Mortes: Lutou pela liberdade, democracia, reforma agrária e justiça

Maria Prestes, como ficou conhecida, viveu 40 anos ao lado do ex-líder comunista Luiz Carlos Prestes; ela morreu por complicações de Covid

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São Paulo

Altamira Rodrigues Sobral era o nome de nascença da mulher guerreira que esteve ao lado do ex-senador e líder comunista Luiz Carlos Prestes (1898-1990) durante 40 anos.

Maria Prestes, como ficou conhecida nacionalmente, também acumulou outras virtudes como a simplicidade, a disciplina e o respeito aos humildes e oprimidos.

Foi dona, ainda, de outra identidade: Maria do Carmo Ribeiro. As mudanças de nome foram necessárias no período em que vivia na clandestinidade com Luiz Carlos Prestes e era perseguida pela polícia.

Altamira Rodrigues Sobral, conhecida como Maria Prestes, durante reunião sobre anistia e indenização a familiares dos políticos já mortos
Altamira Rodrigues Sobral, conhecida como Maria Prestes, durante reunião sobre anistia e indenização a familiares dos políticos já mortos - Leonardo Carvalho - 13.jan.2010/Folhapress

Maria Prestes nasceu no bairro Casa Amarela, no Recife (PE). Filha de camponeses, desde a infância acompanhou as atividades políticas de seu pai, João Rodrigues Sobral, militante do PCB (Partido Comunista Brasileiro).

Ainda criança, Maria perdeu a mãe e provou o dissabor de ter o pai preso e torturado. Na ocasião, ela e os irmãos tiveram que permanecer nas casas de alguns companheiros de partido.

"Em 1936, 37 eles visitaram o pai na prisão. Ela, mesmo estando com sete anos de idade, guardou na memória uma cena de horror, porque durante as torturas arrancaram todas as unhas dos pés e das mãos do pai dela", relata o professor Luiz Carlos Prestes Filho, 62.

João esteve no Rio, na Bahia e no Recife, onde fugiu da prisão e reencontrou os filhos. Juntos, também passaram por Maceió e Aracaju.

De volta ao Recife, como membro da Juventude Comunista, em 1945, na praça Treze de Maio, Maria participou da estrutura de segurança do comício de campanha do então candidato ao senado, Luiz Carlos Prestes. Foi assim que ela o viu pela primeira vez.

"Minha mãe brincava que, quando meu pai passou por ela, gritou: bonitão! Você é muito bonitão!".

Maria casou-se pela primeira vez aos 18 anos, teve dois filhos, mas o matrimônio não deu certo.
Ela resistiu à tristeza pela notícia da morte do pai devido a sequelas das torturas.

O PCB entrou na ilegalidade. Prestes foi eleito e cassado. Já em São Paulo, Maria tornou-se sua segurança. Para não ser identificada, mudou o nome de Altamira Rodrigues Sobral para Maria do Carmo Ribeiro. Pela ameaça da descoberta, os dois moraram em vários bairros da capital paulista e em Diadema (ABC).

Um dia, Luiz Carlos Prestes a pediu em casamento. Maria relutou em aceitar, pois já havia se decepcionado com o primeiro marido, mas concordou com a união sem assinar nenhum papel. A relação foi de amor, compreensão, confiança e parceria.

Nas décadas de 1950 e 1960, o casal teve os filhos Antônio João, Rosa, Ermelinda, Luiz Carlos, Mariana, Zoia e Yuri. Prestes adotou os dois filhos do primeiro casamento de Maria, Pedro e Paulo.

Por lutar contra a ditadura militar, Maria e Luiz Carlos Prestes enfrentaram o exílio de 1970 a 1979 na União Soviética (atual Rússia) e depois voltaram ao Brasil, onde Maria permaneceu ao lado do companheiro até a sua morte, em 1990.

Maria Prestes eternizou a sua história no livro "Meu companheiro: 40 anos ao lado de Luiz Carlos Prestes", lançado em 1992 (editora Rocco, E-Papers e Anita Garibaldi).

"Mamãe gostava de dizer que os anos mais felizes da família Prestes foram em Moscou, porque ela podia reunir o pai com os filhos", conta Luiz.

O casal também esteve na Bulgária, Alemanha, Grécia, Itália, França, Portugal, Cuba, Nicarágua, Argentina, Uruguai e Peru, entre outros países.

"Ela não só cuidava, mas era atenta para que ele pudesse manter sua integridade física e realizar suas ações. Foi uma simples mulher, que não teve formação universitária. Ela gostava de dizer que [o encontro com Prestes] foi marcado pelo destino, porque conheceu meu pai dia 4 de dezembro de 1950, dia de Santa Bárbara. Na Bahia, uma mãe de santo havia dito que ela atravessaria oceanos e mares, teria muitos filhos e seria feliz, e que Santa Bárbara era sua protetora", conta Luiz.

Maria foi a articuladora da família. Exigiu que os filhos buscassem uma formação. "Não permitia confrontos e brigas. Quando percebia que um filho tomava atitude errada, pegava o telefone, apontava os erros e dizia que não concordava. O importante para ela era se doar, amar e dar continuidade à família Prestes."

Maria morreu dia 4 de fevereiro, dois dias após completar 92 anos, em decorrência de complicações da Covid-19. Deixa sete filhos —os dois do primeiro casamento já são falecidos—, netos, bisnetos e dois irmãos.

​​coluna.obituario@grupofolha.com.br

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