhou —ela era apaixonada pelo abecedário do DNA e pelas bancadas de laboratório.

A jornalista passou pelo Jornal da Tarde, pelo O Estado de S.Paulo e, mais recentemente, era editora-assistente da Revista Questão de Ciência.

Como uma pessoa da ciência, a preocupação com a Covid-19 —e o caminho que o país tomou na pandemia, virando as costas para evidências— era parte do dia a dia nas conversas com jornalistas conhecidos.

Um dos últimos textos que publicou na Questão de Ciência mostrava um pouco do humor de Ruth e, ao mesmo tempo, seu apreço pela informação correta e bem embasada. Com título “Um Domingão no Covidário”, ela narra o ecossistema e as personagens de uma ala de hospital destinado aos casos suspeitos de Covid, onde ficou por algumas horas para fazer exames, mas não um RT-PCR.

“Alguém sugere fechar as janelas e impeço afirmando que vamos ficar aglomerados numa sala fechada com Sars-CoV-2 alegres e felizes circulando no local”, diz no texto, de julho deste ano. “Vou respondendo nãos seguidos, menos para a pergunta ‘está vacinada?’. A médica me diz que sim, pode ser Covid, mas também pneumonia e várias outras coisas (‘várias outras coisas’ sempre me assusta, porque sempre faço uma longa lista de neoplasias)”, conta em outro trecho.

A figura culta, bem informada —que odiava burrices— e preocupada contrastava com o falar alto e com uma certa “boca suja”.

Estar perto de Ruth era uma pândega (ou seja, festança, esbórnia, brincadeira vulgar), palavra que ela gostava, conta a amiga Stella Galvão.

Os amigos dizem que as comidas de Ruth eram mais um campo onde ela se destacava. “Quem comeu o minestrone que ela fazia não esquece jamais”, diz Ellen Cordeiro de Rezende.

Preocupada com o tempero do que fazia, quando editora, sempre criticava/brincava com os que usavam saleiros de crase e de vírgulas, espalhando-as no texto inteiro sem cuidado, conta Rezende.

Apesar do tom de brincadeira, Ruth era uma profissional exemplar e, com seu conhecimento, ensinava as pessoas que a cercavam. Não à toa, segundo os amigos, gostava de dar palestras.

Um dos maiores orgulhos de Ruth foi o período como Knight Fellow (2002-2003), no MIT (Massachusetts Institute of Technology), onde estudou suas paixões, como genética e câncer. Ela também foi bolsista do Marine Biological Lab, nos EUA.

Nas experiências internacionais pôde ficar mais perto das bancadas de laboratório de que tanto gostava. Com o passar da vida, inclusive, questionou-se sobre a escolha profissional e chegou a comentar que era a única coisa que mudaria em sua trajetória.

“Eu adoro a bancada”, disse para a amiga Fernanda Bassette. Contou que, na adolescência, no colégio Bandeirantes (em São Paulo), ouviu de um professor que comparar trechos de DNA de pessoas saudáveis e com câncer era coisa só para os netos de Ruth. “A tonta acreditou e desistiu da genética”, disse à Fernanda.

Isso, porém, não significava exatamente arrependimento ou rancor relacionado à sua carreira.

“‘Eu li no jornal’ era uma das minhas frases preferidas. Eu me achava gente grande”, escreveu Ruth à repórter da Folha Cláudia Collucci, durante a comemoração dos 100 anos do jornal.

Ruth Helena Bellinghini morreu, na quinta-feira (19), em São Paulo, por um quadro de sepse. Ela era diabética —doença que ela suspeitava ter já mesmo antes da confirmação médica— e vinha lutando, recentemente, contra a síndrome de Fournier.

A jornalista deixa o gatinho Osíris, a quem chamava de “meu cobertorzinho”. Sua outra gatinha, sua alteza real, princesa Sophia, fugiu, o que rendeu uma das últimas postagens em seu Facebook, em 11 de agosto.

Ruth é mais um dos grandes nomes do jornalismo científico a morrer nos últimos anos. Primeiro, em 2018, Ricardo Bonalume Neto morria aos 57 anos. Depois, em maio de 2021, foi Maurício Tuffani, aos 63 anos. Agora, Ruth Helena Bellinghini.

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