Descrição de chapéu Obituário Cláudio van Balen (1933 - 2021)

Mortes: Frei 'Robin Hood' foi o ídolo da elite de Belo Horizonte

Nascido na Holanda, Cláudio van Barten rezou com os ricos e ajudou os pobres na capital mineira

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Belo Horizonte

"Frescura", bradou frei Cláudio van Balen durante a homilia em uma das missas que celebrava na igreja de Nossa Senhora do Carmo, na zona sul de Belo Horizonte.

O tema escolhido naquele dia pelo religioso para essa parte da missa, reservada à reflexão dos sacerdotes sobre a palavra de Cristo, era o que norteava a vida do frei: a defesa de Deus como um amigo do homem e não como uma autoridade.

Para frei Cláudio, morto no sábado (20), a frescura era tudo o que a igreja e a sociedade defendiam e que não envolvesse uma relação mais fraterna entre o homem e Deus.

Frei Cláudio van Balen durante celebração em Belo Horizonte. O religioso morreu de Covid-19 no sábado (20) aos 88 anos
Frei Cláudio van Balen durante celebração em Belo Horizonte. O religioso morreu de Covid-19 no sábado (20) aos 88 anos
Arquivo da Província Carmelitana de Santo Elias
O frei Cláudio van Balen durante celebração em Belo Horizonte

"Frei Cláudio contestava a idolatria religiosa, o moralismo, o autoritarismo, os formalismos e os ritualismos. Dizia que Deus não age por forma mágica e que não pode estar separado do humano", lembra frei Gilvander de Oliveira, que trabalhou por dez anos ao lado dele na igreja de Nossa Senhora do Carmo.

​Nessa linha, frei Cláudio rompeu com o costume dos ministros da eucaristia, fiéis encarregados pelos padres para auxiliarem no momento da distribuição das hóstias nas missas. Os mesmos fiéis repetem o trabalho nas celebrações.

Na igreja comandada pelo frei não existiam ministros da eucaristia fixos. "Cada dia ele chamava um grupo de pessoas. Antes da comunhão, perguntava a quem estava acompanhando a missa: 'quem aí está fazendo aniversário hoje'? As pessoas que levantavam a mão, naquele dia, eram chamadas para ajudar na distribuição das hóstias", recorda frei Gilvander.

O "rodízio" de ministros da eucaristia envolvia integrantes da comunidade LGBTQIA+, mães solteiras e divorciados. "Quem muitas vezes poderia se sentir menosprezado pela sociedade, tinha acolhida com frei Cláudio", diz Gilvander.

O estilo do religioso transformou a igreja de Nossa Senhora do Carmo em uma das mais frequentadas da capital mineira até meados dos anos 2000.

A popularidade entre os fiéis, mas nem tanto entre os colegas do alto clero. Considerado arrojado demais, um movimento iniciado em 2010 tentou retirar frei Cláudio da Igreja do Carmo, mas os fiéis se opuseram.

Mesmo assim, a partir de 2014 ele começou a diminuir suas aparições no local. Continuou, no entanto, morando próximo ao templo, em uma casa da paróquia.

Frei Cláudio era muito claro quanto às suas preferências. Era seguidor da teologia da libertação, doutrina da igreja católica que prega olhar mais atento aos pobres.

Mantinha em um salão atrás da igreja um quadro que mostrava lado a lado e agachados, como em um time de futebol, Karl Marx, Lênin, Che Guevara e outros líderes de esquerda. "Ele era chamado de comunista", diz frei Gilvander.

O frei Cláudio van Balen com vasos de flores nas mãos.
Nascido na Holanda em 1933, o frei Cláudio van Balen se mudou para o Brasil aos 16 anos. - Arquivo da Província Carmelita

Com recursos doados pelos fiéis da igreja, frei Cláudio montou um ambulatório, criou cursos profissionalizantes nas dependências da igreja do Carmo. Construiu ainda duas creches em comunidades carentes da capital.

Holandês de Wytgaard, no norte do país, Cláudio van Balen nasceu Jildert van Balen em 26 de setembro de 1933. Pegou um navio para o Brasil aos 16 anos. Demorou 15 dias para chegar e completou 17 anos no caminho.

No Brasil, além de adotar o novo nome, passou por seminários em Itu (SP) e Teresópolis (RJ). Foi ordenado padre na ordem dos carmelitas. Se mudou para Roma, onde fez mestrado e doutorado em teologia. Assumiu a igreja de Nossa Senhora do Carmo em 1967.

Em 2016 foi diagnosticado com Alzheimer. Há dois anos deixou de reconhecer as pessoas. Frei Cláudio foi internado em um hospital de Belo Horizonte na última quinta-feira (18), com sintomas de gripe.

Teve diagnóstico de Covid-19 e morreu no sábado aos 88 anos. O enterro aconteceu no cemitério Parque da Colina. O religioso havia tomado as três doses da vacina contra a doença.

Por ter contraído Covid, não houve velório. A missa de sétimo dia acontece na sexta-feira (26) na igreja à qual dedicou a maior parte de sua vida.

coluna.obituario@grupofolha.com.br

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