Descrição de chapéu aeroportos

Projeto de parque no Campo de Marte é suspenso após não conseguir apoio na iniciativa privada

Nenhuma empresa de interessou em projeto lançado pela Prefeitura de SP para investir no local

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São Paulo

O projeto de criação de um parque onde hoje funciona o aeroporto Campo de Marte, na zona norte de São Paulo, perdeu fôlego este ano.

Segundo a prefeitura da cidade, a suspensão temporária do projeto, que tornaria inativo um dos principais pontos de partidas de voos particulares da capital paulista, ocorreu porque ninguém se interessou em financiar a construção e a operação de um conjunto de lazer no local, que fica próximo à marginal Tietê, ao sambódromo e ao centro de eventos do Anhembi.

Equipamentos trabalham em construção de uma escola militar dentro do Campo de Marte, na zona norte de São Paulo
Equipamentos trabalham em construção de uma escola militar dentro do Campo de Marte, na zona norte de São Paulo - Rubens Cavallari/Folhapres

Questionada na semana passada pela Folha, a prefeitura informou que o chamamento lançado em 2018 "não contou com a participação de interessados e foi temporariamente suspenso". Pelo projeto, os interessados deveriam investir em obras e manutenção do novo parque e, em troca, teriam o direito de exploração comercial e publicitária do local.

Concomitantemente, em uma fração do terreno do aeroporto que é administrado pelo Ministério da Defesa, o governo federal começou construir uma escola militar.

A posse do Campo de Marte é disputada na Justiça por prefeitura e União desde 1958. A gestão municipal já teve vitórias no STJ e no STF e tem defendido o direito a indenização por 88 anos de uso indevido do local pela União —a área foi ocupada pelo governo federal após derrota de São Paulo na Revolução Constitucionalista e teve de ser devolvida ao município em 1945, após o fim do Estado Novo.

A Força Aérea Brasileira diz que "a área do Campo de Marte, como um todo, faz parte de um processo judicial em andamento", mas não quis dar detalhes sobre a disputa. "O Comando da Aeronáutica somente definirá a destinação após a conclusão do referido processo". Porém, na entrada para a parte do lote onde é possível ver as obras já em andamento, em terreno ocupado pela FAB, há uma placa atestando a construção do Colégio Militar de São Paulo, cujo contrato prevê gastos de R$ 21,4 milhões.

Um projeto não inviabilizaria o outro, e até já houve em 2019 uma tentativa da prefeitura de negociar com o governo federal uma ação conjunta para resolver o entrave.

Uma reunião entre o prefeito Ricardo Nunes (MDB) e o secretário especial de Desestatização, Desinvestimento e Mercado do Ministério da Economia, Diogo Mac Cord, nesta sexta (3) também tentou mudar o rumo do diálogo para emplacar uma versão reduzida do projeto, semelhante a que já havia sido desenvolvido pelo agora governador João Doria (PSDB) quando era ainda prefeito.

Registrado em 2018, um estudo preliminar do chamado Parque Campo de Marte incluía a construção do Museu Aeroespacial e ambos deveriam ser concedidos à iniciativa privada. O projeto está no site da prefeitura e é assinado pelo escritório Alcindo Dell'Agnese Arquitetura em parceria com o grupo Semma, que se dedica ao planejamento de shoppings.

Esse mesmo estudo preliminar propunha um centro comercial de 100 mil metros quadrados de área construída, um centro de convenções e dois hotéis com 400 unidades habitacionais nos terrenos do aeroporto hoje administrado pela Infraero —toda a implantação dos equipamentos da prefeitura seria bancada pelo setor privado. O mesmo estudo diz que 71% dos clientes de shoppings paulistanos pertencem às classes A e B, em uma tentativa de aferir potencial econômico ao projeto.

Assim que assumiu o governo do estado, João Doria defendeu a desativação progressiva em até três anos da pista de pouso de aviões de pequeno porte de asa fixa do Campo de Marte, mantendo apenas plataformas para helicópteros.

Vista do aeroporto Campo de Marte, com o bairro da Casa Verde ao fundo
Vista do aeroporto Campo de Marte, com o bairro da Casa Verde ao fundo - Divulgação/Infraero

O tucano havia deixado a Prefeitura de São Paulo, e tinha em Bruno Covas (PSDB), que assumiu seu posto, um aliado na administração do município. Houve consenso sobre um termo de convênio para a transferência do direito de exploração do local para o estado de São Paulo.

Covas morreu em março, após ser reeleito prefeito da cidade, e foi substituído pelo emedebista Nunes. Algumas alas do partido do novo prefeito são mais próximas de Bolsonaro do que a dupla Doria e Covas, ambos críticos do presidente.

A questão é importante porque a depender de nova decisão judicial, a União pode ter que indenizar a prefeitura por uso indevido do Campo de Marte. O projeto do parque sinaliza para uma solução fora dos tribunais. Em um acordo, o governo federal pode aceitar conceder o uso do terreno hoje sob seu domínio ao município —neste caso, a pista de pouso não seria desativada.

O projeto valia-se da promessa de transformação da cidade no chamado Arco do Futuro, que englobava regiões próximas a eixos de transporte e às marginais Pinheiros e Tietê.

O problema é que essa iniciativa tem enfrentado resistência entre parlamentares de direita, especialmente entre políticos do PSL, partido pelo qual Bolsonaro se elegeu. Uma das principais vozes de oposição ao Arco do Futuro era a do senador Major Olimpio (PSL-SP), morto em março. Ele afirmava que o projeto defendido por Doria cedia ao avanço da especulação imobiliária e à ferocidade da verticalização estimulada pelo Plano Diretor de 2014.

Além de consolidar projeto de um complexo que, embora vendido como parque se desdobrava em shoppings e hotéis, a desativação do Campo de Marte daria uma última vantagem de mercado à indústria da construção civil paulista: em todo o entorno do aeroporto, em um pedaço nobre de Santana, há fortes restrições para a altura das edificações por causa do pouso e decolagem de aeronaves. Helicópteros não eram um problema, mas aviões de pequeno porte, sim.

Em julho do ano passado, Doria voltou a defender o fim das atividades do Campo de Marte. Ele retomou o assunto um dia após um avião de pequeno porte cair na avenida Braz Leme, próximo ao local, matando o piloto que comandava a aeronave.

No aeroporto, pilotos e administradores de hangares dizem que o assunto perdeu força pouco tempo depois, e que a prefeitura não tem emitido comunicados sobre a continuidade do projeto de parque, museu e hotel. ​

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