Terremoto que balançou São Paulo completa cem anos

Tremor, de magnitude 5.1, foi sentido também em MG e RJ e matou homem "de susto"

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Alberto Veloso

Sismólogo, professor aposentado da UnB e autor dos livros "O terremoto que mexeu com o Brasil" (Thesaurus, 2011) e "Tremeu a Europa e o Brasil também" (Chiado, 2015)

Terremotos também fazem aniversários, e 27 de janeiro de 2022 é o centenário de um que balançou a cidade de São Paulo. Recordemos o fato.

Em 1922, a capital paulista já se mostrava grande com seus quase 65 mil prédios e uma população de 650 mil pessoas. Era o ano do centenário da Independência do Brasil e foram programados eventos, como a Semana de Arte Moderna, onde jovens intelectuais demonstraram insatisfação com o conservadorismo da época. Apesar de enaltecer a cultura brasileira, algumas de suas atitudes estremeceram a sociedade local.

Porém, duas semanas antes, os próprios paulistanos é que sentiram o chão tremer abaixo dos pés. Às 3h 50min 40s, de 27 de janeiro de 1922, dezenas de milhares de paulistas, fluminenses e mineiros notaram os efeitos de um terremoto de magnitude 5.1.

Manchete de capa do jornal "A Capital", noticiando um terremoto ocorrido em São Paulo em 27 de janeiro de 1922
Manchete de capa do jornal "A Capital" - Reprodução

Na capital paulista, pessoas espantadas abandonaram suas casas e saíram às ruas. A praça da República foi invadida por "inúmeras senhoras e senhorias em trajes menores". "Na rua Anna Cintra, ruiu parte do telhado do prédio n. 28, ... nos lugares altos, como avenida Paulista, Villa Mariana, Sant’Anna, ... racharam várias paredes de residências particulares."

Construções balançaram, portas bateram, janelas vibraram e objetos caíram. Muitos pensaram que suas casas estivessem sendo assaltadas e saíram dando tiros a esmo. É possível que o tremor tenha feito uma vítima fatal. Jornais dão nome, idade e endereço do morto que, segundo palavras do delegado e do legista, "faleceu de susto, causado pelo sismo". Tal causa mortis já foi relatada em diferentes locais do mundo, durante terremotos.

O presidente do estado, dr. Washington Luís, também se alarmou, pensando ser uma convulsão social, com detonação de dinamite. Telefonou para a polícia –nos quartéis do Exército e da Força Pública as tropas ficaram de prontidão. Contatou o dr. Belfort Mattos, diretor do Observatório Meteorológico, buscando informações. Esse sabia não ter registrado o tremor, pois não contava com sismógrafos. Porém, surpreso, observou um traço anômalo no barógrafo de gravidade e o tomou como início do registro do sismo –na verdade, o sinal decorreu da súbita movimentação do aparelho sacudido pelo terremoto.

Ah! E não é que já existiam fake news? No dia seguinte, pessoas ligaram para fábricas, em nome do Observatório Meteorológico, dizendo que o fenômeno se repetiria e as indústrias deveriam interromper os trabalhos e dispensar os operários. Os jornais classificaram os autores dos trotes de gaiatos.

Vista frontal do Mosteiro de São Bento e do largo de mesmo nome - Reprodução

A área de percepção do tremor foi de 250 mil km2, notadamente no centro-leste paulista, sul de Minas e oeste do Rio de Janeiro. Em Espírito Santo do Pinhal, possível região epicentral, o sismo provocou fortes vibrações, acompanhadas de ruídos subterrâneos, apavorando uma população de 30 mil pessoas. Paredes de casas racharam, telhados arquearam e prateleiras de lojas foram ao chão. Os primeiros trens que deixaram Pinhal saíram abarrotados dos que fugiam do tremor. O Observatório Nacional, no Rio de Janeiro, registrou o abalo e determinou a distância até o epicentro. Mas, somente anos depois é que os parâmetros do tremor foram definidos com maior clareza.

O incomum tremor de 1922 foi significativo, por assinalar que sismos com magnitudes similares são possíveis de acontecer no estado de São Paulo. Aliás, já aconteceu em 22/04/2008, com magnitude 5.2, porém com epicentro no mar, aproximadamente a 200 km de São Vicente… mas isso é outra história.

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