Criticado, ouvidor da polícia de SP fica fora de lista para recondução ao cargo

Eleição está em fase de recursos; movimentos sociais criticam gestão de Elizeu Lopes

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São Paulo

O atual ouvidor das polícias de São Paulo, Elizeu Soares Lopes, ficou de fora da lista tríplice da qual é escolhido o nome do titular do cargo a partir de 2022.

O ouvidor, cujo nome é selecionado pelo governador a partir da lista, atua fiscalizando o trabalho das Polícias Civil e Militar. O Condepe (Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana) é o órgão responsável por entregar a lista tríplice para escolha do governador de São Paulo.

Com perfil político, Lopes foi o terceiro colocado da lista para ouvidor a partir de 2020, quando o governador João Doria (PSDB) deixou de escolher o nome mais votado e não reconduziu o ouvidor ao cargo.

Ouvidor das polícias de São Paulo, Elizeu Soares Lopes
Ouvidor das polícias de São Paulo, Elizeu Soares Lopes - Adriano Vizoni - 19.fev.20/Folhapress

A quebra da tradição de nomear o mais votado da lista e a não recondução do antigo ouvidor, Benedito Mariano, gerou descontentamento entre entidades de direitos humanos na ocasião. Com uma postura bastante combativa, Mariano foi o primeiro ouvidor das polícias, nomeado por Mário Covas (PSDB).

A troca foi feita sem aviso prévio e no mesmo dia em que a Ouvidoria apresentaria seu balanço anual de trabalho, no qual apontou, entre outros fatos, o aumento das mortes de civis provocadas por policiais da Rota, a tropa de elite do estado.

Na eleição para o mandato que se iniciará no próximo ano, Lopes ficou em quarto lugar, com quatro votos. À frente, vieram Renato Simões (nove votos), Alderon Pereira da Costa (oito), Claudio Aparecido da Silva (oito).

Simões foi indicado pelo ITTC (Instituto Terra, Trabalho e Cidadania); Silva, pela Sociedade Santos Mártires; Costa, pela Associação Rede Rua; e Lopes, pelo Sindicato dos Advogados de São Paulo.

A eleição do Condepe está em fase de recursos. Mas, mantedo-se o resultado, Lopes não deverá ser reconduzido.

Para o presidente do Condepe, Dimitri Sales, a avaliação dos membros do conselho levaram em consideração críticas de que o ouvidor se manteve distante dos movimentos sociais e não satisfez a função de controle externo da polícia.

"[O ouvidor] se colocou muito mais na questão de intermediar com o governo do que exercer o controle externo da polícia. Há críticas também de que ele não esteve no interior do estado. Tudo isso levou o conselho a não reconduzi-lo", disse.

Débora Maria da Silva, do movimento Mães de Maio, diz que a gestão de Lopes foi marcada pela falta de interlocução com movimentos que atuam denunciando a violência policial. "Se a Ouvidoria não fala a língua dos movimentos socais, ela deixou a desejar. A Ouvidoria precisa estar a favor da sociedade, que é a mais atingida pela violência policial", diz.

De acordo com ela, vários movimentos importantes ficaram de fora de iniciativa para debater o assunto. Além disso, a atuação de Lopes na Baixada Santista, onde o movimento atua com maior intensidade, teria deixado a desejar. "Nós da Baixada Santista tínhamos uma presença forte do olhar do ouvidor. Com esse ouvidor [Lopes], a Baixada Santista ficou largada".

Marisa Feffermann, articuladora da Rede de Proteção e Resistência contra o Genocídio, afirmou que é como se o estado tivesse ficado sem Ouvidoria durante o mandato do atual ouvidor. A entidade atua nas periferias observando violações de direitos humanos.

Ela relata que vários movimentos se reuniram com Lopes no começo de seu mandato, mas que a relação não evoluiu. "Quando a gente solicitava [atendimento da ouvidoria], imediatamente a gente tinha um retorno, era respondido. Nesta gestão, isso não aconteceu", diz.

De acordo com ela, o movimento passou a deixar de levar casos à ouvidoria, repassando-os diretamente ao Ministério Público. "A gente já tem muita coisa contra a periferia. É importante que a periferia tenha um ouvidor que saiba o lado da população".

O deputado estadual Douglas Garcia, aliado do presidente Jair Bolsonaro, pediu a anulação da eleição. "Há diferença de votos que coloca em xeque a lisura da eleição", escreveu em sua rede social.

Ainda cabe recurso da votação. Para que o processo seja concluído, é preciso fazer uma retificação no placar da votação registrado no Diário Oficial, em que Lopes apareceu com oito votos.

Sobre a retificação, a Secretaria de Estado da Justiça e Cidadania afirmou que recebeu uma representação e no momento faz a análise do pedido.

Questionado sobre o assunto, o ouvidor Lopes disse que permanecerá no cargo até a nomeação do novo ouvidor. "Sobre o processo eleitoral da lista tríplice conduzido pelo Condepe, não é possível opinar, na medida em que ainda está em curso", disse.

Segundo sua assessoria, por ora, ele também não se manifestaria sobre críticas de entidades a sua gestão.

Procurado, o governo João Doria disse que o mandato do ouvidor é até fevereiro de 2022. "O estado ainda não recebeu a lista tríplice, que será analisada oportunamente."

Em 2020, quando foi escolhido por Doria, o nome de Lopes, terceiro colocado na lista tríplice, surpreendeu.

Na ocasião, segundo pessoas ligadas a ele, teria ouvido um pedido do Palácio dos Bandeirantes para não fazer prejulgamentos.

A eleição refletiu o bom trânsito de Lopes entre diversas forças políticas. Desde a adolescência, ele tem atuado mais nos bastidores políticos do que, propriamente, na liderança de movimentos —incluindo o estudantil, do qual participou em Mogi das Cruzes (SP) ainda jovem. É considerado um bom articulador.

Apesar das origens no PCdoB, no qual permaneceu até 2019, Lopes tem bom trâmite em outras legendas, inclusive no PSDB. Exemplo disso foi a nomeação para trabalhar na prefeitura de Doria, logo depois de deixar cargo na gestão Fernando Haddad (PT).

Na gestão petista, foi secretário-adjunto da Secretaria de Promoção da Igualdade Racial e foi trabalhar como assessor na Secretaria dos Transportes na administração tucana.

Recentemente, Lopes foi homenageado durante a entrega do Troféu Raça Negra.

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